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Ut quod ali
cibus est aliis fuat acre venenum.
(O
que é alimento para alguns, é amargo veneno para outros – In: "De
Rerum Natura", Titus Lucretius Carus, século 1° antes de Cristo).
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Enquanto os
brasileiros acompanham sucessivas ameaças de retrocessos nas questões
dos Direitos Humanos e das liberdades individuais, com propostas anacrônicas de legislações para
internação compulsória e endurecimento da repressão ao uso de
psicoativos, em muitos países a discussão avança não só na
descriminalização, mas também na abrangência em questões de
saúde, educação e – por que não? – arte e cultura. Uma seleção de peso da produção
de artistas sob a influência das drogas é o que propõe uma
corajosa e oportuna exposição organizada pela Maison
Rouge, um dos nobres endereços de referência em Paris sobre artes
plásticas e design.
“Sous
Influences – Arts plastiques et produits psychotropes” (Sob
influência – artes plásticas e psicotrópicos) reuniu um
acervo extenso e diversificado de 250 obras-primas de 90 artistas de vários estilos, várias épocas
e vários países, incluindo trabalhos do brasileiro Hélio Oiticica. Todas as obras selecionadas para a mostra, de algum modo, estão ligadas aos efeitos de substâncias
psicoativas e a maioria delas vem com a indicação “criada pelo
artista em estados alternativos de consciência”. Como se pode
prever, cada artista em cada criação apresentada tenta capturar
sensações ou até mesmo alucinações provocadas pelas mais
variadas experiências nas aventuras da percepção.
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Aventuras
da percepção: no alto da página,
Cogumelo
venenoso fluorescente, instalação
e
fotografia de 2004 de Carsten Höller, obra
que
abre o catálogo da exposição apresentada
na Maison
Rouge, em Paris. Acima,
Trip
triptych (1983), uma homenagem
do
alemão Ralf Winkler ao outsider e
artista
do grafite Jean-Michel Basquiat.
Abaixo, Basquiat em Nova York, em 1982, com Annina Nosei, que foi sua primeira agente; Dos cabezas, Andy Warhol e Basquiat em pintura de 1982 de Basquiat; e Basquiat em ação na Factory de
Andy
Warhol, em Nova York, fotografado
em
1985 por Lizzie Himmel e em
1983 por Lee Jaffe. Também abaixo, visitante observa uma pintura de Basquiat sem título, identificada como Pecho/Oreja
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“Desde
o início dos tempos, desde o alvorecer da civilização humana, os
artistas sempre encontraram pelo caminho substâncias psicoativas em
plantas, fungos, maceração e bebidas as mais variadas, que levaram
a passagens místicas, à iluminação, mas também provocaram
confusão, intoxicação, morte” – explica Antoine Perpère,
curador da exposição na Maison Rouge e coordenador de um centro de
atendimento a dependentes químicos em Paris.
No
texto em que apresenta a exposição, Perpère repete um célebre
enunciado – “a diferença entre remédio e veneno é a dose” –
atribuído desde a Idade Média ao místico Paracelso (1493–1541),
um dos fundadores da Farmacologia, mas também poderia lembrar
grandes poetas e pensadores dos últimos séculos como Charles Baudelaire, Arthur Rimbaud,
Sigmund Freud, Walter Benjamin, Dylan Thomas, Aldoux Huxley, Allen Ginsberg, William Burroughs, Timothy Leary, Michel Foucault e Jim Morrison, entre
outros que dedicaram a experiências com embriaguez, alucinógenos, e
outros estados alterados de consciência, escritos preciosos, alguns
deles destacados entre os documentos em exposição.
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Aventuras
da percepção: acima,
entrada
principal da Maison Rouge, em
Paris,
com instalações multicoloridas,
ópio
no aroma do incenso e sensações
lisérgicas
provocadas por peças exclusivas
de
design e pelas obras da exposição
Sob
influência. Acima, três cartazes em
homenagem
a Timothy Leary, um dos
mentores
do LSD, com arte do músico e
performer
multimídia francês Jaïs Elalouf.
