Não
devemos servir de exemplo a ninguém.
Mas
podemos servir de lição. –– Mário
de Andrade em carta a Carlos Drummond de Andrade.
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Depois
que Mário de Andrade morreu, em fevereiro de 1945, aos 52 anos, sua
consagração como um dos maiores renovadores da cultura nacional e
como mentor do modernismo permaneceu como referência de peso entre
seus companheiros de geração. O prestígio sobreviveu ao passar do
tempo e a dedicação do escritor paulistano aos mais diversos
aspectos da literatura, da arte e da política cultural mantém seu
status de primeira grandeza na inteligência nacional – sem contar
a atenção sem sossego de Mário ao que ele próprio chamava de
"epistolomania": a intensa troca de correspondências.
Há quem diga que Mário de Andrade foi o brasileiro que mais escreveu cartas. Já estão publicadas edições de sua correspondência com nomes como Manuel Bandeira, Drummond, Pedro Nava, Fernando Sabino, Álvaro Lins, Murilo Mendes, Murilo Rubião, Paulo Duarte, Pedro Dantas, Augusto Meyer, Alphonsus de Guimaraens Filho, Tristão de Athayde, Luís da Câmara Cascudo, Moacir Werneck de Castro, Cândido Portinari, Rodrigo Mello Franco de Andrade, Oneida Alvarenga e Tarsila do Amaral, entre outros. Lições de rigorosa composição poética e de vida perpassam cada uma das milhares de cartas escritas por Mário. A correspondência que ele recebeu, entretanto, permaneceu lacrada por 50 anos, por recomendação expressa dele próprio.
Retratos
pintados: Mário de Andrade
retratado
por alguns de seus companheiros
da
geração modernista – no alto, em 1922,
por Tarsila
do Amaral. Acima e abaixo,
por Anita
Malfatti, em 1921 e 1922
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"Ao
sol, carta é farol", confessaria Mário de Andrade em
correspondência a Guilherme de Figueiredo. Vencida em 1995 a
proibição à exposição pública das cartas, o Instituto de
Estudos Brasileiros da Universidade de São Paulo (IEB-USP) deu
início à sistematização dos acervos e lançou as duas primeiras
edições reunindo a correspondência completa entre Mário e Manuel
Bandeira (1997) e entre Mário e Tarsila do Amaral (2000). O acervo
de tantas cartas também envolve, como é inevitável, umas
tantas polêmicas.
Várias
das edições recentes em livros das cartas de Mário foram
destacadas em premiações como o Prêmio
Jabuti, entre elas "Correspondência Mário de Andrade &
Henriqueta Lisboa" (Editora Peirópolis), o terceiro livro do
projeto gerenciado pelo IEB-USP, com organização e edição da
professora emérita da UFMG Eneida Maria de Souza. "De toda a
correspondência conhecida de Mário de Andrade, as cartas para
Henriqueta Lisboa podem ser consideradas as melhores em vários
aspectos", destaca a professora nesta entrevista que fiz com ela para o jornal "Hoje em Dia" de Belo Horizonte.
No alto, Mário de
Andrade em pintura
de 1922 de Tarsila do
Amaral. Acima,
em pintura de 1922 por
Hugo Adami.
Abaixo, Mário em
fotografia de 1928 |
Carta aos Mineiros
Autora
de "A Pedra Mágica do Discurso" (1988), estudo sobre o
autor de "Macunaíma", e "Mário de Andrade - Carta
aos Mineiros" (1997), em co-autoria com Paulo Schimidt, entre
outros – além dos ensaios reunidos em "Crítica Cult"
e “Janelas Indiscretas: Ensaios de Crítica Biográfica”,
ambos lançados pela Editora UFMG – Eneida Maria de Souza incluiu,
no livro sobre as cartas trocadas entre Mário de Andrade e
Henriqueta Lisboa, reproduções e análise de uma centena de
documentos que permaneciam inéditos nos arquivos sob a guarda
do IEB, em São Paulo, e no Acervo de Escritores Mineiros, na UFMG.
Enquanto
"Crítica Cult" e “Janelas Indiscretas” analisam vida e
obra de personalidades como Caetano Veloso, Carmen Miranda, Chico
Buarque, o diário de guerra de Guimarães Rosa, retratos de Mário
de Andrade e Cyro dos Anjos pintados por artistas do modernismo, o
papel dos intelectuais no governo JK e outros temas que demonstram
uma construção teórica inovadora sobre temas contemporâneos,
"Correspondência Mário de Andrade & Henriqueta Lisboa"
reúne as cartas, telegramas, postais, fotos e bilhetes, extensa
bibliografia e manuscritos, tendo como pano de fundo a Segunda Guerra
Mundial, de 1939 a 1945.
Confira,
a seguir, alguns dos principais trechos da entrevista que fiz com a professora Eneida
Maria de Souza.
Pergunta – Há quem diga que, além de se dedicar aos mais diversos aspectos da literatura, da arte e da política cultural do Brasil, Mário de Andrade talvez tenha sido o brasileiro que mais escreveu cartas. Que faceta do trabalho de Mário de Andrade permaneceu com maior importância até a nossa atualidade? O escritor, o poeta, o pesquisador, o gestor cultural, o professor, o mentor e maior renovador da cultura nacional no século 20?
