A
riqueza
de
uma nação
deve ser medida pela
riqueza
do povo e não pela riqueza dos príncipes.
................ –– Adam
Smith, “Investigação
sobre
a Natureza e
a Causa da Riqueza das Nações” (1776).
|
O
sucesso do livro de Laurentino Gomes eram favas contadas, mas o saldo
dos números e os prêmios surpreenderam autor e editora. Menos de um
mês depois do lançamento, "1822" (Editora Nova
Fronteira), que investiga pormenores e documentos pouco conhecidos sobre a Independência, já havia vendido mais de 200 mil
exemplares. A conquista do Prêmio Jabuti, na categoria reportagem, ampliou a repercussão do livro e ainda vai garantir uma longa
permanência das reedições nas listas de mais vendidos pelos próximos anos. Não é o primeiro livro a contar os bastidores da separação de Brasil e Portugal, nem é o primeiro a revelar a falsa imagem construída pelo quadro pintado por Pedro Américo, "Independência ou Morte", mas o sucesso de vendas e a popularidade surpreendem.
O
livro anterior de Laurentino Gomes, "1808" – que foi
lançado em 2006 trazendo na capa o subtítulo "Como uma rainha
louca, um príncipe medroso e uma corte corrupta enganaram Napoleão
e mudaram a História de Portugal e do Brasil" – vendeu mais
de 600 mil cópias e ainda hoje permanece como best-seller nas livrarias, também
lançado com sucesso em outras línguas. O segredo do sucesso? Laurentino
Gomes diz que apenas segue sua intuição, pesquisa muito e tenta
explicar em todos os detalhes aquilo que, muitas vezes, a maioria dos historiadores acha
que não é necessário explicar.
"Creio
que são livros bem-sucedidos comercialmente e que ficaram populares
porque, em primeiro lugar, tenho em mente um leitor modelo que é um
estudante adolescente", responde Laurentino Gomes, na entrevista que fiz com ele por
telefone para o jornal Hoje em Dia. Laurentino esteve em Belo Horizonte três vezes consecutivas, por conta de convites do Sempre Um Papo e de outros projetos de cultura para
autografar “1822” e debater com os leitores. Ele conta, feliz, que também tem viajado
muito pelas capitais para as sessões de autógrafos e
lançamentos, e confessa que ultimamente ter a agenda sempre cheia de compromissos em várias cidades pelo Brasil afora não
é uma problema. "Muito pelo contrário", ele diz, com alegria e satisfação.
Jornalista
profissional e pai de quatro filhos, que atualmente têm 30, 28, 24 e 17 anos, Laurentino hoje vive e trabalha em uma casa ampla e confortável de um condomínio fechado em Itu, no interior de São Paulo. Ele é filho de uma família de pequenos agricultores de Maringá, no Paraná, e viveu uma infância isolada, sem vizinhos, sem jornal e sem TV. A família sabia das notícias por um rádio, que somente era ligado, de vez em quando, à noite. Aos 10 anos, em 1969, ele foi estudar no seminário interno dos padres Paulinos, em São Paulo, que mantêm as Edições Paulinas. Ficou três anos. De volta a Maringá, ele foi um adolescente que trabalhou muito: de jardineiro a ajudante de serviços gerais em um supermercado, office-boy, entregador, funcionário de oficina mecânica. Em 1976, foi para a capital, Curitiba, para estudar Jornalismo, depois de ser aprovado no vestibular da Universidade Federal do Paraná.
A mudança do trabalho como jornalista para o trabalho de escritor começou a tomar forma no final dos anos 1990. Laurentino trabalhava como editor na revista Veja quando um projeto foi cancelado pela direção. O projeto era a produção de encartes especiais sobre a história do Brasil que seriam distribuídos junto com as edições semanais da revista. Foi quando ele criou coragem e decidiu investir a sério na pesquisa sobre 1808, sobre a chegada da Corte Portuguesa ao Brasil.
A pesquisa progrediu e o primeiro livro foi concluído. "Meu sonho era que o livro fosse bem recebido e vendesse a primeira tiragem de 2 mil exemplares", ele recorda. "Eu não tinha noção de que o primeiro livro fosse atingir essa multidão de leitores. E olha uma coisa interessante: antes do livro ser publicado, eu lembro que um amigo muito próximo um dia me deu um conselho, dizendo que era melhor eu escolher outro assunto, porque ninguém iria querer ler um livro sobre Dom Pedro 1º e sobre a história do Brasil. Felizmente, esse meu amigo estava errado".
