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24 de março de 2013

Pink Floyd na Lua







As pessoas não sabem, mas fazer parte de uma
grande banda de rock é como estar em uma jaula.

–– Roger Waters.  




Uma unanimidade: trata-se de um dos discos mais estranhos, belos e cultuados do século 20. A alquimia entre beleza e estranhamento começa na capa, com aquele fundo preto e o facho de luz que atravessa um prisma em formato de triângulo, tornando-se arco-íris, para prosseguir nas melodias – hipnóticas, psicodélicas, sofisticadas, em letras sobre a vida cotidiana, o amor, as perdas, tristeza, ambição, dinheiro, demência, medo de envelhecer e, principalmente, o valor da amizade.

Em 24 de março de 1973, foi lançado aquele que muitos consideram o melhor álbum de uma lenda no panteão do rock e da cultura pop chamada Pink Floyd – um disco que se mantém há décadas, desde o lançamento, entre os mais vendidos da história, primeiro no formato LP e agora em CD e arquivos digitais. 'The dark side of the Moon' merece ser definido como 'emblemático' – palavra que muitos usam, nem sempre com propriedade. Emblemático e obra-prima – com novidades musicais e técnicas que seriam rapidamente incorporadas pela maioria de outras bandas e outros artistas que viriam depois, todas em referência explícita ao guitarrista e vocalista Syd Barrett (1946–2006), mentor do grupo, criador das ideias musicais e estilísticas, autor do nome da banda e de todas as canções dos primeiros discos.

Barrett deixou o Pink Floyd em 1968 – mas os integrantes sempre afirmaram que, mesmo ausente, ele permaneceu como a mais forte influência na concepção e nos arranjos dos discos lançados por Roger Waters (compositor, baixista e vocalista), Nick Mason (compositor e baterista) e Richard Wright (compositor e tecladista), que desenvolveram arranjos e adaptações para as principais ideias sobre música e estilo inventadas por Barrett desde que os quatro eram estudantes em Cambridge, em meados da década de 1960.










 


Formação original do Pink Floyd 
no dia da comemoração da assinatura
do contrato com a gravadora EMI para o
lançamento do primeiro álbum da banda.
Nas fotos (acima e abaixo), a formação
original com Roger Waters, Nick Mason,
Syd Barrett Richard Wright em Londres,
no início de 1967. No alto, fotografia e arte
para celebrar o 40º aniversário do lançamento
de The dark side of the Moon: o designer
Storm Thorgerson, criador da imagem
original do prisma da capa do álbum de
1973, criou 40 variações que estão
disponíveis para download no
site oficial do Pink Floyd













O nome do grupo, abreviação de The Pink Floyd Sound, foi criado por Barrett em homenagem aos músicos de blues Pink Anderson e Floyd Council. Os amigos de escola começaram a ensaiar juntos em 1965 e, no ano seguinte, contaram com um lance de sorte logo na estreia do nome Pink Floyd: o cineasta Michelangelo Antonioni assistiu a um dos primeiros shows do grupo, em Londres, num intervalo das filmagens de outra obra-prima, “Blow Up”, e convidou os quatro para compor a trilha sonora de “Zabriskie Point”, seu próximo filme.



De 'Blow Up' a 'Zabriskie Point'



Com o aval de Antonioni destacado na imprensa e o sucesso de “Blow Up”, o Pink Floyd lança as primeiras canções ('Arnold Layne' e 'See Emily Play') e se torna o favorito do Underground. Quando surgiu o primeiro álbum, em 1967, 'The piper at the gates of dawn', a plateia já disputava ingressos para seus shows em casas que, por conta da banda, se tornariam lendárias – The Roundhouse, The Marquee Club, UFO Club.
 








Pink Floyd na Lua: no alto, a banda
 no camarim, na última apresentação com
Syd Barrett, em janeiro de 1968, no palco
do Hastings Piers, Inglaterra, e na fotografia
escolhida para a capa de Ummagumma,
com David Gilmour (em primeiro plano)
como mais um integrante oficial da banda.

