O
mal é feito sem esforço, naturalmente, é um
trabalho
do destino. O bem é produto da Arte.
---- — Charles
Baudelaire (1821-1867).
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A arte de pintar mensagens e imagens em muros e paredes é um gesto político que remonta às culturas da Antiguidade. No século 20, a atitude política de pintar mensagens nas paredes das cidades ganhou fôlego como prática da contracultura e com os protestos da década de 1960, identificados no Brasil com movimentos de resistência à censura e à violência da ditadura militar. Nas últimas décadas, contudo, o gesto de grafitar nas cidades deixou de ser algo improvisado às escondidas, registrado de forma clandestina em muros e fachadas, para ganhar cada vez mais prestígio não só nas ruas, também em grandes galerias e museus. Às vezes confundida pelos leigos com vandalismo, a arte do grafite não tem nenhuma relação com poluição, sujeira e agressão. Muito pelo contrário.
O valor da grafitagem e dos murais no espaço urbano teve um grande defensor e incentivador no artista plástico Rui Santana, morto em 2008, aos 48 anos, vítima de câncer. Ele dedicou anos de esforço à arte do grafite e costumava dizer que o grafite não vai mudar o mundo. “Não vai mudar o mundo, mas pode mudar as pessoas, a atitude que elas têm diante da vida e do mundo ao redor”, dizia, com as palavras que foram repetidas muitas vezes em conversas com amigos, nas aulas e em várias entrevistas. Artista plástico, fotógrafo, designer, professor e agitador cultural, Rui Santana deixou sua marca de inconformismo e de educação pela arte em todos aqueles que conviveram com ele – em Juiz de Fora, sua terra natal, mas também em Belo Horizonte, cidade que ele escolheu para viver e trabalhar, e em outras tantas cidades do Brasil e do mundo que ele visitou a trabalho ou pelo simples prazer da descoberta.
O valor da grafitagem e dos murais no espaço urbano teve um grande defensor e incentivador no artista plástico Rui Santana, morto em 2008, aos 48 anos, vítima de câncer. Ele dedicou anos de esforço à arte do grafite e costumava dizer que o grafite não vai mudar o mundo. “Não vai mudar o mundo, mas pode mudar as pessoas, a atitude que elas têm diante da vida e do mundo ao redor”, dizia, com as palavras que foram repetidas muitas vezes em conversas com amigos, nas aulas e em várias entrevistas. Artista plástico, fotógrafo, designer, professor e agitador cultural, Rui Santana deixou sua marca de inconformismo e de educação pela arte em todos aqueles que conviveram com ele – em Juiz de Fora, sua terra natal, mas também em Belo Horizonte, cidade que ele escolheu para viver e trabalhar, e em outras tantas cidades do Brasil e do mundo que ele visitou a trabalho ou pelo simples prazer da descoberta.
A empolgação de Rui no trato da arte impressionava – como destacam alguns dos depoimentos dos que conheceram seu trabalho intenso e inquieto em pintura, fotografia, desenho, colagens e grafite. "As pessoas costumam cobrar uma fidelidade a essa ou aquela escola, um respeito a determinada técnica. E o que eu quero é buscar uma linguagem própria, criando a minha visão de mundo. Procuro uma comunicação com o mundo e comigo mesmo", declarou o próprio Rui Santana em uma entrevista reproduzida no livro-tributo que foi lançado em sua homenagem, com sua fé inabalável nas qualidades da intuição.
O livro-tributo
O livro-tributo
Uma amostra das ideias, textos e obras realizadas pelo artista está agora reunida em uma publicação de qualidade – transcritos no livro-tributo “Rui Santana”, 47° volume da coleção Circuito Atelier, produzida pela Editora C/Arte e coordenada por Fernando Pedro e Marília Andrés. A edição e o lançamento do livro em homenagem a Rui Santana contou com apoio da família e dos amigos do artista.