Lembrando da passagem do ofício de jornalista para o de escritor, o
autor que virou um grande campeão de vendas no Brasil também inclui entre as razões
do sucesso de seus livros a experiência adquirida de mais de três décadas trabalhando em
redações de jornais e revistas. "Desde o primeiro livro que publiquei eu tento
usar uma linguagem acessível para tentar explicar para todos os leitores o que a maioria dos
historiadores acha que não precisa explicar", aponta. "Na
verdade, sou daqueles que aprenderam muito com a experiência dos
erros que testemunhei nas edições de jornais e revistas e agora faço de tudo para não repetir os erros",
reconhece.
Laurentino
Gomes se diz honrado com a premiação concedida pelo Jabuti e muito
orgulhoso de estar presente com muita frequência, nos últimos anos, nas listas dos mais vendidos do Brasil com livros que não são apelativos nem banais, como costuma ser comum entre campeões de
venda. Modesto e dedicado diariamente à pesquisa, ele também
reconhece sua condição de autodidata em questões de
historiografia, já que depois do curso superior de Comunicação
passou mais de três décadas exclusivamente atuando na imprensa.
"Para os livros não busco apenas a pesquisa bibliográfica, acadêmica. Tento apurar os fatos, vou aos locais, entrevisto pessoas", explica, enquanto rende tributo a Otávio Tarquínio de Souza e a Oliveira Lima, dois célebres historiadores – o primeiro foi referência para o livro "1822", enquanto o segundo, especialista na vinda da Corte Portuguesa para o Brasil, foi o norte e o fio condutor para Laurentino as pesquisas e a escrita de "1808".
"Eu procuro
aplicar nos livros o que aprendi como repórter durante décadas na
revista Veja e no jornal Estado de São Paulo. Nas redações de jornais e
revistas quase sempre impera a soberba do conhecimento, como se não
fosse necessário trocar em miúdos, explicar a cada edição a mesma
história, quem é cada personagem envolvido. Isso é o que o leitor
quer encontrar e é isso que tento oferecer a ele em meus livros.
Estendo para os livros o que dizia um editor que tive no Estadão:
a função do jornalista é colocar a papinha mastigada na boca do
leitor todos os dias".
"1822",
revela o autor, é resultado de mais de três anos de pesquisas. Em 372 páginas
ilustradas e 22 capítulos, cobre um período de 14 anos, entre 1821,
data do retorno da Corte Portuguesa de Dom João VI a Lisboa, e 1834,
ano da morte do imperador Pedro I. Para Laurentino, a Independência
do Brasil resultou de uma notável combinação de sorte, de improvisação e também de sabedoria de lideranças como o patrono
José Bonifácio de Andrada e Silva, incumbido de conduzir os destinos do país por
entre grandes sonhos e perigos. Proclamada a Independência, coube a José Bonifácio comandar a política centralizadora e organizar as ações militares contra os focos de resistência à separação de Portugal.
E quais serão os próximos
projetos? "O primeiro será um livro sobre 1889, sobre o processo da Proclamação da República, e depois algum projeto de fôlego sobre a escravidão no Brasil. Antes, 1889, porque depois de um livro sobre 1808 e um livro sobre 1822, um livro sobre 1889 é, definitivamente, inevitável",
reconhece Laurentino, de pronto, anunciando que já iniciou as
pesquisas para o novo livro, o terceiro da trilogia, ainda sem data
prevista para o lançamento. Em 1889, ele diz, pretende detalhar a
situação do Brasil no Império e as variáveis que culminaram com a data da Proclamação da
República. Curiosamente, a obra vai se iniciar exatamente no ponto
em que termina "1822".
Com
"1889", Laurentino vai encerrar uma trilogia que cobre toda
a história do Brasil do século 19, iniciada com seu "best-seller" que recebeu o título preciso de "1808" pela
editora Planeta e que já vendeu 600 mil exemplares desde o
lançamento, em 2007. "Assim como '1822' é consequência natural
ao '1808', posso dizer o mesmo deste '1889' que virá. Quase fui
obrigado a escrevê-lo", completa, feliz da vida com o sucesso
que chegou de surpresa quando "1808" surgiu em destaque e permaneceu durante muito tempo em todas as
listas dos mais vendidos.
por
José Antônio Orlando.