Abaixo, o cartaz original para a turnê no
Japão, em 1972; Waters, Mason, Wright
Syd Barrett fotografados em 1967
no Hyde Park, em Londres, cenário
do filme Blow Up, de Michelangelo
Antonioni; a formação original da banda
em agosto de 1968, após a saída definitiva
de Syd Barrett (na foto em rosa, a partir da
esquerda, Nick Mason, David Gilmour,
Richard Wright e Roger Waters) – e uma
seleção das versões criadas por
Storm Thorgerson para a capa original
de The dark side of the Moon






pink-floyd-dark-side-of-the-moon-cover-art-fine-pointillism






Depois do primeiro álbum do Pink Floyd, viriam outros clássicos imbatíveis da era do rock, todos dedicados a Barrett e com letras e canções criados a partir de suas ideias originais: 'A saucerful of secrets' (1968), 'More' (1969), 'Ummagumma' (1969), 'Atom heart mother' (1970), 'Meddle' (1971), 'Obscured by clouds' (1972) e, finalmente, 'The dark side of the Moon' (1973).

A trajetória do Pink Floyd e as reverências ao talento inaugural de Barrett ainda incluiriam 'Wish you were here' (1975), 'Animals' (1977), 'The Wall' (1979). Há ainda os singles, as participações em trilhas sonoras de filmes, as coletâneas, os registros de shows ao vivo e um concerto impressionante, “Live at Pompeii”, transformado em documentário que chegou aos cinemas em 1972, com a banda tocando seis longas composições no Piazza Anfiteatro, nas ruínas de Pompeia, na Itália, dirigido por Adrian Maben e gravado em 1971 sem ninguém na platéia. 














 

David Gilmour, que havia sido professor de guitarra de Barrett, chegou depois dele ao Pink Floyd – a princípio para atuar como guitarrista e backing vocal, mas também passou a protagonizar o papel de 'pomo da discórdia' em todas as gravações de estúdio e nas turnês, em conflitos que terminaram por levar ao fim da banda. Wright deixou o grupo em 1979 e Waters, que assumiu o posto de líder depois da saída de Barrett, declarou em 1985 o fim do Pink Floyd. Mas a história teria ainda um triste capítulo: inconformado com o fim da banda, Gilmour promoveu uma longa e intensa batalha na Justiça para continuar usando o nome e o repertório do Pink Floyd. 



Processos e reprises diluídas



Por fim, David Gilmour acabou ganhando a causa, com um arsenal de liminares e advogados. Em seguida, montou uma nova banda (com participação ocasional de Mason e Wright) e lançou dois álbuns usando o nome Pink Floyd, com reprises diluídas e previsíveis dos grandes sucessos da banda – "A momentary lapse of reason” (1987) e “The division bell” (1994). A maioria dos críticos e dos fãs, entretanto, preferem considerar discos e shows de Gilmour como trabalho solo, da mesma forma que muitos consideram “The final cut” (1983) um trabalho solo de Roger Waters, mesmo que ele seja na temática e na técnica um disco do Pink Floyd e tenha contado com participação de todos os músicos da banda original, à exceção de Richard Wright. 

 




.








Pink Floyd na Lua: no alto, um inflável gigante
chega ao Central Park, em Nova York, para o
cenário do show Animals, do Pink Floyd, em
maio de 1977. Acima, o reencontro do Pink Floyd
no Hyde Park: David Gilmour, Roger Waters,
Nick Mason e Richard Wright no palco para o
show em Londres, em 2005, no concerto beneficente
Live 8”. Abaixo, David Gilmour, Nick Mason,
Roger Waters e Richard Wright no deserto de
Zabriskie Point, na Califórnia, cenário do
filme de 1970 de Michelangelo Antonioni,
fotografados em 1973 por Storm Thorgerson
para o encarte de The Dark Side of the Moon










 
Em 2005, depois de quase duas décadas, os integrantes do Pink Floyd voltariam a se reunir para uma única apresentação no concerto beneficente 'Live 8'. Depois disso, Wright morreu em 2008 e somente em 12 de maio de 2011 Roger Waters, Mason e Gilmour voltaram a se encontrar no palco, em Londres, para um show de Waters na 'The Wall Tour'. Tocaram juntos dois clássicos do Pink Floyd: 'Comfortably numb' e 'Outside the Wall' – não por acaso outra homenagem a Syd Barrett – cuja presença, ideias e personalidade levaram Waters à criação de Pink, personagem central em 'The Wall', o disco e o filme, autêntica ópera-rock escrita por Waters e dirigida por Allan Parker em 1982.