Abaixo, Sans
titre, escultura em tubos de
PVC
de 2007 de Vincent Mauger
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Psicofármacos e êxtase, pesquisa estética
"Os
artistas, que sempre permanecem em busca de novas formas de criação,
de transgressões, de estímulos, de caminhos para a imaginação,
nunca estiveram alheios à descoberta dos efeitos das mais variadas
experiências, inclusive a transgressão das drogas", reconhece
Perpère. Para ressaltar os fundamentos da exposição, ele alerta
sobre um necessário juízo de valor, uma vez que a proposta da curadoria foi traduzir, transcrever e documentar determinadas experiências de artistas a partir de substâncias psicotrópicas, antigas e novas, na tentativa de permitir que cada indivíduo perceba a complexidade constante de seus efeitos.
“O
artista não é um drogado como qualquer outro porque o artista tem a
preocupação de traduzir e transmitir o que vivenciou ao estar sob
aquela influência", afirma o curador. Perpère enumera algumas
questões conceituais sobre o “corpus”, antes de concluir a breve
apresentação com um alerta: segundo o curador, a exposição,
inédita e ousada, não tem por objetivo fazer julgamentos morais e
muito menos apologia das drogas, mas sim buscar a reflexão e um
melhor entendimento sobre as conexões entre processos criativos e o
uso instrumental de substâncias psicoativas.
Entre
os artistas reunidos em “Sous Influences” estão desde expoentes
das vanguardas do começo do século 20, como Francis Picabia,
Antonin Artaud e Jean Cocteau, até nomes contemporâneos como o
grafiteiro e pintor Jean-Michel Basquiat, o cineasta Larry Clark, os
fotógrafos Nan Goldin e Irving Penn, o pioneiro da arte multimídia
Nam June Paik e também seu discípulo Takashi Marakami, entre
outros, além de Damien Hirst, o multimilionário e supervalorizado
inventor de instalações bizarras e polêmicas que ganharam a mídia
na última década – com suas esculturas hiperrealistas de casais
em mirabolâncias sexuais e urnas de vidro transparente com tubarões,
vacas e ovelhas reais flutuando em formol.
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Aventuras da percepção: no alto,
L'Aspirine c'est le
champagne du matin,
instalação criada em 2009 em lâmpadas de
LED e alumínio pela
francesa Jeanne
Suspuglas. Acima e abaixo, Dots Obsession
(Infinity Mirrored Room), 1998
(Obsessão pelas bolinhas no
infinito
quarto espelhado), instalação psicodélica
com espelhos, luzes e formas infláveis de
plástico flutuantes que simulam o infinito,
uma criação da arquiteta e artista plástica
japonesa Yayoi
Kusama
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Nesta
exposição em Paris, Hirst surpreende mais uma vez com uma obra
inédita, cifrada e complexa, simples apenas na aparência: batizada
de “A Última Ceia”, pode ser descrita como uma série de
serigrafias emuldoradas e dependuradas em uma parede. O que Damien
Hirst faz é substituir as figuras de Jesus Cristo e seus 12
apóstolos por embalagens de remédios, cujos nomes foram trocadas
por marcas de alimentos típicos da Inglaterra, como batatas,
tomates, salsicha e feijão. Com isso, põe em destaque a denúncia
sobre o peso que medicamentos controlados têm na vida cotidiana de
milhões e milhões de pessoas.
Oiticica:
anarquista, concretista, tropicalista
Mas
Damien Hirst não é o maior destaque nem o mais ousado entre os
artistas reunidos na exposição pioneira em Paris. Um dos que
roubaram a cena e provocaram sensação na imprensa internacional, na
abertura da exposição, foi o brasileiro Hélio Oiticica (1937–1980)
, único latino-americano selecionado para a mostra. Apontado como
“anarquista e atualíssimo” pela curadoria, pioneiro da Arte
Concreta, do Neo-Concretismo e do Tropicalismo, iconoclasta e
teórico, Oiticica está presente em “Sous Influences” com uma de
suas intervenções incendiárias e incomuns nas proposições de
suporte: a obra “Quasi-Cinema 02.CC5”, desenvolvida em 1973 para
a série “Cosmococa”.
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Aventuras da percepção: no alto,
Last Supper (2013), a “ última
ceia”
em instalação com serigrafias de
Damien Hirst, que
substituiu as
imagens de Cristo
e seus 12
apóstolos por embalagens de
remédios com nomes de marcas
de alimentos típicos da Inglaterra.