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Organizado pelo jornalista Mateus Santana, filho de Rui, em parceria com o poeta Luiz Edmundo Alves, a edição traz em 96 páginas uma seleção de depoimentos, entrevistas, breves comentários sobre a trajetória do artista, reproduções coloridas de uma seleção de suas obras mais importantes e fotografias inéditas. "Rui foi um artista plural e antenado com seu tempo. Por sorte, também acompanhou o planejamento do livro", aponta Mateus Santana.
O lançamento do livro, numa manhã de sábado, na Alameda dos Jacarandás, Condomínio Canto das Águas, em Rio Acima, onde o artista mantinha seu ateliê – contou com uma programação para emocionar: música ao vivo, muitos artistas convidados e exibição de um vídeo sobre Rui, produzido com imagens de arquivo, sob a coordenação da jornalista e apresentadora da Rede Minas de Televisão, Mariana Tavares.
Para homenagear a arte de Rui Santana, o diretor do vídeo, Paulo Henrique Rocha, reuniu às imagens de arquivo uma série de entrevistas com os amigos e familiares para traçar um breve perfil do artista e educador, alegre e descontraído. Também houve uma grande mostra dos trabalhos de Rui no próprio atelier, a maior reunião já organizada de suas obras, e a inauguração de exposição virtual no site da Editora C/Arte (clique aqui para acessar).
Grafite e responsabilidade social
"Fui educado pela Imaginação/ Viajei pela mão dela sempre/ Amei, odiei, falei, pensei sempre por isso/ E todos os dias têm essa janela por diante/ E todas as horas parecem minhas dessa maneira" – aponta a epígrafe de Álvaro de Campos, um dos heterônimos de Fernando Pessoa, o poeta de referência para o artista, que abre o livro-tributo sobre Rui Santana.
"Sempre atento, Rui observou a arte com o olhar de um pássaro, conhecendo um universo amplo que o levou a reconhecer e a incluir o outro, como nos projetos coordenados com os grafiteiros, que tiveram a oportunidade de ter recuperado sua autoestima através do trabalho artístico. Essa preocupação social sempre esteve presente nas ações de Rui Santana”, destaca Fernando Pedro.
O mentor da editora C/Arte lembra que o artista Rui Santana fez valer sua responsabilidade social promovendo e orientando o trabalho dos grafiteiros e organizando eventos importantes como a BIG-BH, Bienal Internacional do Grafite em Belo Horizonte. A bienal, primeira e única, aconteceu entre os dias 30 de Agosto e 7 de Setembro de 2008, na Serraria Souza Pinto.
Coordenada por Rui Santana, a bienal foi o primeiro evento do gênero no mundo, e trouxe a BH uma extensa e bem-sucedida programação que incluiu seminários, oficinas de formação, exposições, lançamento de livros e revistas e intervenções urbanas em espaços públicos da cidade. Com atrações vindas dos quatro cantos do mundo, que incluíam países como Inglaterra, Holanda, Japão, Alemanha, Chile, Porto Rico e Estados Unidos, a Bienal Internacional do Grafite mostrou o que vem sendo produzido nos cenários nacional e mundial da arte das ruas, dos muros e das fachadas de prédios e casas.
A cena do grafite
A cena do grafite
“Nossa ideia é transformar este espaço da bienal em uma grande galeria, com desenhos, pinturas, estêncils e stickers”, declarou Rui Santana na abertura da BIG-BH, ressaltando também o papel histórico de Belo Horizonte como uma cidade que sempre foi uma grande geradora de talentos. "Nas artes plásticas temos uma grande tradição que vem de longa data, e a cena do grafite – que é recente, mas que tem se mostrado fortíssima na capital – cresce em ética e estética com diversos projetos, grande parte deles beneficiado comunidades da periferia”, explicou.