A experiência de ouvir 'The dark side of the Moon' pode ser quase transcendental. Conheci o disco quase uma década depois do lançamento, quando ganhei o LP de presente de aniversário. Foi uma descoberta e tanto – que ainda perdura com toques de nostalgia a cada vez que ouço o disco ou apenas uma ou outra de suas dez canções. Sua mistura de beleza e estranhamento, com o passar do tempo, tem reforçado as lendas, que vão da simetria impressionante dos acordes do disco com as cenas do filme 'O mágico de Oz', de 1939, à inserção quase mística de mensagens cifradas e frases inteiras com ruídos bizarros do programa de TV do grupo de comediantes Monty Python, idolatrado pelos integrantes do Pink Floyd e por sua legião de fãs.










Imagens raras: todos os integrantes
do Pink Floyd com Syd Barrett (no alto)
David Gilmour (sentado), reunidos
na mesma foto, em 1973. Abaixo,
David Gilmour e Syd Barrett de pé e
a nova formação da banda, também
em 1973, na primeira foto promocional
após a decisão de afastar Syd Barrett.

Também abaixo, na foto em cores,
uma das últimas imagens promocionais do
grupo produzidas por Storm Thorgerson
em Londres, no início dos anos 1980



















O lugar de Syd Barrett



As lendas sobre o disco e suas versões saborosas são alimentadas por suas sucessivas reedições em novos formatos e suportes – entre elas a recente "The dark side of the Moon – Immersion box set", com seis CDs e DVDs que incluem remasterizações, demos, documentários e muitas entrevistas com o grupo e com técnicos que participaram das gravações no estúdio Abbey Road, entre junho de 1972 e janeiro de 1973, com participação importante do produtor Alan Parsons. Também não faltam itens de colecionador na memorabilia da banda – com destaque para o documentário 'Classic Albums: Pink Floyd and the making of The dark side of the Moon' (DVD, 2003), de Matthew Longfellow, e duas biografias, semelhantes e complementares.

Os dois livros, que receberam títulos quase idênticos no Brasil, foram escritos por jornalistas reconhecidos como especialistas: 'Os bastidores de The dark side of the Moon' (Editora Zahar), de John Harris, e 'Nos bastidores do Pink Floyd' (Editora Évora), biografia do grupo assinada por Mark Blake. Tanto Harris como Blake vão fundo nos detalhes da história da banda, reunindo depoimentos surpreendentes, mas ambos coincidem no destaque e no carisma de Syd Barrett, que contagiava a todos de imediato.












"Syd Barrett era um jovem com imenso e estranho carisma. Quando saiu da banda, inicialmente seus amigos acharam muito difícil continuar sem ele”, escreve Mark Blake, para quem o criador e mentor do Pink Floyd foi um poeta brilhante e um guitarrista dos melhores e mais inovadores, dos primeiros a explorar por completo as capacidades sonoras da distorção, as variações da técnica do instrumento e novidades que estavam surgindo, entre elas a máquina de eco. Syd Barrett, conclui Blake, influenciou em definitivo não só todo o som personalíssimo e incomum do Pink Floyd, mas também tudo o que foi feito por diversos músicos, diversas bandas e diversos artistas depois dele. Não é pouco.



por José Antônio Orlando.



Como citar:

ORLANDO, José Antônio. Pink Floyd na Lua. In: _____. Blog Semióticas, 24 de março de 2013. Disponível no link http://semioticas1.blogspot.com/2013/03/pink-floyd-na-lua.html (acessado em .../.../...).



Para visitar o site oficial do Pink Floyd, clique aqui.
 