Acima, o brasileiro Hélio
Oiticica no
ateliê, no Rio de Janeiro, e a imagem
de Jimi Hendrix
na incendiária
Quasi-Cinema 02.CC5, instalação
que
Oiticica desenvolveu em 1973
para a série Cosmococa, agora em
destaque na mostra da Maison Rouge.
Abaixo, duas fotografias selecionadas de 1998 de Michel François, "Petite fille
et boteille" e "L. a la datura"; três grafites de Ernest Pignon fotografados nas ruas de Paris em homenagem a Arthur Rimbaud; e um breve registro em vídeo sobre as obras e instalações da exposição
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Hélio Oiticica,
sempre lembrado por seus “Parangolés”, alegorias pontuadas de
enigmas para vestir, questionador e indiferente a estilos e modismos,
traduz o universo e a mística das drogas ilícitas através da
distorção sobre uma imagem conhecida de um dos heróis da era do
rock. Em direções opostas das previsíveis variações cromáticas chapadas de
seu contemporâneo Andy Warhol, com quem conviveu durante vários períodos em Nova York, na
década de 1970 – a intervenção de Oiticica questiona não a percepção das cores, mas o sentido das coisas:
sua instalação fica em cima de uma mesa tradicional de madeira que
tem, sobre os traços do rosto de Jimi Hendrix, linhas de pó branco,
utilizando a capa do disco “War Heroes” como bandeja e, sob a
capa, uma folha de papel alumínio.
Warhol, aliás, é uma das ausências sensíveis em
“Sous Influences” – lembrado apenas indiretamente por citações
ou por obras de seus pupilos e discípulos selecionados, certamente deixado de fora por conta das dificuldades burocráticas para a exibição de suas obras originais ou de réplicas em suportes variados. Mesmo considerando uma ou outra ausência sensível pelas afinidades do tema abordado, pelo que se
vê nas imagens de divulgação e no “dossiê de imprensa” (veja
links para visita virtual à mostra na Maison Rouge no final deste
artigo), a curadoria teve o cuidado de reservar detalhes que podem
levar o visitante à imersão em uma autêntica experiência
psicodélica, com ambientes que aguçam por contraste todos os
sentidos, em roteiros com iluminação surpreendente, pontuados de
belas e estranhas imagens, acordes de música suave, ruídos
intrigantes e até aromas simultâneos.
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Aventuras da percepção: no alto,
pílulas
e comprimidos diversos,
agulhas, fragmentos de radiografias,
acrílico e resina sobre madeira na
instalação Gravity's
Rainbow Small
(Arco-íris de pequena gravidade),
trabalho de 1998
do norte-americano
Fred Tomaselli. Acima, artista islandês
Erró, colaborador de Björk, compara
seringa usada por viciados a arma
poderosa em Dáileog 2013 (Uma dose),
painel de 1,70cm de altura em diversas
técnicas, inspirado em personagens e
design de histórias em quadrinhos.
Abaixo, Autorretratos: o primeiro de
Antonin Artaud, ator, dramaturgo, poeta,
escritor, artista plástico, anarquista e dissidente do movimento surrealista, com obra em giz e carvão sobre papel, de 1947; o segundo, pintura
em óleo sobre tela de 1939 do polonês
Stanislaw Ignacy Witkiewicz, também
dramaturgo, romancista, pintor,
fotógrafo, filósofo da arte e antropólogo,
que foi oficial do Exército Russo durante a Primeira Guerra Mundial. Tanto Artaud como Witkiewicz, com suas experiência na arte e na literatura, traduzem e simbolizam os efeitos das
drogas psicotrópicas e alucinógenas
sobre as sensações táteis e visuais
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O visitante encontra, a partir da entrada da galeria
principal da Maison Rouge, decoração e objetos em cores contrastantes, espelhos estrategicamente posicionados para provocar sensações de duplicidade ou vertigem, incensos que simulam cheiro de ópio e uma
instalação lisérgica em Optical Art, do artista belga Carsten
Höller, nomeada como "Swinging Corridor" (Corredor flutuante), criada em 2005 e reconstruída para o espaço de acesso à exposição, que leva o observador a acreditar que as paredes estão tremendo
e em ligeiros movimentos contínuos. Os relatos do público indicam o
efeito alcançado: segundo a curadoria, a maioria dos entrevistados
na saída da instalação diz, muito surpresa, que chegou a sentir de forma nítida os efeitos da
embriaguez e de outras viagens alucinógenas.
