Acontece
que quando
você olha para um animal, você pensa
que talvez ele se lembre de algo que as pessoas esqueceram.
–– Amós
Oz.
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Pesquisadores
da vida animal e das ciências naturais tiveram uma grata
surpresa: o Biodiversity Heritage Library (BHL), consórcio de
bibliotecas de História Natural, Zoologia e Botânica, criado em
2005, que reúne mais de 40 instituições de vários países,
liberou na Internet, na última semana, para consulta e impressão gratuita, uma
preciosidade – o lendário e até então pouco conhecido “Atlas
de Zoologia”, escrito pelo paleontólogo francês François Louis
Paul Gervais (1816–1879) e publicado em 1844, em Paris, pela
livraria Germer
Baillière.
O
“Atlas de Zoologia” de Gervais inclui, além de textos minuciosos
com classificações de taxonomia e anatomia, um total de 100 páginas
de gravuras pintadas a mão, em policromia, reunindo cerca de 250
ilustrações científicas, produzidas em colaboração por Gervais e
diversos artistas franceses na primeira metade do século 19. A
edição original de 1844, agora disponível na íntegra, não
traz a lista de identificação dos créditos dos autores das
ilustrações, mas em algumas delas é possível reconhecer as
assinaturas de Prêtre, Meunier e Vaillant.
Originalmente, o Atlas de Gervais
fazia parte de uma série de publicações científicas da Germer
Baillière, que editou em meados do século 19 cerca de 60 livros
dedicados à Zoologia, à Botânica e à Paleontologia. Professor da
Sorbonne e do Museu de História Natural da França, Paul Gervais
também é autor de outros tratados de referência das Ciências
Naturais, entre eles aquele que é considerado uma das “bíblias”
da Zoologia, o catálogo taxonômico “Histoire Naturelle Des
Mammiferes”, que teve sua primeira edição em 1923.
'Pai' dos Dinossauros
Pouco
conhecido fora dos círculos acadêmicos, Gervais também é
destacado no primeiro time da História das Ciências por diversas
publicações que marcaram época, incluindo seus tratados sobre a
moderna Zoologia e a Entomologia (ciência que estuda os insetos sob
todos os seus aspectos e suas relações com o homem, as plantas, os
animais e o meio ambiente), além de ter sido um dos primeiros a se
dedicar com sucesso aos estudos da Paleontologia.
Ao
pioneiro Paul Gervais também é atribuído o mérito de ter sido um
dos primeiros a usar de forma científica o conceito de “Dinossauros”
– termo derivado da expressão em grego para “lagartos
terríveis”, proposto em 1842 por Richard Owen para classificar os
esqueletos de répteis de grande porte já extintos, descobertos
naquela época em áreas ermas do Reino Unido. O termo se popularizou no último século, apesar de ser uma definição equivocada, pois atualmente há um consenso na comunidade científica de que, pela taxonomia, os dinossauros estão distantes dos lagartos.
Além
de Richard Owen, Paul Gervais divide o título de “pai” dos
Dinossauros, em sua concepção científica, com seus contemporâneos
William Buckland (o primeiro a publicar a descrição anatômica de
um Dinossauro, o Megalossauro, em 1824) e Gideon Mantell, que havia
descoberto em 1822 um fóssil gigantesco de um Iguanodonte, mas que somente publicou sua descoberta científica um ano depois de Buckland, em 1925.
Os
tratados de Gervais sobre Zoologia e Paleontologia também foram
fundamentais para outros grandes cientistas do século 19,
especialmente para o inglês Charles Darwin e para o dinamarquês
Peter
Wilhelm Lund – naturalista que em meados do século 19 veio da
Europa para se dedicar à pesquisa de campo no Brasil, trabalhando em
mais de 200 cavernas de Minas Gerais, na região de Lagoa Santa, e
descrevendo 115 espécies de animais, na maioria extintos há
milênios, entre eles o célebre Tigre de Dentes de Sabre (Smilodon
populator).
Extintos
nos últimos séculos e décadas
O
livro original de Gervais inclui animais que sobreviveram até nossos
dias, mas o que mais impressiona é que muitos deles, a maioria, foram extintos nos últimos séculos e
nas últimas décadas, entre eles o pássaro Dodô, que habitava as Ilhas
Maurício, no Oceano Índico, os famigerados Tigre da Tasmânia
(felino) e Diabo ou Demônio da Tasmânia (marsupial), além de muitas espécies de pássaros e mamíferos que habitavam grandes extensões do território brasileiro.