2 de abril de 2012

Na trilha do Led Zeppelin





Não sei se é sorte ou destino, mas quando é para 

você ser alguém, você se torna mesmo sem querer. 

––  Jimmy Page (em entrevista a William Burroughs  

publicada em 1975 pela "Crawdaddy Magazine").  



Os fãs de rock conhecem de cor e salteado a história e as lendas em torno do Led Zeppelin: as viagens alucinantes de seus quatro grandes músicos, cada um dos riffs em progressão de guitarra repetidos e copiados por meio mundo, “Stairway to heaven" e os muitos clássicos que ainda emocionam, mais alguns ingredientes cifrados de magia negra, muito sexo, drogas, a morte do baterista por excesso de vodka e sufocado pelo próprio vômito e a separação do grupo em 1980. Mas nem tudo está dito.

Prova disso são duas biografias do grupo que chegaram às livrarias com novidades e detalhes surpreendentes até para os ledmaníacos mais dedicados ao culto da banda no panteão da história do rock. Ao contrário da maioria das biografias de bandas e estrelas do rock – que costuma ser um amontoado de casos picantes e uma sequência de escândalos produzidos sob medida para reforçar o mito e arrecadar direitos autorais, custe o que custar – os dois novos livros podem ser considerados exceções.














Na trilha do Led Zeppelin: a partir do alto,
uma das lendárias performances da banda, no
show do estádio Forum, em Los Angeles, 1972,
em fotografias de Jeffrey Mayer. Acima,
cartaz promocional do lançamento do quarto
e mais radical álbum do Led Zeppelin, lançado
em 1971, conhecido pelos fãs como Zoso.

Abaixo, os quatro no camarim, em 1975, em
fotografia de Neal Preston; Jimmy Page com
o lendário escritor da Beat Generation,
William Burroughs, durante a entrevista
que marcou época em 1975; e Jimmy Page
em 1973 nos jardins da Tittenhurst Park,
casa nos arredores de Londres famosa
porque era onde moravam John Lennon e
Yoko Ono na época da separação dos Beatles













As duas biografias merecem destaque por motivos distintos. São elas “Whole lotta Led Zeppelin” e "Led Zeppelin – Quando os gigantes caminhavam sobre a Terra". As duas foram escritas por jornalistas veteranos. A primeira, lançamento da editora Agir, foi escrita por um norte-americano, Jon Bream. A segunda, publicada pela editora Larousse do Brasil, foi escrita pelo inglês Mick Wall. Enquanto a primeira vê a trajetória da banda pelo lado de fora, reunindo opiniões e depoimentos diversos, a segunda vê a história do Led Zeppelin segundo a versão dos próprios músicos da banda.

Jon Bream, do jornal "Minneapolis Star Tribune", fã de longa data da banda, investiu numa forma original para contar a saga muito conhecida de outra forma. Em "Whole lotta Led Zeppelin", que tem por subtítulo “A história ilustrada da banda mais pesada de todos os tempos”, Bream reuniu textos e depoimentos de artistas do rock e de profissionais da imprensa norte-americana que acompanharam a trajetória desde o começo ou que entrevistaram os músicos da banda em algum momento. 

 







O resultado é uma sequência de histórias saborosas sobre os quatro integrantes e sobre o rock desde a década de 1960, incluindo uma coleção impressionante de imagens de todas as fases da banda, com fotos dos grupos anteriores à formação do Led Zeppelin que tiveram a participação dos quatro integrantes, além da reunião dos músicos, de cabelos brancos, em 2007, passando por todas as capas e fotos de encartes dos nove discos originais e das coletâneas, lançamentos em CDs e DVDs, pôsteres, cartazes, ingressos, livros, capas de revistas, camisetas e outros colírios que fazem a festa da memorabilia dos ledmaníacos.



Trajetória lendária



Através dos depoimentos e textos de época reunidos em seu relato, dividido em 10 capítulos, Jon Bream vai reconstituindo cada uma das fases da banda, apontando quando e como ela surgiu e de que modo seus integrantes revolucionaram e criaram novos gêneros para o rock'n'roll – o heavy metal e o hard rock. As histórias reunidas por Bream retornam ao começo, quando o grupo ainda se chamava New Yardbirds, passa pela explosão lisérgica dos primeiros tempos do Led Zeppelin e pelo auge da banda até chegar aos dias atuais, com a eterna ida e vinda dos zeppelins aos palcos.