ORLANDO, José Antônio. Dom Pedro ficou. In: Blog Semióticas, 20 de outubro de 2011. Disponível no link http://semioticas1.blogspot.com/2011/10/dom-pedro-ficou.html (acessado em … /… /...).
Como
citar:
ORLANDO, José Antônio. Dom Pedro ficou. In: Blog Semióticas, 20 de outubro de 2011. Disponível no link http://semioticas1.blogspot.com/2011/10/dom-pedro-ficou.html (acessado em … /… /...).
Trecho da apresentação do livro:
"Quem observasse o Brasil em 1822 teria razões de sobra
para duvidar de sua viabilidade como país. Na véspera de sua
independência, o Brasil tinha tudo para dar errado. De cada três
brasileiros, dois eram escravos, negros forros, mulatos, índios ou
mestiços. O medo de uma rebelião dos cativos assombrava a minoria
branca como um pesadelo. Os analfabetos somavam 99% da população.
Os ricos eram poucos e, com raras exceções, ignorantes. O
isolamento e as rivalidades entre as diversas províncias
prenunciavam uma guerra civil, que poderia resultar na fragmentação
territorial, a exemplo do que já ocorria nas colônias espanholas
vizinhas.
Para piorar a situação, ao voltar a Portugal, no ano anterior, o rei D João VI, havia raspado os cofres nacionais. O novo país nascia falido. Faltavam dinheiro, soldados, navios, armas ou munições para sustentar uma guerra contra os portugueses, que se prenunciava longa e sangrenta. Nesta nova obra, o escritor Laurentino Gomes, autor do best-seller 1808, sobre a fuga da família real portuguesa para o Rio de Janeiro, relata como o Brasil de 1822 acabou dando certo por uma notável combinação de sorte, improvisação, acasos e também de sabedoria dos homens responsáveis pelas condução dos destinos do novo país naquele momento de grandes sonhos e muitos perigos.
O Brasil de hoje deve sua existência à capacidade de vencer obstáculos que pareciam insuperáveis em 1822. E isso, por si só, é uma enorme vitória, mas de modo algum significa que os problemas foram resolvidos. Ao contrário. A Independência foi apenas o primeiro passo de um caminho que se revelaria difícil, longo e turbulento nos dois séculos seguintes. As dúvidas a respeito da viabilidade do Brasil como nação coesa e soberana, capaz de somar os esforços e o talento de todos os seus habitantes, aproveitar suas riquezas naturais e pavimentar seu futuro persistiram ainda muito tempo depois da Independência. Convicções e projetos grandiosos, que ainda hoje fariam sentido na construção do país, deixaram de se realizar em 1822 por força das circunstâncias."
Para piorar a situação, ao voltar a Portugal, no ano anterior, o rei D João VI, havia raspado os cofres nacionais. O novo país nascia falido. Faltavam dinheiro, soldados, navios, armas ou munições para sustentar uma guerra contra os portugueses, que se prenunciava longa e sangrenta. Nesta nova obra, o escritor Laurentino Gomes, autor do best-seller 1808, sobre a fuga da família real portuguesa para o Rio de Janeiro, relata como o Brasil de 1822 acabou dando certo por uma notável combinação de sorte, improvisação, acasos e também de sabedoria dos homens responsáveis pelas condução dos destinos do novo país naquele momento de grandes sonhos e muitos perigos.
O Brasil de hoje deve sua existência à capacidade de vencer obstáculos que pareciam insuperáveis em 1822. E isso, por si só, é uma enorme vitória, mas de modo algum significa que os problemas foram resolvidos. Ao contrário. A Independência foi apenas o primeiro passo de um caminho que se revelaria difícil, longo e turbulento nos dois séculos seguintes. As dúvidas a respeito da viabilidade do Brasil como nação coesa e soberana, capaz de somar os esforços e o talento de todos os seus habitantes, aproveitar suas riquezas naturais e pavimentar seu futuro persistiram ainda muito tempo depois da Independência. Convicções e projetos grandiosos, que ainda hoje fariam sentido na construção do país, deixaram de se realizar em 1822 por força das circunstâncias."