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28 de abril de 2014

Mestres da Gravura






    Não acredito na ideia de vanguarda, como
    não acredito em progresso na arte. Na ciência,
    essas ideias são aceitáveis, mas em arte o que vale
    é a obra encantar e provocar admiração, ou não.
––  Ernst Hans Gombrich (1909-2001).      



Grandes tesouros da arte produzida do século 15 ao século 18 foram reunidos na exposição “Mestres da Gravura – Coleção Fundação Biblioteca Nacional”. Com 170 obras originais que fazem parte do acervo Real Biblioteca de Portugal, a exposição chegou ao público no Palácio das Artes, em Belo Horizonte, seguindo depois um extenso roteiro para exposições em outras capitais e cidades brasileiras. Produzidas pelos artistas mais importantes de diversas escolas europeias, as gravuras do acervo estão sob a guarda da Biblioteca Nacional, com sede no Rio de Janeiro, desde 1808, quando a corte portuguesa de Dom João VI transferiu o acervo de Lisboa para o Brasil.

Reunidos no acervo de quatro séculos da história da arte estão 81 grandes mestres do estilo com gravuras originais que representam mitologias, alegorias, paisagens e cenas religiosas criadas na época do Renascimento, do Maneirismo, do Barroco e do Rococó. Fazem parte da exposição itinerante 30 gravuras da coleção alemã, 27 da holandesa, 35 da italiana, 26 da francesa, 14 da flamenga, oito da inglesa, 18 da espanhola e 13 da portuguesa, em técnicas predominantes de xilogravura (gravura impressa a partir de uma matriz de madeira) e gravura a metal – incluindo obras em talho-doce ou gravura a buril, gravura à ponta-seca, à água-forte, à maneira-negra, à água-tinta e pontilhados em técnica mista.

As obras em exposição foram criadas por artistas considerados os mais importantes da História da Arte, entre eles Albrecht Dürer (o principal nome da renascença alemã), Rembrandt Harmenszoon van Rijn (o maior da arte neerlandesa) e Francisco José de Goya y Lucientes, o artista mais importante do Romantismo na Espanha. Também foram selecionadas para a mostra, entre as mais de 30 mil peças do acervo, obras satíricas do inglês William Hogarth, que refletia sobre os desmandos da política em seu tempo e acabou gerando o termo Hogartianas; o italiano Giovanni Battista Piranesi, que registrava a arquitetura com detalhes e é forte influência na arte contemporânea; a extraordinária arte burlesca do francês Jacques Callot; e o talento de retratista do flamengo Anton Van Dyck, entre outros grandes mestres.









Mestres da Gravura: no alto,
Le Antichitá Romane,
obra-prima do italiano Giovanni
Battista Piranesi (1720-1778). Acima, 
Jesus Cristo descendo ao Limbo, do
italiano Andrea Mantegna (1431-1506),
e um mapa descritivo em pergaminho
com as fronteiras da Europa do século 16.

Abaixo, Santa Cecília cantando os
Louvores de Deus, do francês
Étienne Picart (1632-1721);
The Musician, do holandês
Lucas van Leyden (1494-1533);
e As quatro feiticeiras, do alemão
Albrecht Dürer (1471-1528). Todas
as imagens reproduzidas nesta página
estão no catálogo original da
Biblioteca Nacional que apresenta a
exposição Mestres da Gravura
















O acervo de obras-primas em exposição, com curadoria de Fernanda Terra, abarca artistas que nasceram do século 15 ao 18 e obras concebidas de acordo com as técnicas mais avançadas que foram desenvolvidas no período – a única exceção são algumas obras de Goya, que foram criadas em 1815 e trazidas posteriormente para o Brasil, mas ainda assim o artista espanhol é tido essencialmente como um gravador do século 18. A grande maioria do acervo de gravuras foi adquirida por Portugal no período anterior ao terremoto que arrasou Lisboa em 1755 – e sobreviveram ao terremoto, ao maremoto e aos incêndios sucessivos que destruíram a cidade.