Se o livro de Bream é tão abrangente quanto saboroso, em outro registro Mick Wall faz um percurso paralelo, mas bastante diferente do relato do norte-americano. Com "Led Zeppelin - Quando os gigantes caminhavam sobre a Terra", o jornalista inglês constrói um relato impressionante sobre a trajetória conjunta de muitos sucessos e outros tantos dramas vividos por Jimmy Page (guitarra), Robert Plant (vocais, harmônica, gaita), John Bonham (bateria) e John Paul Jones (baixo, bandolim, teclados).

Quando foi publicado na Inglaterra e nos Estados Unidos em 2008 – mesmo ano em que Jon Bream publicou “Whole lotta Led Zeppelin" – o livro de Mick Wall foi saudado na imprensa como uma das raras exceções entre biografias de bandas e estrelas de rock. Discípulo do jornalismo literário de Gay Talese e Tom Wolfe, Wall desenvolveu durante décadas sua extensa pesquisa e brinda o leitor com um texto apurado, analítico e também saboroso, que também persegue a trajetória da banda que se tornou uma lenda e mudou os rumos do rock'n'roll na década de 1970.







Mick Wall percorre a história do Led Zeppelin a partir de uma situação de privilégio: sua convivência com os integrantes do grupo. O resultado de anos de pesquisa é um livro que vê a banda por dentro ao reunir, à análise da trajetória e do contexto internacional do rock, as inúmeras entrevistas individuais e coletivas que ele realizou com todos os músicos da banda. O diferencial, em relação às outras biografias do Led Zeppelin, e ao livro de Jon Bream em particular, é a condição de testemunha ocular que Wall foi adquirindo sobre a trajetória da banda que ele pôde acompanhar durante mais de três décadas.

"Você é Jimmy Page", propõe Mick Wall ao leitor, no primeiro capítulo. "Estamos no verão e você é um dos mais conhecidos guitarristas de Londres no meio musical – e um dos menos famosos junto ao grande público. Mesmo os dois últimos anos com os Yardbirds não lhe trouxeram o reconhecimento que você sabe que merece. Parecia um presságio quando você viu que estava para aparecer no filme de Michelangelo Antonioni, 'Blow Up'. Tudo que você precisava era fazer de conta que estava tocando em um clube, descarregar a energia e destruir a guitarra no palco. E teve de fazer isso seis vezes antes de o velho italiano ficar feliz". Foi o começo de tudo.




















Na trilha do Led Zeppelin: no alto, 
Jimmy Page, futuro guitarrista,
fotografado aos 17 anos, em 1961,
quando fez sua primeira gravação em
estúdio. Naquele ano, Jimmy Page
participou em Londres de um concurso
para descoberta de talentos na TV,
não venceu, mas foi convidado por
Neil Christian, do The Crusaders, para
se juntar à banda. Cinco anos depois,
tocando com os Yardbirds, Jimmy
passaria a ser considerado um dos
maiores guitarristas de todos os tempos.


Acima, John Bonham, Robert Plant,
John Paul Jones e Jimmy Page
fotografados por Jay Thompson no
intervalo da turnê do Led Zeppelin
em Los Angeles, Califórnia, em 1969,
hospedados no lendário Chateau Marmont.
Abaixo, Robert Plant no palco com
o Led Zeppelin, em 1973, fotografado
por James Fortune, durante o show no
San Francisco Kezar Stadium, Califórnia









O quinto elemento



Wall acompanhou as decisões que mudaram a história da banda e relata cada hesitação e cada passo decisivo. Decidido a criar um grupo que conciliasse popularidade, performances vigorosas e experimentalismo, o guitarrista Jimmy Page testou diversos instrumentistas antes da formação definitiva da banda com Robert Plant, John Bonham e John Paul Jones. Há também a eminência parda chamada Peter Grant – como destaca o biógrafo sobre o empresário do grupo, que era chamado de "o quinto elemento" pelos integrantes da banda.

