Grandes tesouros da arte produzida do século 15 ao século 18 foram reunidos na exposição “Mestres da Gravura – Coleção Fundação Biblioteca Nacional”. Com 170 obras originais que fazem parte do acervo Real Biblioteca de Portugal, a exposição chegou ao público no Palácio das Artes, em Belo Horizonte, seguindo depois um extenso roteiro para exposições em outras capitais e cidades brasileiras. Produzidas pelos artistas mais importantes de diversas escolas europeias, as gravuras do acervo estão sob a guarda da Biblioteca Nacional, com sede no Rio de Janeiro, desde 1808, quando a corte portuguesa de Dom João VI transferiu o acervo de Lisboa para o Brasil.
Reunidos no acervo de quatro séculos da história da arte estão
81 grandes mestres do estilo com gravuras originais que representam
mitologias, alegorias, paisagens e cenas religiosas criadas na época
do Renascimento, do Maneirismo, do Barroco e do Rococó. Fazem parte
da exposição itinerante 30 gravuras da coleção alemã, 27 da holandesa, 35
da italiana, 26 da francesa, 14 da flamenga, oito da inglesa, 18 da
espanhola e 13 da portuguesa, em técnicas predominantes de
xilogravura (gravura impressa a partir de uma matriz de madeira) e
gravura a metal – incluindo obras em talho-doce ou gravura a buril,
gravura à ponta-seca, à água-forte, à maneira-negra, à
água-tinta e pontilhados em técnica mista.
As obras em exposição
foram criadas por artistas considerados os mais importantes da História da Arte, entre eles Albrecht Dürer (o principal nome da
renascença alemã), Rembrandt
Harmenszoon van Rijn (o maior da arte
neerlandesa) e Francisco José de Goya y Lucientes, o artista mais
importante do Romantismo na Espanha. Também foram selecionadas para
a mostra, entre as mais de 30 mil peças do acervo, obras satíricas
do inglês William Hogarth, que refletia sobre os desmandos da
política em seu tempo e acabou gerando o termo Hogartianas; o
italiano Giovanni Battista Piranesi, que registrava a arquitetura com
detalhes e é forte influência na arte contemporânea; a
extraordinária arte burlesca do francês Jacques Callot; e o talento
de retratista do flamengo Anton Van Dyck, entre outros grandes mestres.
O acervo de obras-primas em exposição, com curadoria
de Fernanda Terra, abarca artistas que nasceram do século 15 ao 18 e
obras concebidas de acordo com as técnicas mais avançadas que foram
desenvolvidas no período – a única exceção são algumas obras
de Goya, que foram criadas em 1815 e trazidas posteriormente para o
Brasil, mas ainda assim o artista espanhol é tido essencialmente
como um gravador do século 18. A grande maioria do acervo de
gravuras foi adquirida por Portugal no período anterior ao
terremoto que arrasou Lisboa em 1755 – e sobreviveram ao terremoto,
ao maremoto e aos incêndios sucessivos que destruíram a cidade.
Trazidas para o Brasil por Dom João VI, a coleção de
gravuras, juntamente com milhares de caixas que incluíam livros,
partituras e mapas, deu origem à Biblioteca Nacional, que mantém
sua sede no Rio de Janeiro. Considerada a maior biblioteca da América
Latina, a Biblioteca Nacional também foi nomeada pela UNESCO entre
as 10 mais importantes do mundo. Todas as gravuras em exposição
foram selecionadas do acervo que hoje conta com mais de 30 mil obras,
raramente exibidas ao público. Em 2012, nos 200 anos da Biblioteca
Nacional, a mesma mostra foi aberta no Rio de Janeiro e, nos anos seguintes, foi
apresentada em Brasília e outras capitais. Depois de Belo Horizonte, a exposição
segue para Salvador e depois prossegue em um roteiro itinerante pelo Recife e outras capitais do Nordeste e Norte do Brasil.
A
Acervo de relíquias preciosas
Acervo de relíquias preciosas
Todo o acervo da mostra que vem sendo apresentada nas capitais também está
reproduzido em um livro belíssimo de capa dura e 240 páginas.
Organizado pela mesma curadora Fernanda Terra e com o mesmo título
da exposição “Mestres da gravura – Coleção Fundação
Biblioteca Nacional”, o livro foi coeditado pela Artepadilla,
Caramurê Publicações e Fundação Biblioteca Nacional, com
patrocínio da Petrobras. Além do acervo completo da mostra, com
imagens em fac-símile das 170 gravuras tanto em xilogravuras, a mais
antiga técnica de gravar sobre papel, quanto nas variadas técnicas
de gravação em metal, a publicação inclui um breve histórico de
cada gravador e artigos assinados por especialistas.
A edição de luxo, subdivida em oito coleções e
organizada por ordem cronológica e pela geografia de nascimento dos
artistas, acompanha as mudanças técnicas da gravura através dos
séculos – percurso delimitado pelos artigos “Mestres da gravura:
Coleção Biblioteca Nacional”, resultado da pesquisa de Fernanda
Terra; “Breve história da biblioteca: entre livros e símbolos”,
escrito pela historiadora Lilia Moritz Schwarcz; e “Manter o
passado no futuro”, assinado pelo presidente da Fundação
Biblioteca Nacional, Renato Lessa. Um texto mais extenso e minucioso
apresenta e descreve a Divisão de Iconografia da FBN, assinado por
Monica Carneiro Alves e Monica Velloso Azevedo.