Pergunta – Há quem diga que, além de se dedicar aos mais diversos aspectos da literatura, da arte e da política cultural do Brasil, Mário de Andrade talvez tenha sido o brasileiro que mais escreveu cartas. Que faceta do trabalho de Mário de Andrade permaneceu com maior importância até a nossa atualidade? O escritor, o poeta, o pesquisador, o gestor cultural, o professor, o mentor e maior renovador da cultura nacional no século 20?
Eneida
Maria de Souza – Além de ficcionista e poeta, Mário de
Andrade se destaca pela importância como construtor de um pensamento
moderno brasileiro. Suas cartas são o testemunho dessa missão.
Escrever para os jovens escritores, fornecendo-lhes o referencial ideológico e artístico, as direções
poéticas, transmitir para cada um deles uma preocupação com os destinos da literatura
e da cultura brasileiras são, talvez, o maior legado desse poeta. Sem esquecer que Mário foi um
pesquisador da cultura nacional, como poucos, e o grande autor de
"Macunaíma - O Herói Sem Nenhum Caráter".
E
Henriqueta Lisboa, que lugar ela ocupa na literatura brasileira?
O
lugar de Henriqueta Lisboa na literatura brasileira poderia ser mais
valorizado, pois ela participa do movimento moderno sem ter sido
modernista, ao pé da letra. Com uma linguagem concisa e depurada,
sua poesia se iguala à de Cecília Meireles, uma de suas mais fortes
interlocutoras. O papel desempenhado como intelectual é também
relevante, por ter sido uma das primeiras mulheres a integrar a
Academia Mineira de Letras, além de ter lutado pelos direitos
feministas, como o direito ao voto.
Além de Henriqueta Lisboa, Mário de Andrade foi correspondente dedicado a toda uma geração de escritores, artistas, políticos e intelectuais, inclusive muitos mineiros. Depois de tantas publicações e tantas pesquisas sobre a correspondência de Mário de Andrade, ainda há muitas surpresas a serem reveladas?
Acho
que ainda falta muito a ser revelado. Por exemplo, a correspondência
de Fernando Sabino com Mário, de Otto Lara Resende e de tantos
outros, poderá contribuir para maiores esclarecimentos sobre a
relação de amizade e o respeito que mantinha com os mineiros.
Depois
da correspondência entre Mário de Andrade e Henriqueta Lisboa e dos
ensaios reunidos em “Janela Indiscreta”, quais serão seus próximos
projetos em livros?
Entre
os projetos destaco a publicação pela Editora da UFMG do "Diário de Guerra",
de Guimarães Rosa, edição feita com a parceria de Reinaldo Marques
e Georg Otte, que continua ainda inédita. A família do escritor infelizmente não
libera a publicação. Com isso, muita informação importante do
escritor vai ficando esquecida, assim como confissões relativas à
ascensão do nazismo, a perseguição dos judeus e a ajuda importante que o
casal (Rosa e sua segunda mulher, Aracy Moebius de Carvalho, que ele
conheceu em Hamburgo, em 1938, às vésperas da Segunda Guerra)
prestou à causa de apoio a muitos judeus e suas famílias que tentavam escapar da perseguição.
Como citar:
por José Antônio Orlando.
Como citar:
ORLANDO,
José Antônio. Ao sol, carta é farol. In: Blog
Semióticas,
22 de setembro de 2011. Disponível no link
http://semioticas1.blogspot.com/2011/09/ao-sol-carta-e-farol.html
(acessado
em .../.../...).
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Obras de Mário de Andrade:
Há
uma Gota de Sangue em Cada Poema – 1917
Paulicéia
Desvairada – 1922
A
Escrava que Não é Isaura – 1925
Losango
Cáqui – 1926
Primeiro
Andar – 1926
O
Clã do Jabuti – 1927
Amar,
Verbo Intransitivo – 1927
Ensaio
Sobre a Música Brasileira – 1928
Macunaíma
– 1928
Compêndio
da História da Música – 1929
Modinhas
Imperiais – 1930
Remate
de Males – 1930
Música,
Doce Música – 1933
Os
contos de Belazarte – 1934
O
Aleijadinho de Álvares de Azevedo – 1935
Lasar
Segall – 1935
Música
do Brasil – 1941
Poesias
– 1941
O
Movimento Modernista – 1942
O
Baile das Quatro Artes – 1943
Os
Filhos da Candinha – 1943
Aspectos
da Literatura Brasileira – 1943
O
Empalhador de Passarinhos – 1944
Lira
Paulistana – 1945
O
Carro da Miséria – editado em 1947
Contos
Novos – editado em 1947
O
Turista Aprendiz – editado em 1976
O
Banquete – editado em 1978
Dicionário
Musical Brasileiro – editado em 1989
Será
o Bendito! – editado em 1992
Introdução
à Estética Musical – editado em 1995