A convivência de décadas de Wall com os músicos é determinante para a veracidade e a credibilidade de seu relato historiográfico – que vai fundo nas ideias e experimentações musicais, nas fronteiras entre o blues, o rock e o folk, expondo excessos, fraquezas e dramas obscuros até para o fã mais exaltado. Depois da experiência explosiva com o “Blow-Up” de Antonioni, a banda surgiria no ano seguinte, 1968, como resultado do aprendizado de Jimmy Page com os Yardbirds, grupo pioneiro do rock inglês na mesma época de Beatles e Rolling Stones. 


 





Da primeira formação dos Yardbirds também sairiam dois outros "deuses" da guitarra, além de Page: Jeff Beck e Eric Clapton. Depois das filmagens com Antonioni em "Blow Up" (tido por unanimidade como capítulo memorável do cinema, baseado em conto do argentino Julio Cortázar em que um fotógrafo de moda tenta entender em tempo real um mistério criminal envolvendo fotos que tirou em um parque de Londres – e a partir daí segue numa jornada de 24 horas que tem um dos momentos marcantes no show "underground" dos Yardbirds), Page formaria o New Yardbirds e depois partiria para a empreitada de algo novo – e chegou ao Led Zeppelin.

O escolha do nome da nova banda poderia ser um capítulo à parte. A versão mais aceita vem de uma expressão desastrosa: segundo Wall, teria sido sugerido por Keith Moon, baterista do The Who, ao comentar com sinceridade que o supergrupo que Page e Beck pretendiam formar cairia como um "balão de chumbo" (em inglês, "lead balloon"). Jimmy Page gostou da expressão e a adotou como apelido para o grupo. Durante as gravações do primeiro álbum, enquanto escolhiam uma imagem para ilustrar a capa, os quatro músicos decidiram retirar o "a" de "lead". E quando alguém sugeriu a fotografia histórica do incêndio em 1937 do balão dirigível Hindenburg, Page teve a ideia brilhante de trocar "balão" por Zeppelin.

Foi um consenso imediato o novo nome: a união do pesado e do leve. A capa do primeiro álbum mostraria apenas o nome Led Zeppelin e uma fotografia do incêndio que destruiu o balão dirigível de transporte de passageiros, nomeado oficialmente de Hindenburg mas conhecido pelo apelido de Zeppelin em homenagem ao conde alemão Ferdinand Von Zeppelin, pioneiro na invenção e no aperfeiçoamento dos dirigíveis aéreos décadas antes de o avião ser inventado. As versões e os desmentidos são comentados por Wall, enquanto ele aborda sem cerimônia e com conhecimento de causa cada obra e cada show do Led Zeppelin das origens ao primeiro disco, lançado em 1969, passando pela extensa lista de supostos plágios praticados pela banda. A soturna "Dazed and confused", por exemplo – na qual Jimmy Page produz ruídos fantasmagóricos na guitarra com arco de violino – teria sido usurpada do cantor e compositor Jake Holmes. Já "Communication breakdown" foi reescrita, segundo Wall, a partir de "Nervous Breakdown", de Eddie Cochran.



  



Na trilha do Led Zeppelin: acima e
abaixo, Led Zeppelin live at Madison
Square Garden, Nova York, em 1973.

Também abaixo, 1) e 2) fotografias de
Laurance Ratner durante o concerto
de 1975 no Chicago Stadium; 3) uma
foto promocional 
de 1969; e 4) a banda
no palco no Chicago Stadium 
em 1977




















Mas o relato de Mick Wall é, antes de tudo, amoroso – tanto que ele faz questão de destacar que os plágios, mesmo comprovados, não impediram o Led Zeppelin de vender milhões nem de criar sua identidade musical e influenciar gerações posteriores, inclusive pelas loucuras que cometia. As histórias bizarras pontuam cada capítulo – como no caso da velha senhora inglesa contratada no auge do sucesso da banda, em 1973, sob a tutela de Peter Grant, cuja única função era fornecer cocaína à vontade para os músicos. 



