Mostrando postagens com marcador joão gilberto. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador joão gilberto. Mostrar todas as postagens

12 de agosto de 2011

Canto para o mundo






As gravações de João Gilberto com Astrud Gilberto,
com ou sem o Stan Getz, fazem a gente pensar que
a música é o silêncio que existe entre as notas.

Tom Jobim.   




Quase cinco décadas separam as trajetórias de Céu e de Astrud Gilberto, duas cantoras e compositoras brasileiras que têm semelhanças no estilo e voz suave. Céu, desde o início de carreira, lançou canções e álbuns que conquistaram fãs no Brasil e no exterior, enquanto o prestígio de Astrud Gilberto no exterior é indiscutível, há mais de meio século, desde o começo da década de 1960. Astrud é presença obrigatória em todas as listas das grandes cantoras do Jazz, mas no Brasil, por incrível que pareça, ela continua restrita a públicos específicos, cultuada principalmente pelos ouvintes de repertório mais sofisticado, apreciadores da Bossa Nova. 

Afastada dos palcos e da mídia desde o final da década de 1990, Astrud Gilberto foi homenageada com uma raridade: o primeiro DVD da cantora e compositora chegou às lojas no Brasil e em outros países com décadas de atraso. "Astrud Gilberto Ao Vivo no Lugano Festival Jazz" foi gravado em 1985 no célebre festival da Suíça, que atrai todo ano, no mês de julho, uma multidão à centenária Piazza della Riforma para ouvir, ao ar livre, grandes nomes da música internacional e celebrar o verão.

Os fãs de Astrud Gilberto vão por certo ter uma grata surpresa com as imagens da musa em cena, sempre elegante e meio tímida, fazendo mudanças sutis no fraseado de canções conhecidas, subtraindo compassos, acelerando ou desacelerando o andamento da música, com a harmonia de seu tom inconfundível. Para a grande maioria do público, será a primeira vez que se vê Astrud cantando em um show na íntegra. As imagens de suas performances ao vivo são raríssimas, mesmo no YouTube e em outras plataformas da Internet. No Brasil, ela se apresentou uma única vez, em 1965, em São Paulo. Desde então, nunca mais se viu nem se ouviu ao vivo, por aqui, seu jeito suave de cantar, um estilo que sempre lembra o canto que João Gilberto consagrou e que virou marca registrada da Bossa Nova.

No show em Lugano, Astrud Gilberto e banda apresentam clássicos que ela própria lançou, desde a década de 1960, mas também algumas surpresas. Gravado pela TV da Suíça, o show acontece à noite, com a praça completamente lotada. Astrud entra em cena com uma versão personalíssima de "Águas de Março", com afinação impecável e fraseado bastante diferente da versão gravada por Tom Jobim e Elis Regina em 1970. Ela agradece os aplausos falando em italiano e em português e emenda com duas inéditas, "Kumbia" e "Milky Way", composições do então estreante Paulo Jobim, filho de Tom.









Na sequência vem "Dindi", comovente e nostálgica. Astrud tropeça na letra, faz uma pausa e retoma os versos perfeitos de Tom Jobim, sempre elegante. "A Rã", de Caetano Veloso, ganha versão instrumental com "scratches" cheios de "borogodó, berém, berenguedém..." que parecem vir direto do repertório de Carmen Miranda. "Canto de Ossanha" (Vinicius de Moraes) tem uma versão mais contida, com trechos em inglês e versos sussurrados ("pergunte ao seu seu orixá, o amor só é bom se doer...").



Parceria Getz & Gilberto



"Telefone" (Roberto Menescal e Ronaldo Bôscoli), do cancioneiro de Nara Leão, é apresentada em inglês no show em Lugano, seguida de "Girl From Ipanema", clássico dos clássicos de Tom Jobim e Vinicius, que levou Astrud para as paradas de sucesso do mundo inteiro em 1964 - ano do antológico disco "Getz/Gilberto", no qual ela e o então marido João Gilberto dividiram os vocais em parceria com o saxofonista Stan Getz. O repertório de "Getz/Gilberto" também foi a base para o célebre show de João Gilberto, Astrud, Tom Jobim, Milton Banana e companhia no ano de 1962 no Carnegie Hall, em Nova York, evento que consagrou a Bossa Nova fora do Brasil.









Além da presença mítica de Astrud Gilberto no palco, comandando o show, a banda tem belos momentos e performance solo dos músicos que levam a muitos aplausos do público. Acompanham os vocais impecáveis de Astrud um time de bambas: David Saks no trombone, Steve Harrick ao piano, bateria de Duduca Fonseca e, no contrabaixo, a presença rara de Marcelo Gilberto, filho de João Gilberto e Astrud.