Trazidas para o Brasil por Dom João VI, a coleção de gravuras, juntamente com milhares de caixas que incluíam livros, partituras e mapas, deu origem à Biblioteca Nacional, que mantém sua sede no Rio de Janeiro. Considerada a maior biblioteca da América Latina, a Biblioteca Nacional também foi nomeada pela UNESCO entre as 10 mais importantes do mundo. Todas as gravuras em exposição foram selecionadas do acervo que hoje conta com mais de 30 mil obras, raramente exibidas ao público. Em 2012, nos 200 anos da Biblioteca Nacional, a mesma mostra foi aberta no Rio de Janeiro e, nos anos seguintes, foi apresentada em Brasília e outras capitais. Depois de Belo Horizonte, a exposição segue para Salvador e depois prossegue em um roteiro itinerante pelo Recife e outras capitais do Nordeste e Norte do Brasil.










Mestres da Gravura: acima,
Orfeu e Eurídice, gravura de 1510
do mestre italiano Marco Antonio 
Raimondi (1480-1534); Cupido tocando 
cravo (1538), do italiano Giovanni Battista 
Ghizi (1503-1575); e Adão e Eva (1504),
do alemão Albrecht Dürer. Abaixo, 
A Sagrada Família, gravura de 1580 do
holandês Hendrik Goltizius (1558-1617); e
O Amor (1591), do mestre de Bruxelas
Raphael Sadelero Velho (1560-1632)












A
Acervo de relíquias preciosas



Todo o acervo da mostra que vem sendo apresentada nas capitais também está reproduzido em um livro belíssimo de capa dura e 240 páginas. Organizado pela mesma curadora Fernanda Terra e com o mesmo título da exposição “Mestres da gravura – Coleção Fundação Biblioteca Nacional”, o livro foi coeditado pela Artepadilla, Caramurê Publicações e Fundação Biblioteca Nacional, com patrocínio da Petrobras. Além do acervo completo da mostra, com imagens em fac-símile das 170 gravuras tanto em xilogravuras, a mais antiga técnica de gravar sobre papel, quanto nas variadas técnicas de gravação em metal, a publicação inclui um breve histórico de cada gravador e artigos assinados por especialistas.

A edição de luxo, subdivida em oito coleções e organizada por ordem cronológica e pela geografia de nascimento dos artistas, acompanha as mudanças técnicas da gravura através dos séculos – percurso delimitado pelos artigos “Mestres da gravura: Coleção Biblioteca Nacional”, resultado da pesquisa de Fernanda Terra; “Breve história da biblioteca: entre livros e símbolos”, escrito pela historiadora Lilia Moritz Schwarcz; e “Manter o passado no futuro”, assinado pelo presidente da Fundação Biblioteca Nacional, Renato Lessa. Um texto mais extenso e minucioso apresenta e descreve a Divisão de Iconografia da FBN, assinado por Monica Carneiro Alves e Monica Velloso Azevedo.










Mestres da Gravura: acima, capa
do catálogo da exposição, que
reproduz uma das gravuras da série
Le carcere d'invenzione, de
Piranesi, datada de 1750; e Cristo
na Cruz (A Crucificação), do alemão
Lucas Cranach, Sênior (1472-1553).

Abaixo, Cristo perante Herodes,
de Cranach; e As Três Cruzes (1653),
do holandês Rembrandt (1606–1669) 

 












Entre as centenas de preciosidades, os artigos destacam as séries mais valiosas do acervo da exposição, que não têm equivalentes em nenhuma outra coleção conhecida. Dos grandes mestres, ganham destaque pela ordem cronológica o item mais antigo do acervo, “Jesus Cristo descendo ao Limbo”, assinado por Andrea Mantegna (1431-1506). Na sequência está Albrecht Dürer (1471–1528), com as séries bíblicas dedicadas ao “Apocalipse” e a “Adão e Eva”, ambas datadas por volta de 1500, nas quais transparecem avanços no estudo das proporções humanas e a imensa variedade de tons e de texturas.