“Faço questão de manter uma produção artística, porque sou um apaixonado pela pintura e também porque, como educador, tenho que estar sempre dinamizando a arte”, diz Rui Santana em um dos textos selecionados para a publicação da C/Arte. Para seu filho, Mateus Santana, a obra de Rui aponta para o futuro e para a importância da democratização do acesso à arte e à cultura. Segundo Mateus, há ainda um acervo de trabalhos inéditos de Rui Santana que serão apresentados ao público em eventos futuros.
Vida de artista: acima, Rui Santana
homenageado no grafite de Gabriel Dias.
Abaixo, amostras da arte de Rui Santana
em pinturas que combinam técnicas em
tinta acrílica, óleo sobre tela e aquarelas
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"Vamos planejar exposições para apresentar as últimas obras inéditas de Rui, incluindo seus três últimos quadros em grandes formatos", explica Mateus. Ele também destaca a disposição que Rui Santana sempre teve para os novos projetos e para os enfrentamentos cotidianos da vida de artista. "Rui participava de tudo e acompanhava tudo. O livro é uma homenagem merecida por tudo aquilo que ele fez", completa.
Um epitáfio do artista
Para concluir este breve artigo, lembro da canção "Vida de Artista", de Itamar Assumpção, canção e artista preferidos de Rui Santana. Também lembro que "existir é ser possível haver ser" – poderia ser o epitáfio do artista, parodiando Fernando Pessoa e seus heterônimos. Ou, como registrou no poema "Passagem das horas" Álvaro de Campos, heterônimo de Pessoa, outro dos seus preferidos:
“Ah, perante esta única realidade, que é o mistério,
Perante esta única realidade terrível — a de haver uma realidade,
Perante este horrível ser que é haver ser,
Perante este abismo de existir um abismo,
Este abismo de a existência de tudo ser um abismo,
Ser um abismo por simplesmente ser,
Por poder ser,
Por haver ser!
— Perante isto tudo como tudo o que os homens fazem,
Tudo o que os homens dizem,
Tudo quanto constroem, desfazem ou se constrói ou desfaz através deles, Se empequena!
Não, não se empequena... se transforma em outra coisa —
Numa só coisa tremenda e negra e impossível,
Uma coisa que está para além dos deuses, de Deus, do Destino
— Aquilo que faz que haja deuses e Deus e Destino,
Aquilo que faz que haja ser para que possa haver seres,
Aquilo que subsiste através de todas as formas,
De todas as vidas, abstratas ou concretas
Perante esta única realidade terrível — a de haver uma realidade,
Perante este horrível ser que é haver ser,
Perante este abismo de existir um abismo,
Este abismo de a existência de tudo ser um abismo,
Ser um abismo por simplesmente ser,
Por poder ser,
Por haver ser!
— Perante isto tudo como tudo o que os homens fazem,
Tudo o que os homens dizem,
Tudo quanto constroem, desfazem ou se constrói ou desfaz através deles, Se empequena!
Não, não se empequena... se transforma em outra coisa —
Numa só coisa tremenda e negra e impossível,
Uma coisa que está para além dos deuses, de Deus, do Destino
— Aquilo que faz que haja deuses e Deus e Destino,
Aquilo que faz que haja ser para que possa haver seres,
Aquilo que subsiste através de todas as formas,
De todas as vidas, abstratas ou concretas
(...)
Tenho eu a inconsciência profunda de todas as coisas naturais,
Pois, por mais consciência que tenha, tudo é inconsciência,
Salvo o ter criado tudo, e o ter criado tudo ainda é inconsciência,
Porque é preciso existir para se criar tudo,
E existir é ser inconsciente, porque existir é ser possível haver ser,
E ser possível haver ser é maior que todos os Deuses.”
por José Antônio Orlando.
Como
citar:
ORLANDO,
José Antônio. Vida de artista. In: Blog
Semióticas, 9 de outubro de 2011.
Disponível no link
https://semioticas1.blogspot.com/2011/10/vida-de-artista.html (acessado em .../.../...).