O show em Lugano termina com uma versão acelerada para outro clássico de Tom Jobim e Vinicius de Moraes, composição feita para o espetáculo "Orfeu da Conceição", que estreou no teatro em 1956 e que no ano seguinte ganharia uma versão nos cinemas, como "Orfeu Negro": "A Felicidade" ("tristeza não tem fim, felicidade sim..."). Na sequência, uma versão alto astral de Aloysio de Oliveira para "In the Mood", clássico de Glenn Miller na era das "big bands", na década de 1940 - que na versão Bossa Nova virou "Edmundo" e havia sido gravada originalmente por Elza Soares em 1967.






       






Astrud Evangelina Weinert, que nasceu
em Salvador, em 1940, adotou o nome
Astrud Gilberto em 1959, depois do
casamento com João Gilberto. No alto,
Astrud com João Gilberto na praia, no
Rio de Janeiro, em 1960, em fotografia para 
o álbum de João O amor, o sorriso e a flor.

Acima, Astrud em uma apresentação na
TV da Alemanha, em 1970; em fotografia no
estúdio em Amsterdam, Holanda, em 1966;
na capa do álbum lançado em 1964
The Girl from Bossa Nova (The Astrud
Gilberto Album); e com Tom Jobim em
Nova York, em dois momentos: em 1964
e em 1984. Abaixo, o casal recém-casado
Astrud Gilberto e João Gilberto no
Rio de Janeiro, no apartamento em que
moravam; no palco, em 1960; e em
fotografia no estúdio em 1963





















Geração de seguidores



Presente sofisticado para os mais exigentes, o DVD de Astrud Gilberto ao vivo em Lugano tem apenas uma ressalva: a pobreza franciscana do lançamento, que não tem encarte, nem ficha técnica, nem identificação dos músicos da banda ou dos compositores das 11 canções. Pela raridade que representa, merecia melhor acabamento, mas ainda assim é imperdível.

A importância histórica do canto de Astrud Gilberto não tem comparação, mas é impossível não associá-la ao marido João Gilberto, apesar do casamento ter durado poucos anos e das trajetórias de Astrud e de João terem seguido por caminhos diferentes. No mundo inteiro ela é a voz feminina da Bossa Nova, porque foi a primeira cantora do novo estilo musical e sua referência desde o início. Entre os marcos históricos de Astrud está seu lugar como primeira mulher a ganhar um prestigiado prêmio Grammy como melhor gravação do ano, em 1965, pela primeira gravação de "Garota de Ipanema" (do álbum "Getz/Gilberto"), concorrendo com Beatles e Barbra Streisand. Não é pouco. 


Sempre presente nas listas das grandes cantoras de jazz de todos os tempos - ao lado de divas do Olimpo como Billie Holiday, Ella Fitzgerald, Sarah Vaughan e Nina Simone - as gravações de Astrud Gilberto mantêm seu impacto e formaram gerações de seguidores, como destacam em Belo Horizonte especialistas e entusiastas da Bossa Nova como Bob Tostes e Pacífico Mascarenhas.






Acima, Astrud Gilberto e o saxofonista
Stan Getz em 1964. Abaixo, Astrud com
João Gilberto e Marcelo Gilberto, filho
do casal. Após o divórcio, João voltou
para o Brasil e depois seguiu em turnês
internacionais, enquanto Astrud continuou
morando em Nova York com o filho e 
conduzindo a carreira em novas gravações 
e apresentações nos EUA e em países da
Europa. João Gilberto se casaria com a
cantora Miúcha, irmã de Chico Buarque,
com quem teve a filha Bebel Gilberto.

Também abaixo, João Gilberto e Miúcha
em Nova York, em meados dos anos 1960;
João Gilberto com os filhos Bebel e Marcelo;
e Astrud Gilberto em dois momentos: em 1970,
passeando pelas ruas de Nova York; e em
1985, no palco do Festival de Lugano





.








"Ela é inigualável, simplesmente inigualável", aponta o músico e radialista Bob Tostes, pesquisador da música brasileira e da Bossa Nova em particular. "Astrud Gilberto criou um estilo e causou impacto nas cantoras de sua geração e em muitas das jovens cantoras que vieram depois. São muitas as grandes cantoras que buscam a suavidade e a interpretação frágil e contida que Astrud trouxe para o jazz e para a música brasileira e para a música internacional. E muitas cantoras e cantores que fazem sucesso no mundo inteiro reconhecem em Astrud a principal musa inspiradora", completa.