Importância histórica e simbólica



Na lista dos autores das obras mais valiosas do acervo também estão Rembrandt (1606–1669), com uma seleção de 12 gravuras, entre as quais estão quatro autorretratos; Francisco Goya (1746-1828), exímio gravador e maior pintor da Espanha no século 18, presente no livro e na exposição com nove obras-primas da série “Os provérbios” e mais cinco ilustrações para uma edição de “D. Quixote”, de Cervantes; e o italiano Giovanni Piranesi (1720-1778), que aparece com as séries “Le carcere d’invenzione” e “Le Antichità romane”.









Mestres da Gravura: acima, A Anunciação
aos Pastores (1634) e Autorretrato com
boina e cachecol (1633), do holandês
Rembrandt. Abaixo, Herodias (1774),
do espanhol Fernando Selma, e duas gravuras
da série Les misères et les mal-heures
de la guerre, de 1633, do mestre francês
Jacques Callot (1592-1635), intituladas
A Batalha O suplício da forca

















No que se refere à importância histórica e simbólica da coleção Mestres da Gravura, a historiadora Lilia Moritz Schwarcz destaca em seu artigo uma questão política, dramática e crucial: a coleção era tão valiosa que, na conta que o Brasil teve que pagar a Portugal pela sua Independência, a partir de 1822, o acervo da Biblioteca Nacional surgiu em um surpreendente segundo lugar, depois apenas do saldo da dívida pública.

A batalha acabou sendo ganha pelo Brasil, mas teve custo alto” – avalia Lilia Schwarcz. O acervo da Biblioteca Nacional aparecia avaliado em 800 Contos de Réis, um valor tremendamente alto no montante da dívida. “Para se ter uma ideia mais precisa”, destaca, “tal valor correspondia a 12,5% do total a ser pago, quatro vezes mais do que a famosa prataria da coroa ou do que a equipagem deixada no Brasil. Significava, portanto, muito, e em muitos sentidos: autonomia por aqui, desapego para o lado de lá. Incrível pensar como os livros, mais uma vez, eram protagonistas, desta vez na conta que se pagava pela liberdade do país”.

Muito além do valor em dinheiro, ressalta Lilia Moritz Schwarcz, havia a importância simbólica – para um país tão jovem como era o Brasil, foi uma forma de afirmação e mesmo de soberania contar com tal acervo de preciosidades em uma biblioteca que ostentava proporções monumentais, só comparável já naquela época à biblioteca nacional dos Estados Unidos, superando em valor e importância a maioria dos países da Europa e toda a extensão das Américas. Não é pouco, definitivamente.


por José Antônio Orlando.


Como citar:

ORLANDO, José Antônio. Mestres da Gravura. In: Blog Semióticas, 28 de abril de 2014. Disponível no link http://semioticas1.blogspot.com/2014/04/mestres-da-gravura.html (acessado em .../.../…).














Lista completa de artistas da exposição

Mestres da Gravura



COLEÇÃO ALEMÃ

Albrecht Durër, Martin Schongauer, Israel van Meckenen, Lucas Cranach, Hans Sebald Beham, Martin Treu, Georg Pencz, Heinrich Aldegrever, Virgil Solis.


COLEÇÃO HOLANDESA

Rembrandt Harmenszoon van Rijin, Lucas van Leyden, Cornelis Cort, Hendrik Goltzius, Zacharias Dolendo, Jan Müller, Jacob Matham, Jan Saenredam, Nicolas Ennes Visscher, Willem Jacobsz Delff.


COLEÇÃO ITALIANA

Giovanni Battista Piranesi, Andrea Mantegna, Benedetto Montagna, Agostino dei Musi (o Veneziano), Marco Antonio Raimondi, Giovanni Battista Ghisi (o Mantuano), Marcos Dente, Jacopo de Barbari, dito Mestre do Caduceu, Mestre do Dado, Adamo Ghisi, Enea Vico, Lodovico Carracci, Agostino Carracci, Annibale Carracci, Francesco Brizzi, Guido Reni, Stefano della Bella, Giovanni Benedetto Castiglioni, Salvatore Rosa, Francesco Bartolozzi, Giovanni Volpato.