Além da tragédia da extinção, que se agravou nas últimas décadas, uma observação atenta da maior parte das ilustrações provoca nos cientistas e também nos leigos algumas dúvidas difíceis de serem esclarecidas, entre elas as diferenças marcantes entre espécies desenhadas nas ilustrações do Atlas de 1844 e sua aparência tal como os conhecemos na atualidade.
Além da tragédia da extinção, que se agravou nas últimas décadas, uma observação atenta da maior parte das ilustrações provoca nos cientistas e também nos leigos algumas dúvidas difíceis de serem esclarecidas, entre elas as diferenças marcantes entre espécies desenhadas nas ilustrações do Atlas de 1844 e sua aparência tal como os conhecemos na atualidade.
A
pergunta mais frequente sobre alguns dos animais retratados pelas
ilustrações do Atlas de 1844 diz respeito à aparência atual de muitos pássaros,
felinos e marsupiais que ainda sobrevivem: teriam estas espécies passado por tantas e
tão radicais transformações no decorrer dos últimos dois séculos ou
os autores das ilustrações do Atlas de Gervais tomaram certas
“liberdades artísticas” para a elaboração dos traços dos
desenhos?
Além
de sua importância para pesquisadores de várias áreas das
ciências, o “Atlas de Zoologia” de Gervais também apresenta
um grande interesse para o público leigo pela beleza das ilustrações –
motivo pelo qual a divulgação recente pela imprensa da liberação,
para consulta e download da íntegra do catálogo, provocou uma
avalanche de acessos para o portal na Internet do Biodiversity
Heritage Library, com ocasionais panes e travamentos do sistema. Além
do Atlas de 1844 de Gervais, o consórcio científico BHL também apresenta milhares
de publicações históricas originais e relatórios recentes sobre
biodiversidade, totalizando mais de 100 mil volumes ilustrados, todos
abertos para consulta pública e download gratuitos.
por
José Antônio Orlando.
Como
citar:
ORLANDO,
José Antônio. Zoologia
segundo Gervais.
In: Blog
Semióticas,
30
de março
de 2014.
Disponível no link
http://semioticas1.blogspot.com/2014/03/zoologia-segundo-gervais.html
(acessado em .../.../...).
Para
consultar o “Atlas de Zoologia” de Paul Gervais, clique neste link.
Sensacional, professor! Que aula! Em cada visita que faço a este Semióticas eu confirmo o que já disse em outras páginas do seu blog: é o melhor site que conheço, disparado. Show! Meus parabéns de novo!
ResponderExcluirQue beleza. Amei. Que aula!
ResponderExcluirPara mim, que estudo biologia, foram duas surpresas fantásticas: descobrir este Atlas do Gervais e descobrir este site fantástico Semióticas. Virei fã dos dois. Parabéns.
ResponderExcluirMaravilha, sou fã desse tipo de ilustração. Parabéns pela qualidade das publicações!
ResponderExcluirEstou impressionado. Que blog, que beleza, quanta coisa espetacular! Parabéns demais!!!
ResponderExcluirJoão Carlos Salgado
Agradeço pela matéria maravilhosa e pelo link tão precioso. Virei seu fã.
ResponderExcluirMatheus Ferreira
Cada nova página que encontro neste maravilhoso blog Semióticas me faz admirar mais sua elegância de texto e seu senso estético para editar texto e imagens com muita inteligência, meu querido José. Seu talento é invejável e esta elegância é para poucos. Estou seguindo você no Facebook e no Twitter e estou encantada com tudo que aprendo a cada postagem sua. Parabéns pelo blog, parabéns por compartilhar tanta beleza e sabedoria.
ResponderExcluirMaria Carmen Rodriguez
Mais uma publicação de alto nível, uma autêntica e muito bela aula sobre o tema, assim como todas as outras postagens que tenho visitado neste seu blog Semióticas. José Antônio Orlando: parabéns de novo e muito obrigada por tudo. Amei, amei.
ResponderExcluirElizabeth Moura
Somente hoje descobri este artigo fantástico sobre o Atlas de Gervais!
ResponderExcluirParabéns por este apanhado de alto nível, como tudo o mais que encontro aqui neste blog Semióticas. Gostei muito de encontrar referências tão completas. Espetáculo!
Marcelo de Carvalho Ramos