Para o compositor Pacífico Mascarenhas, Astrud Gilberto é um nome tão essencial para a Bossa Nova como o próprio João Gilberto. "Astrud viveu um certo tempo em BH, no final dos anos 1950, na casa de uma tia dela que morava no Bairro Santo Antônio. Eu apresentei um ao outro e foi aqui em BH que ela e João Gilberto começaram a namorar. Como ela tinha fluência no inglês, foi quem ajudou a treinar a pronúncia do João e sem dúvida nenhuma ajudou muito a abrir as portas para a Bossa Nova no exterior", recorda Pacífico, autor da canção "Pouca Duração", que foi gravada por Astrud na década de 1960. "Concordo com o Bob Tostes. Inigualável é a melhor palavra para descrever a presença e o estilo de Astrud Gilberto", conclui.










Durante quatro décadas, do início dos anos 1960 até o final dos anos 1990, Astrud Gilberto fez turnês por vários países e se apresentou nos principais festivais de Jazz. Uma de suas últimas gravações em estúdio foi em 1996, ao lado de George Michael, como contribuição para o Red Hot + Rio, do projeto beneficente Red Hot AIDS, que teve o produtor brasileiro Béco Dranoff entre os organizadores. Com George Michael, que na época estava no auge do sucesso e da popularidade, Astrud gravou a clássica "Desafinado". Desde então, recebeu prêmios e homenagens em vários países, mas não no Brasil. Também esteve na trilha sonora de muitos filmes e muitas séries de sucesso, além de canções como tema de novelas na TV do Brasil, e teve várias de suas gravações revisitadas pela música eletrônica, em remixes feitos pelos DJs mais celebrados. 









Acima e abaixo, Astrud Gilberto com Stan Getz
em cena do filme Get yourself a college girl,
comédia musical dirigida por Sidney Miller e
lançada nos cinemas em 1964. Também acima,
uma das faixas da coletânea "Verve Remixed",
que reuniu grandes sucessos de cantoras de
Jazz do acervo da gravadora Verve em
versões remixadas por convidados;
a gravação original de Astrud de 1965 para
"Who Needs Forever" teve remix do
Thievery Corporation em 2002.

Abaixo, Astrud Gilberto com Stan Getz e
Astrud no estúdio em Amsterdam, Holanda,
em 1966, em fotografia de Nico van der Stam;
e com Stan Getz na capa do álbum de 1969
Astrud Gilberto golden japanese album,
coletânea de gravações ao vivo lançada
somente no mercado japonês pela MGM 











Depois de Astrud, Céu



A lista de cantoras brasileiras que ganharam o mundo não é tão extensa. Começa com Carmen Miranda, no final da década de 1930, passa por Astrud Gilberto a partir da década de 1960, inclui o sucesso de Elis Regina no Festival de Montreux e algumas outras que investiram no filão do jazz e da Bossa Nova, principalmente no mercado da Europa e do Japão. Agora a lista ganhou mais um destaque: Céu, nome artístico de Maria do Céu Whitaker Poças, que despontou como jovem promessa da MPB em 2002, aos 22 anos, depois de começar na música aos 15 anos, quando chegou a gravar vocais para jingles publicitários.

Seu disco de estreia, batizado de "Céu", lançado em 2005, foi uma aposta dos selos Urban Jungle e Ambulante Discos (do produtor Beto Villares) que teve a sorte de conseguir distribuição no exterior pela Warner Music. Bem recebido pela crítica lá fora, que num primeiro momento comparou Céu a Marisa Monte e a Bebel Gilberto, brasileiras que também têm público fiel em vários países, o CD de estreia transformou a cantora e compositora Céu em um surpreendente fenômeno de vendas também fora do Brasil.










Nos Estados Unidos, o disco de estreia da cantora e compositora alcançou a marca invejável de 30 mil discos vendidos em duas semanas, chegando à primeira posição nos rankings de "world music" - a mais alta posição conquistada por uma cantora brasileira no mercado norte-americano desde a gravação original de "Garota de Ipanema" por Astrud Gilberto, em 1963. O disco de estreia ainda vendeu mais de 25 mil cópias em países como França e Holanda e garantiu a Céu uma indicação ao Grammy Latino, em 2006, na categoria de artista revelação. Naquele ano, o prêmio foi para a banda Calle 13, de Porto Rico.

O segundo disco, "Vagarosa", lançado em 2009, cinco anos após o álbum de estreia, segue a mesma trilha do sucesso que aproxima Céu de artistas contemporâneos difíceis de classificar pelos gêneros e categorias tradicionais. Na trilha de nomes como o francês Manu Chao, de quem ela se diz fã e reconhece como uma das suas fontes de influência, Céu vem investindo radicalmente na pesquisa de novas possibilidades e sonoridades, com influências generosas de eletrônica, mas também de samba, frevo, tango, salsa, jazz, blues, folk, hip hop, afrobeat, ska, dance hall e, especialmente, reggae.