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Aventuras da percepção: presença
do fotógrafo Irving
Penn na mostra
Sous Influence, com duas imagens
da série fotográfica Mégots, de 1974,
com resíduos e pontas de cigarro
e de marijuana elevados ao status
de obra
de arte. No alto, Dessin
sous
l’influence du haschich (1853), do
médico Jean-Martin
Charcot,
que foi professor de Freud.
Abaixo, reconstituição de uma instalação da década de 1960 do artista e cineasta francês Daniel Pommereulle, nomeada como Objetos de tentação, com uma mesa
de mármore cheia de drogas e objetos
usados para consumi-las
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Além
de obras-primas de vários momentos da História da Arte, a mostra
em Paris também reúne objetos raros, como uma seleção de equipamentos
utilizados através nos tempos nas práticas de Farmacologia. Nesta
seção, são especialmente enigmáticos os desenhos da série a
nanquim feitos “sob a influência de haxixe”, a partir de 1853,
por um dos nomes de destaque no Panteão das Ciências: Jean-Martin
Charcot (1825–1893), célebre médico e cientista francês, autor
de importantes contribuições para o conhecimentos de diversas
doenças e síndromes, pioneiro da psiquiatria e professor de alunos
que se tornariam referência até nossos dias, entre eles Sigmund
Freud, Joseph Babinski e James Parkinson, entre vários outros.
Cenas e imagens de impacto
Na mesma seção da exposição, há também uma grande sala com fotografias e réplicas de objetos usados para o
consumo de drogas no mundo inteiro – com destaque para a instalação
de equipamentos de experiências sociais realizadas no decorrer do século 20 e na atualidade em países europeus como
Suíça, Dinamarca, Holanda e outros, que têm espaços autorizados e
livres com infraestrutura para viciados e dependentes químicos.
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Aventuras da percepção: fotografia
e cinema na exposição sobre arte e
drogas da
Maison Rouge, com Fix,
de 2012 (no alto), do fotógrafo espanhol
Alberto Garcia-Alix. A palavra “Fix”
escrita na
parede é uma gíria usada
para “dose de droga”, normalmente
injetada.
Acima, Le
Poète Exhale
(O poeta exala), fotografia de
1959
de Lucien
Clergue
que retrata
Jean
Cocteau, ativista
cultural,
cineasta, poeta, escritor, dramaturgo,
artista
plástico, diretor de teatro e ator.
Abaixo, Jean Cocteau fotografado em
1922 por Man Ray; um retrato de Jean Cocteau e Jean Marais, fotografados em 1939 por Cecil Beaton; e Jean Marais em cena de Orfeé, filme de 1950 de Cocteau. Viciado em ópio
e álcool, Cocteau retratou as alterações dos sentidos da percepção provocadas
pelos alucinógenos em diversos trabalhos, entre eles o célebre poema Ópium, de 1930, escrito e ilustrado “sob influência”
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Entre tanta obra surpreendente em exposição, uma das séries mais inusitadas são os autorretratos do norte-americano Bryan Lewis
Saunder, todos declaradamente criados sobre efeito de drogas – com
seu uso minucioso desde 1995 de pelos menos uma substância diferente
a cada dia, ou a cada autorretrato, inspirado pelas variações e
misturas mais escatológicas, de molhos absurdamente picantes a
álcool, chás alucinógenos, cristais de metanfetamina, maconha,
ópio, haxixe, cocaína e os mais diversos medicamentos “legais”.
Viagens com anfetaminas, LSD e tudo o mais também são traduzidas por
diversos outros, inclusive em autorretratos – caso das duas séries
de homenagens ao lendário Timothy Leary, professor de Harvard, ícone
maior dos anos 1960, um dos mentores do LSD. Leary e o LSD são
inspiração para os cartazes do artista multimídia francês Jaïs
Elalouf e para as pinturas surrealistas do austríaco Arnulf Rainer,
“Faces Farces”, autorretratos após o artista ter passado por alucinações com
misturas de ácidos. Rainer, há alguns anos, foi ele mesmo objeto de estudos por especialistas, tendo participado de um programa de pesquisa científica da
Universade de Lausanne sobre os efeitos do uso de drogas como o LSD.