COLEÇÃO FRANCESA

Jacques Callot, Noel Garnier, François Perrier, Claude Mellan, Egidio Rousselet, Gérard Audran, Étienne Picart, dito o Romano, Gerard Edelinck, Petrus Devret, Charles Dupuis, Henri Simon Thomassin.


COLEÇÃO FLAMENGA

Jacob Van Den Bos, Jan Sadeler Sênior, Raphael Sadeler (o Velho), Cornelis Galle Sênior, Egidius Sadeler, Raphael Sadeler (o Jovem), Anton van Dyck, Pieter de Jode, Paulus Pontius.


COLEÇÃO INGLESA

William Hogarth, Benjamin Smith, Peter Simon, Charles Gauthier Playter, John Ogborne, Samuel Middiman, Robert Thew.


COLEÇÃO ESPANHOLA

Francisco Goya, José de Ribera, Manuel Salvador Carmona, Fernando Selma, Francisco Muntaner, Joaquín Ballester, Joaquín Fabregat.


COLEÇÃO PORTUGUESA

Vieira Lusitano (Francisco Vieira de Matos), Joaquim Manuel da Rocha, Antonio Joaquim Padrão, Manuel da Silva Godinho, Gregorio Francisco de Queiroz, João Caetano Rivara.







Mestres da Gravura: acima, The Bench (1758),
do inglês William Hogarth (1697-1764).

Abaixo, Trois machos et trois majas dansant,
Disparate feminino e Modo de Vida,
três das gravuras originais da série
Os Provérbios (1815) do espanhol
Francisco Goya (1746-1828)

















30 de março de 2014

Zoologia segundo Gervais








Acontece que quando você olha para um animal, você pensa   
que talvez ele se lembre de algo que as pessoas esqueceram.   

–– Amós Oz.      






Pesquisadores da vida animal e das ciências naturais tiveram uma grata surpresa: o Biodiversity Heritage Library (BHL), consórcio de bibliotecas de História Natural, Zoologia e Botânica, criado em 2005, que reúne mais de 40 instituições de vários países, liberou na Internet, na última semana, para consulta e impressão gratuita, uma preciosidade – o lendário e até então pouco conhecido “Atlas de Zoologia”, escrito pelo paleontólogo francês François Louis Paul Gervais (1816–1879) e publicado em 1844, em Paris, pela livraria Germer Baillière.

O “Atlas de Zoologia” de Gervais inclui, além de textos minuciosos com classificações de taxonomia e anatomia, um total de 100 páginas de gravuras pintadas a mão, em policromia, reunindo cerca de 250 ilustrações científicas, produzidas em colaboração por Gervais e diversos artistas franceses na primeira metade do século 19. A edição original de 1844, agora disponível na íntegra, não traz a lista de identificação dos créditos dos autores das ilustrações, mas em algumas delas é possível reconhecer as assinaturas de Prêtre, Meunier e Vaillant.










Imagens da Zoologia segundo o Atlas
de 1844 de Paul Gervaisno alto,
a ave Dodô, também chamada de
Dronte (Raphus cucullatus), já extinta,
que habitava as ilhas Maurício, no
Oceano Índico. Acima, a folha de
rosto da publicação, liberada para
consulta e download pela Biodiversity
Heritage Library, e o retrato de Gervais,
feito a bico de pena por autor anônimo do
século 19. Abaixo, três pássaros extintos
do Novo Mundo: o Pica-Pau do México;
o Pitylus Crysogaster do Chile; e o
Cacique montezuma, ave que habitava a
América Central. Todas as imagens abaixo
foram extraídas da edição original do
“Atlas de Zoologia” de Gervais
(veja link no final do texto)










 



Originalmente, o Atlas de Gervais fazia parte de uma série de publicações científicas da Germer Baillière, que editou em meados do século 19 cerca de 60 livros dedicados à Zoologia, à Botânica e à Paleontologia. Professor da Sorbonne e do Museu de História Natural da França, Paul Gervais também é autor de outros tratados de referência das Ciências Naturais, entre eles aquele que é considerado uma das “bíblias” da Zoologia, o catálogo taxonômico “Histoire Naturelle Des Mammiferes”, que teve sua primeira edição em 1923.