Uma groupie e um peixe vivo



Se a popularidade nos palcos e na vendagem de discos era impressionante, a fama propagada pelos excessos e pelos escândalos era ainda maior. Eles viajavam num jato particular, alugavam pisos inteiros dos hotéis mais caros e tornaram-se objeto de algumas das histórias mais estranhas do universo do rock. Entretanto, no quesito autodestruição nenhum dos integrantes da banda superava o baterista Bonham – que morreu em 1980, após consumir, entre outras, uma infinidade de enroladinhos de presunto e exatas 40 doses de vodca com suco de laranja. 
 
 





Segundo Wall, a rotina de Bonham incluía rasgar as roupas dos assistentes em público, fazer quebradeiras aleatórias e sem motivo aparente e andar de moto em alta velocidade nos corredores de hotéis. O caso mais lembrado aconteceu no lendário Chateau Marmont, em Los Angeles, Califórnia. Bonham comprou uma moto e seguiu com ela pelo saguão do hotel, pelo restaurante, escadas e corredores, até chegar à sua suíte. Os hotéis, aliás, eram o cenário preferido dos escândalos: o livro descreve as orgias ritualísticas e enumera episódios incríveis – entre eles o pânico de todos quando alguém anunciou aos gritos que Bonham havia introduzido de repente, durante uma brincadeira erótica, um peixe vivo em uma groupie.

As preferências sadomasoquistas mais esdrúxulas de Page, bem como o interesse do guitarrista pelo ocultismo e o fascínio que tinha pelo polêmico mago Alester Crowley, também são descritos e analisados com atenção por Wall, que não dispensa os detalhes mais horripilantes e até improváveis. O relato dos percalços da banda narrado pelos depoimentos de seus integrantes também deixa à mostra que as várias tendências musicais do grupo foram fundidas apenas no seu quarto álbum, sem título, que é usualmente chamado de "Zoso", "Four Symbols" ou simplesmente "Led Zeppelin IV".










Aquele disco permanece como uma obra radical, destaca Wall, apontando questões de forma e conteúdo: o quarto álbum não tinha nome e o nome da banda também não aparecia na capa. O disco incluía temas que dariam origem ao chamado heavy metal, como "Black dog", o misticismo folk de "The battle of evermore" (cuja letra foi inspirada nos livros da saga "O Senhor Dos Anéis") e a inacreditável "Stairway to heaven", sucesso estrondoso e imediato em vários países, aclamada por muitos críticos e pesquisadores como o maior clássico do rock de todos os tempos.



Diversidade multifacetada



O álbum mais radical do Led Zeppelin contém ainda uma memorável regravação de "When the levee breaks", de Memphis Minnie. Depois disso, no auge do sucesso, em meados dos anos 1970, foi que a banda embarcou para uma turnê pelos EUA, batendo novos recordes de audiência. Tocaram cinco noites seguidas no Earl's Court e produziram uma série de concertos que foram filmados por uma grande equipe e editados apenas 28 anos depois, para lançamento em DVD. A maior parte destas gravações ao vivo permanece inédita. A essa altura, no pico da carreira, o Led Zeppelin já era considerado a maior banda de rock de todos os tempos. 
 
 





Na trilha do Led Zeppelin: as duas capas
do álbum de estreia, gravado em 1968
e lançado em 1969, inicialmente planejado
para ter como título Stunningly Beautiful,
mas lançado apenas como Led Zeppelin.
É o álbum preferido de Jimmy Page, que
liderou todos os estágios da produção.
A fotografia ficou a cargo de Ron Rafaelli










Em uma ou outra passagem mais polêmica, Wall ameniza: como Page e Plant eram fanáticos do blues, "Whole lotta love" e "You shook me" eram realmente muito parecidas com alguns clássicos de Willie Dixon. A banda foi depois acusada de ter usado as letras sem as creditarem a Dixon – e só 15 anos depois, devido a um processo movido pela Chess Records, foi feito finalmente um acordo e efetuado o pagamento devido dos milionários direitos autorais aos herdeiros do bluesman norte-americano.

