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Saxum volutum non obducitur musco. “A rolling stone does not gather moss”. (Pedra que muito se move não junta musgo.) –– Publius Syrus (século 1° antes de Cristo). |
São fetiches para garantir a felicidade de muitas legiões de fãs: uma coleção de centenas de fotografias de grandes astros e estrelas da Era do Rock, que permaneciam inéditas desde as décadas de 1960 e início de 1970, e que só agora reveladas ao público. Trata-se do acervo do fotógrafo inglês Alec Byrne, que desde o final dos anos 1960 cobriu a cena cultural de Londres e acompanhou a trajetória de shows e entrevistas de bandas e músicos britânicos lendários como The Beatles, Rolling Stones, Led Zeppelin, The Who, David Bowie, e também artistas de outros países que se apresentavam em Londres, incluindo Chuck Berry, Bob Dylan, Bob Marley, Jimi Hendrix, The Doors, Tina Turner, Aretha Franklin, Abba, Cat Stevens e muitos mais. Depois de mais de 50 anos, Alec Byrne revela seu acervo inédito no livro “London Rock: The Unseen Archive”, um catálogo de belas e surpreendentes imagens da Era do Rock.
Não foi intencional manter as fotografias inéditas por tanto tempo – como revela Alec Byrne na apresentação ao livro. Na verdade todas as imagens ficaram esquecidas em uma caixa nos fundos da garagem da casa onde o fotógrafo morou durante décadas em Los Angeles (EUA) e sobreviveram a incêndios e a inundações que destruíram milhares de outras imagens de sua coleção. Descobertas por ele próprio recentemente, quase por acaso, imediatamente foram digitalizadas, selecionadas e tratadas em photoshop e depois apresentadas à imprensa pelo próprio fotógrafo. Em seguida vieram eventos e shows para apresentação ao público no museu Rock and Rook Hall of Fame em Cleveland, Ohio, e no festival South By Southwest em Austin, Texas, além de uma exposição na National Portrait Gallery em Londres. Agora, finalmente, a seleção de imagens de Alec Byrne ganha publicação no livro de 254 páginas, na verdade um catálogo de luxo em lançamento da Insight Editions de Londres.
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Uma câmera Rolleiflex
Na apresentação ao livro, que também conta com um prefácio escrito pelo jornalista Tony Norman, o fotógrafo recorda que tudo começou quando ele tinha 17 anos e conseguiu um emprego de meio expediente como office-boy na agência Keystone Press, em Londres, em meados da década de 1960, e passou a conviver diariamente com muitos fotógrafos, repórteres e editores de jornais e revistas. Quando recebeu o primeiro salário, investiu comprando uma câmera Rolleiflex, com sua mãe assinando o contrato para a venda com pagamento em várias parcelas. Desde então, passou a frequentar shows e entrevistas, primeiro por prazer, e depois por investimento para construir um portfólio especializado em figuras do mundo do rock’n’roll, exercitando diariamente seu aprendizado como fotógrafo amador. Em pouco tempo, a publicação de suas fotografias ganhou espaço na revista “New Musical Express” e a assinatura de Alec Byrne passou de “fotógrafo amador” para “fotógrafo profissional”.
“Eu estava no lugar certo e na hora certa. Havia uma revolução musical acontecendo e eu estava bem no meio dela”, recorda o fotógrafo. No livro, ele também revela histórias saborosas e confidências sobre algumas das imagens, como o primeiro show de Jimi Hendrix em Londres, que teve na plateia nomes como Mick Jagger, Keith Richards, Eric Clapton e David Bowie, flagrados em retratos surpreendentes enquanto assistiam encantados à performance; a primeira apresentação das canções do álbum “Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band” pelos Beatles no Abbey Road Studios, em 1967, que também foi a primeira transmissão internacional de TV via satélite; ou um cigarro de maconha que Bob Marley dividiu com o fotógrafo na sessão de fotos realizada na suíte do cantor, no Montcalm Hotel, em Londres, em julho de 1975.
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Retratos de grandes lendas
Em 1976, Alec Byrne recebeu uma oferta de trabalho para Los Angeles e se mudou definitivamente de Londres. Nos Estados Unidos, passou a trabalhar com outras pautas além da cobertura de música e terminou abrindo sua própria agência de fotografia, passando a se dedicar em seguida às funções administrativas. Desde então seus arquivos ficaram guardados e, com o passar do tempo, apenas uma ou outra foto foi comercializada para ilustrar álbuns em lançamento ou reportagens sobre grandes lendas da história do rock. No livro, ele recorda que a primeira grande perda aconteceu em Londres, em 1971, quando um incêndio destruiu o estúdio em que ele trabalhava, destruindo grande parte de seu acervo.

Não foi a única perda na trajetória do fotógrafo: durante a mudança para os Estados Unidos, centenas de outros negativos foram danificados pela água do mar no vazamento de um contêiner no navio, durante a travessia do oceano Atlântico. Anos depois, em 1994, o terremoto com magnitude de 6,7 que atingiu Los Angeles destruiu o antigo prédio em que ficava o escritório de Byrne e novamente centenas de negativos foram danificados ou definitivamente perdidos. Nos anos seguintes, vieram um outro incêndio e depois um alagamento que atingiram a casa em que ele morava em Los Angeles, novamente provocando perdas definitivas em fotos ampliadas e em seus negativos. O material que sobreviveu a tantos acidentes permaneceu guardado, ou esquecido, até ser redescoberto pelo fotógrafo.
Impacto emocional
Ao recordar sua trajetória e a história de suas fotografias, Alec Byrne conta que o entusiasmo que teve ao ter seu trabalho publicado pela primeira vez pelas revistas “New Musical Express” e “Melody Maker” mudou sua visão de mundo e o levou a um caminho que ele nunca havia planejado ou cogitado. Em 1969, aos 20 anos, ele fundou sua própria agência de fotografia em Londres e começou a vender fotos para revistas de todo o mundo. A trajetória seguiu uma linha ascendente por mais de uma década de shows e encontros com músicos e bandas em entrevistas e sessões de lançamentos e gravações, até que no final dos anos 1970, também por um acaso não planejado, Alec Byrne assumiu cada vez mais as funções de empresário e “aposentou-se” da música e dos ambientes do rock e seu acervo de imagens foi para as caixas de arquivo, onde permaneceu praticamente intocado e inédito durante décadas.
“Quando eu estava fazendo essas fotografias, a princípio ainda adolescente, não tinha ideia – absolutamente nenhuma – de que estava registrando um dos momentos mais influentes da história da cultura pop. Na época, simplesmente senti que havia descoberto um ótima maneira de ganhar dinheiro e seguir a vida. Eu adorava tudo aquilo, mas a vida era agitada e não havia tempo para refletir sobre o que tudo significava”, confessa Alec Byrne, na apresentação ao livro. “Acho que uma das razões pelas quais todas essas fotografias ficaram guardadas nas caixas por tanto tempo é porque eu sempre pensei no que elas significavam para mim. Nunca me ocorreu, até depois das primeiras apresentações em público, o quanto estas imagens significavam também para outras pessoas. É maravilhoso, apesar dos incêndios, das inundações e do terremoto, e depois de todos esses anos, finalmente poder compartilhar estes retratos com outras pessoas e saber que o impacto das emoções que eles registram também significa muito para tanta gente”.
por José Antônio Orlando.
Como citar:
ORLANDO, José Antônio. Cenas da Era do Rock. In: Blog Semióticas, 11 de novembro de 2021. Disponível em https://semioticas1.blogspot.com/2021/11/cenas-da-era-do-rock.html (acessado em .../.../…).
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