'Pai' dos Dinossauros



Pouco conhecido fora dos círculos acadêmicos, Gervais também é destacado no primeiro time da História das Ciências por diversas publicações que marcaram época, incluindo seus tratados sobre a moderna Zoologia e a Entomologia (ciência que estuda os insetos sob todos os seus aspectos e suas relações com o homem, as plantas, os animais e o meio ambiente), além de ter sido um dos primeiros a se dedicar com sucesso aos estudos da Paleontologia.










Zoologia segundo Gervais: aves
que eram muito comuns no século 19
e que hoje estão na lista das espécies
muito raras e ameaçadas de extinção:
a partir do alto, a Colin ou Perdiz da
Califórnia, que era encontrada no Oeste
dos EUA; o Tangará (Chiroxiphia caudata),
pássaro da fauna sul-americana que habitava
as regiões Norte e Centro-Oeste do Brasil;
e a Apteryx (Apteryx australis), ave
da Austrália e da Nova Zelândi.

Abaixo, um animal incomum e raro,
também ameaçado de extinção:
o Macroscélide (Rhychoncion petersi),
também chamado sengi, musaranho saltador
ou musaranho elefante (elephant shrew),
pequeno mamífero saltador dos desertos
da África que tem parentesco genético
mais próximo de elefantes que de roedores











Ao pioneiro Paul Gervais também é atribuído o mérito de ter sido um dos primeiros a usar de forma científica o conceito de “Dinossauros” – termo derivado da expressão em grego para “lagartos terríveis”, proposto em 1842 por Richard Owen para classificar os esqueletos de répteis de grande porte já extintos, descobertos naquela época em áreas ermas do Reino Unido. O termo se popularizou no último século, apesar de ser uma definição equivocada, pois atualmente há um consenso na comunidade científica de que, pela taxonomia, os dinossauros estão distantes dos lagartos.

Além de Richard Owen, Paul Gervais divide o título de “pai” dos Dinossauros, em sua concepção científica, com seus contemporâneos William Buckland (o primeiro a publicar a descrição anatômica de um Dinossauro, o Megalossauro, em 1824) e Gideon Mantell, que havia descoberto em 1822 um fóssil gigantesco de um Iguanodonte, mas que somente publicou sua descoberta científica um ano depois de Buckland, em 1925. 




 







Zoologia segundo Gervais: a partir
do alto, o Thylacine (Thylacinus
cynocephalus), mais conhecido como
Tigre da Tasmânia, que habitava a
Austrália e ilhas do Oceano Pacífico,
foi extinto no século 20; o Diabo ou
Demônio da Tasmânia (Sarcophilus
harrisii), que habitava a Austrália e suas
ilhas, hoje restrito a uma área de pequena
extensão, protegida, na Tasmânia; e o
Coala (Phascolarctos cinereus),
mamífero marsupial, que tem registro
no Atlas de 1844 com diferenças
radicais em relação ao aspecto da 
espécie que atualmente é encontrada
apenas em zoológicos e áreas de
proteção no Sul da Ásia e Austrália.

Abaixo, um felino já extinto e pouco
conhecido, de grande porte, que
habitava áreas extensas da região
Centro-Oeste do Brasil, descrito no
Atlas de Gervais como Felis elegans;
e o Ecureuil de Botta, mais conhecido
como esquilo vermelho ou esquilo voador,
de cor ruiva e peito branco, que entrou em
processo de extinção em toda a Europa
no decorrer do século 20 devido à
introdução de outras espécies,
como o esquilo cinzento da América do
Norte, e à fragmentação de seu habitat













Os tratados de Gervais sobre Zoologia e Paleontologia também foram fundamentais para outros grandes cientistas do século 19, especialmente para o inglês Charles Darwin e para o dinamarquês Peter Wilhelm Lund – naturalista que em meados do século 19 veio da Europa para se dedicar à pesquisa de campo no Brasil, trabalhando em mais de 200 cavernas de Minas Gerais, na região de Lagoa Santa, e descrevendo 115 espécies de animais, na maioria extintos há milênios, entre eles o célebre Tigre de Dentes de Sabre (Smilodon populator).