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Aventuras
da percepção: três imagens
de Faces
Farces, uma sequência de
autorretratos
do fotógrafo e pintor
austríaco Arnulf
Rainer, todos feitos
sob
influência, depois de alucinações
provocadas
por experiências com LSD.
Abaixo,
uma serigrafia da série de 1987
American
Express, do artista francês
Raymond
Hains, que reconstituiu imagens
para
demonstrar o efeito de distorções da
visão
após o consumo de LSD e ácidos
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O efeito infinito
Experiências com ácidos, anfetaminas e alucinógenos
também fornecem o ambiente e a pesquisa de materiais e formas para a
arquiteta e designer japonesa Yayoi Kusama. A partir de suas próprias
viagens, registradas em um “diário eletrônico”, Yayoi Kusama deu
início às pinturas e desenhos minimalistas que se repetem na
estamparia que cobre suas instalações de labirintos – cenários
onde o visitante pode penetrar e que parecem saídos de um parque de diversões do futuro, com luzes,
espelhos e estruturas psicodélicas que simulam o infinito.
Entre as fotografias, há muitas imagens fortes –
mas as de maior impacto por certo vem de Larry Clark, conhecido no
mundo inteiro desde o cruel e realista “Kids” (1995), que mostra
em tom de documentário o cotidiano de adolescentes às voltas com
skates, Aids e todo tipo de uso diversional de drogas. Na exposição,
Larry Clark apresenta uma série documental em sépia e preto e
branco sobre viciados e suas práticas nos Estados Unidos – entre eles uma grávida
injetando heroína.
O visitante também tem à disposição muitos filmes e
peças de videoarte exibidos em grandes telões de alta definição.
“Filmes e vídeos em suportes variados desempenham um papel
especialmente importante nesta exposição”, explica Antoine
Perpère, lembrando que só através do registro audiovisual é
possível reconstituir experiências efêmeras e em alguns casos
transcendentais, místicas, como as performances de Isadora Duncan,
Artaud, o cinema poético e surrealista de Jean Cocteau, as
performances contemporâneas de criação coletiva.
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Aventuras da percepção: acima, três
autorretratos em técnicas diversas pelo
norte-americano Bryan Lewis Saunders,
que desde 1995 realiza pelo menos um
autorretrato por dia depois de fazer
“experiências” com os mais diversos tipos
de drogas e medicamentos. A partir do
alto, as telas batizadas de Marijuana;
½ Gramme cocaine; e Nature.
Abaixo, Morphine
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Nas palavras do curador, o potencial do audiovisual
surge como uma atualização das experiências ancestrais do Shaman –
o curandeiro que viaja em espírito a outra dimensão e retorna para
contar o que aprendeu para seus pares na tribo. No caso dos registros
em exposição, filmes e peças em videoarte parecem permitir um melhor
entendimento sobre a própria produção em artes plásticas,
especialmente nos casos selecionados, em que se pode acompanhar desde
tentativas iniciais de criação e transcrição pelo artista até a
possibilidade de reconstituir, a partir da obra final. os processos de determinadas intuições
ou percepções.
Antoine
Perpère também alerta sobre a urgência da sociedade discutir a
questão do uso diversional e medicinal de substâncias atualmente
consideradas drogas lícitas ou ilícitas. “O que posso dizer é
que tudo indica que guerra às drogas não funciona. Sou a favor da
descriminalização do uso de drogas”, reconhece o curador. Seu
argumento principal: na História da Civilização, as experiências com psicoativos não têm nada de novo. Vêm de séculos e, em alguns
casos, milênios. Sem contar que substâncias como café, tabaco,
álcool e tantas outras, hoje consumidas normalmente em larga escala, no mundo inteiro, um dia também já foram proibidas e consideradas ilícitas.
por José Antônio Orlando.
Como
citar:
Para uma visita virtual à exposição na Maison Rouge, clique aqui.
Para ler o "dossiê de imprensa" da exposição "Sous Influence", clique aqui.