Entre as centenas de preciosidades, os artigos destacam
as séries mais valiosas do acervo da exposição, que não têm
equivalentes em nenhuma outra coleção conhecida. Dos grandes
mestres, ganham destaque pela ordem cronológica o item mais antigo
do acervo, “Jesus Cristo descendo ao Limbo”, assinado por Andrea
Mantegna (1431-1506). Na sequência está Albrecht Dürer
(1471–1528), com as séries bíblicas dedicadas ao “Apocalipse”
e a “Adão e Eva”, ambas datadas por volta de 1500, nas quais
transparecem avanços no estudo das proporções humanas e a imensa
variedade de tons e de texturas.
Importância histórica e simbólica
Na lista dos autores das obras mais valiosas do acervo também estão
Rembrandt (1606–1669), com uma seleção de 12 gravuras, entre as
quais estão quatro autorretratos; Francisco Goya (1746-1828), exímio
gravador e maior pintor da Espanha no século 18, presente no livro e
na exposição com nove obras-primas da série “Os provérbios” e
mais cinco ilustrações para uma edição de “D. Quixote”, de
Cervantes; e o italiano Giovanni Piranesi (1720-1778), que aparece
com as séries “Le carcere d’invenzione” e “Le Antichità
romane”.
No
que se refere à importância histórica e simbólica da coleção
Mestres da Gravura, a historiadora Lilia Moritz Schwarcz destaca em
seu artigo uma questão política, dramática e crucial: a coleção
era tão valiosa que, na conta que o Brasil teve que pagar a Portugal
pela sua Independência, a partir de 1822, o acervo da Biblioteca
Nacional surgiu em um surpreendente segundo lugar, depois apenas do
saldo da dívida pública.
“A
batalha
acabou sendo ganha pelo Brasil, mas teve custo alto” – avalia Lilia Schwarcz. O acervo da Biblioteca Nacional aparecia avaliado em 800
Contos de Réis, um valor tremendamente alto no montante da dívida.
“Para se ter uma ideia mais precisa”, destaca,
“tal valor correspondia a 12,5% do total a ser pago, quatro vezes
mais do que a famosa prataria da coroa ou do que a equipagem deixada
no Brasil. Significava, portanto, muito, e em muitos sentidos:
autonomia por aqui, desapego para o lado de lá. Incrível pensar
como os livros, mais uma vez, eram protagonistas, desta vez na conta
que se pagava pela liberdade do país”.
Muito
além do valor em dinheiro, ressalta Lilia Moritz Schwarcz, havia a
importância simbólica – para um país tão jovem como era o
Brasil, foi uma forma de afirmação e mesmo de soberania contar com
tal acervo de preciosidades em uma biblioteca que ostentava
proporções monumentais, só comparável já naquela época à
biblioteca nacional dos Estados Unidos, superando em valor e
importância a maioria dos países da Europa e toda a extensão das
Américas. Não é pouco, definitivamente.
por
José Antônio Orlando.
Como
citar:
ORLANDO,
José Antônio. Mestres
da Gravura.
In: Blog
Semióticas,
28
de abril
de
2014.
Disponível no link
http://semioticas1.blogspot.com/2014/04/mestres-da-gravura.html
(acessado em .../.../…).
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Lista
completa de artistas da exposição
Mestres da Gravura
COLEÇÃO
ALEMÃ
Albrecht
Durër, Martin Schongauer, Israel van Meckenen, Lucas Cranach, Hans
Sebald Beham, Martin Treu, Georg Pencz, Heinrich Aldegrever, Virgil
Solis.
COLEÇÃO
HOLANDESA
Rembrandt
Harmenszoon van Rijin, Lucas van Leyden, Cornelis Cort, Hendrik
Goltzius, Zacharias Dolendo, Jan Müller, Jacob Matham, Jan
Saenredam, Nicolas Ennes Visscher, Willem Jacobsz Delff.
COLEÇÃO
ITALIANA
Giovanni
Battista Piranesi, Andrea Mantegna, Benedetto Montagna, Agostino dei
Musi (o Veneziano), Marco Antonio Raimondi, Giovanni Battista Ghisi
(o Mantuano), Marcos Dente, Jacopo de Barbari, dito Mestre do
Caduceu, Mestre do Dado, Adamo Ghisi, Enea Vico, Lodovico Carracci,
Agostino Carracci, Annibale Carracci, Francesco Brizzi, Guido Reni,
Stefano della Bella, Giovanni Benedetto Castiglioni, Salvatore Rosa,
Francesco Bartolozzi, Giovanni Volpato.
COLEÇÃO
FRANCESA
Jacques
Callot, Noel Garnier, François Perrier, Claude Mellan, Egidio
Rousselet, Gérard Audran, Étienne Picart, dito o Romano, Gerard
Edelinck, Petrus Devret, Charles Dupuis, Henri Simon Thomassin.
COLEÇÃO
FLAMENGA
Jacob
Van Den Bos, Jan Sadeler Sênior, Raphael Sadeler (o Velho), Cornelis
Galle Sênior, Egidius Sadeler, Raphael Sadeler (o Jovem), Anton van
Dyck, Pieter de Jode, Paulus Pontius.
COLEÇÃO
INGLESA
William
Hogarth, Benjamin Smith, Peter Simon, Charles Gauthier Playter, John
Ogborne, Samuel Middiman, Robert Thew.
COLEÇÃO
ESPANHOLA
Francisco
Goya, José de Ribera, Manuel Salvador Carmona, Fernando Selma,
Francisco Muntaner, Joaquín Ballester, Joaquín Fabregat.
COLEÇÃO
PORTUGUESA
Vieira
Lusitano (Francisco Vieira de Matos), Joaquim Manuel da Rocha,
Antonio Joaquim Padrão, Manuel da Silva Godinho, Gregorio Francisco
de Queiroz, João Caetano Rivara.