Extintos nos últimos séculos e décadas



O livro original de Gervais inclui animais que sobreviveram até nossos dias, mas o que mais impressiona é que muitos deles, a maioria, foram extintos nos últimos séculos e nas últimas décadas, entre eles o pássaro Dodô, que habitava as Ilhas Maurício, no Oceano Índico, os famigerados Tigre da Tasmânia (felino) e Diabo ou Demônio da Tasmânia (marsupial), além de muitas espécies de pássaros e mamíferos que habitavam grandes extensões do território brasileiro.

Além da tragédia da extinção, que se agravou nas últimas décadas, uma observação atenta da maior parte das ilustrações provoca nos cientistas e também nos leigos algumas dúvidas difíceis de serem esclarecidas, entre elas as diferenças marcantes entre espécies desenhadas nas ilustrações do Atlas de 1844 e sua aparência tal como os conhecemos na atualidade. 













Outros mamíferos extintos após a primeira
edição do Atlas de Paul Gervais: no alto, o
Semnopithecus flavimanus, que habitava a
Indonésia até o final do século 19 e começo
do século 20; os antigos cães selvagens da
África; e dois de mamíferos dos desertos da
Austrália, o Musaranho (Sorex araneus),
mamífero insetívoro semelhante a um rato,
mas com o focinho mais afinado, e o
Mirmecobio (Myrmecobius fasciatus),
também conhecido como Numbat, de
pequeno porte e de hábitos solitários.

Abaixo, a Mara (Dolichotis patagonum),
também chamada Mara da Patagônia ou
Lebre da Patagônia, mamífero de
parentesco mais próximo das capivaras
do que dos coelhos e lebres, de grande
porte (adulto, pesa mais de oito quilos),
que desapareceu dos campos e planícies
da América do Sul. Também abaixo, outro
marsupial já extinto: o Phalangista ursina,
que habitava a Indonésia e a Austrália;
três espécies de aracnídeos peçonhentos
que habitavam países do continente europeu,
também extintos no século 20; e a Piramboia
 (Lepidosiren paradoxa), peixe pulmonado
ósseo muito raro, que atualmente é encontrado
apenas em áreas restritas da Bacia Amazônica
regiões pantanosas das
Américas Central e do Sul 






 


 
A pergunta mais frequente sobre alguns dos animais retratados pelas ilustrações do Atlas de 1844 diz respeito à aparência atual de muitos pássaros, felinos e marsupiais que ainda sobrevivem: teriam estas espécies passado por tantas e tão radicais transformações no decorrer dos últimos dois séculos ou os autores das ilustrações do Atlas de Gervais tomaram certas “liberdades artísticas” para a elaboração dos traços dos desenhos?

Além de sua importância para pesquisadores de várias áreas das ciências, o “Atlas de Zoologia” de Gervais também apresenta um grande interesse para o público leigo pela beleza das ilustrações – motivo pelo qual a divulgação recente pela imprensa da liberação, para consulta e download da íntegra do catálogo, provocou uma avalanche de acessos para o portal na Internet do Biodiversity Heritage Library, com ocasionais panes e travamentos do sistema. Além do Atlas de 1844 de Gervais, o consórcio científico BHL também apresenta milhares de publicações históricas originais e relatórios recentes sobre biodiversidade, totalizando mais de 100 mil volumes ilustrados, todos abertos para consulta pública e download gratuitos.



por José Antônio Orlando.


Como citar:

ORLANDO, José Antônio. Zoologia segundo Gervais. In: Blog Semióticas, 30 de março de 2014. Disponível no link http://semioticas1.blogspot.com/2014/03/zoologia-segundo-gervais.html (acessado em .../.../...).



















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