A biografia também destaca que a banda gostava muito do rock'n'roll norte-americano e fazia questão de tocar em todos os concertos alguma música de Elvis Presley ou de Eddie Cochran. Mas o principal, aponta o biógrafo, é que em nenhum momento o grupo parava de radicalizar ou de experimentar novas possibilidades no estúdio e nas performances ao vivo. Além disso, registra Wall, foram os músicos do Led Zeppelin os primeiros a fazer concertos que podiam durar até três horas e às vezes até mais.






A morte de John Bonham, em 1980, precipitou o fim da banda. O Led Zeppelin, porém, voltaria a se reunir em três ocasiões: em 1985, para o show beneficente Live Aid, com Tony Thompson na bateria; no aniversário de 40 anos da gravadora Atlantic, em 1988, com Jason Bonham na bateria e, mais recentemente, em dezembro de 2007, em uma homenagem a Ahmet Ertegun, fundador do selo americano Atlantic Records, que apostou em 1968 no potencial daqueles quatro jovens britânicos que haviam acabado de formar o Led Zeppelin.

Mais minucioso que a diversidade multifacetada de muitas imagens, textos e depoimentos reunidos no livro de Jon Bream, Mick Wall e seu "Quando os gigantes caminhavam sobre a Terra" chega a apresentar um painel que traduz, à perfeição, a trajetória da banda e a atitude rock em geral. Para o jornalista, no caso do lendário Led Zeppelin, as drogas eram o combustível, o sexo uma forma de auto-expressão e a música, simplesmente, o mapa do tesouro.


por José Antônio Orlando.


Como citar:

ORLANDO, José Antônio. Na trilha do Led Zeppelin. In: Blog Semióticas, 2 de abril de 2012. Disponível no link http://semioticas1.blogspot.com/2012/04/na-trilha-do-led-zeppelin.html (acessado em .../.../…).






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Sobre os símbolos de magia e ocultismo 


O quarto e mais radical disco do Led Zeppelin, lançado em 1971, não tem título, mas traz na contracapa uma sequência de símbolos manuscritos sobre os quais ainda pairam muitas dúvidas. Os biógrafos não fecham questão sobre os significados, mas concordam que cada um dos símbolos tem origem nas ciências da magia e representa um integrante da banda. Confira as versões mais conhecidas de cada símbolo.




1. Símbolo que tem semelhança alfabética e pode ser lido como “Zoso” – representa Jimmy Page a partir de um ícone reproduzido na edição de 1850 para um livro francês anônimo de 1521, “Dragon Rouge e Noire Poulet” (O dragão vermelho e a galinha preta). Uma variação do ícone também aparece no catálogo de símbolos mágicos publicado pelo matemático italiano Geronimo Cardan, em 1557, “De Rerum Varietate – Ars Magica Arteficii” (Das variedades da arte da magia), e foi apropriado pela moderna astrologia como representação de Saturno. No Zodíaco, Page é de capricórnio, signo regido por Saturno.






2. Três formas ovais que se interceptam e são circundadas no enlace por um círculo – representa John Paul Jones e foi copiado de “O Livro dos Sinais”, catálogo do alemão Rudolf Kock sobre a sabedoria oculta das Runas, publicado em 1930. Segundo Koch, o símbolo identifica a confiança e a competência.





3. Três formas circulares entrelaçadas – representa John Bonham e também foi copiado do livro de Rudolf Koch. No livro, indica a tríade que une mãe, pai e filho. Uma das leituras possíveis para a semelhança entre os símbolos de John Paul Jones e de John Bonham vem do jazz, uma das fortes influências da banda. No jazz, o baixista e o baterista sempre formam partes interligadas de uma mesma seção rítmica.




4. A pena dentro de um círculo – representa Robert Plant e está presente no livro publicado em 1933 pelo inglês James Churchward, “Os Símbolos Sagrados de Mu”. Churchward copiou o símbolo de uma das câmaras das pirâmides do Egito que homenageia a deusa Ma'at, entidade que personifica a verdade, a justiça e a lealdade, desde que a pena esteja envolta por um círculo impenetrável...






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