Menina Rosa



"Vagarosa" reúne um total de 12 surpreendentes composições próprias, inéditas, e uma única releitura - um rearranjo psicodélico para "Menina Rosa", clássico de Jorge Ben Jor que soa irreconhecível na nova versão. Produzido pela própria Céu em parcerias inspiradas com Beto Vilares, Gustavo Lenza e Gui Amabis, "Vagarosa" é um disco corajoso. Não faz concessões, na contracorrente dos repertórios "versáteis" e pretensamente moldados sob medida para o sucesso tão fácil como efêmero. Definitivamente, é daqueles discos para ouvir com atenção e gostar muito ou não gostar.

Destaque para o auxílio luxuoso de convidados especiais do porte de Luiz Melodia (no autêntico samba recriado por Céu em "Vira-Lata"), além dos vocais sussurrantes e impecáveis de Thalma de Freitas e Anelis Assumpção - que fazem lembrar Rita Marley e outras vocalistas dos mestres da Jamaica em "Bubuia". Marcelo Jeneci também marca presença em "Sonâmbulo", assim como BNegão e Curumin no reggae "Cordão da Insônia", uma das melhores surpresas de um disco que merece destaque entre os principais lançamentos da última temporada.







"Vagarosa" começa com uma pequena porém emblemática vinheta - o prelúdio em samba "Sobre o Amor e Seu Trabalho Silencioso", com seu belo fraseado que remete aos bambas da velha guarda do samba, mas tem letra e música originais de Céu. Tocada apenas ao cavaquinho (por Rodrigo Campos), tira partido da poesia do primeiro verso - "vai pegar feito bocejo/ o que só o sentido vê". É a primeira de uma série de metáforas que reforçam o clima lento, sossegado e sofisticado do CD.

Na sequência, a irresistível "Cangote" ("Fiz minha casa no teu cangote/ não há neste mundo quem me bote/ pra sair daqui...) instaura os ares modernos que as faixas seguintes vão estender até extremos da harmonia. "Cangote" traz o veterano baterista Gigante Brasil em seu show particular e Beto Vilares na guitarra, baixo e "scratches".







Inflexível e hipnótica



Por "Vagarosa" ainda desfilam, entre muitos outros, o talento de Fernando Catatau (em "Espaçonave", que inclui sons da floresta amazônica gravados por Guilherme Ayrosa), Los Sebozos Postiços (formados por Lucio Maia, Pupilo, Dengue, Bactéria, Gustavo da Lua e Jorge du Peixe, egressos do Mundo Livre S/A). Outra presença importante é Chiquinho, mentor da banda Mombojó, em faixas como "Comadi", "Espaçonave" e "Cordão da Insônia".

Eleito entre os melhores discos do ano de seu lançamento (2009) pela maior parte dos críticos musicais da imprensa brasileira, "Vagarosa" também uma recepção incomum e elogios de veículos influentes da imprensa estrangeira, incluindo o norte-americano The New York Times e os ingleses BBC, The Guardian e The Independent. Pela BBC, Colin Irwin definiu Céu como "uma cantora sublime", destacando para o público do Reino Unido que era impossível falar de Céu ou ouvir suas canções sem invocar as semelhanças e aproximações dela com Astrud Gilberto.








Entre tantos convidados ilustres, Céu consegue se impor como o melhor destaque. Com sua voz pequena e sussurrada, que por vezes lembra a jovem Gal dos anos 1960, por vezes soando inflexível e hipnótica, por outras sedutora e caliente, a jovem cantora e compositor equilibra timbres e músicos com raro talento e carisma.

Ao pegar carona na eletrônica e na nova onda de "scratches" e remixes, características de suas investidas desde o disco de estreia, Céu em "Vagarosa" deixa para trás os clichês surrados de medalhões da MPB tradicional e renova as possibilidades do samba e da Bossa Nova entre outros gêneros e categorias. E acerta em cheio, alcançando sonoridades que retratam os novos tempos e acrescentam novidade, sem retomar aquela fórmula de tantos outros que apenas repetem referências para oferecer mais do mesmo.


por José Antônio Orlando.


Como citar:


ORLANDO, José Antônio. Canto para o mundo. In: Blog Semióticas, 12 de agosto de 2011. Disponível no link http://semioticas1.blogspot.com/2011/08/canto-para-o-mundo.html (acessado em .../.../...).



Para comprar o DVD 
Astrud Gilberto / Festival de Lugano,  clique aqui.





 

Para comprar o CD  "Céu ao Vivo",  clique aqui.













5 de agosto de 2011

Um toque de Midani






Pouco a pouco, aos olhos da maioria dos
tecnocratas, os artistas viraram inimigos,
considerados pouco confiáveis, pouco sérios
e sem o menor senso de responsabilidade.
Podia-se ouvir nos corredores: – Esse negócio
de discos seria muito bom se não se tivesse
que lidar com esta raça: o artista…

––  André Midani. 
  


Um dos nomes fundamentais da música e da indústria fonográfica no Brasil, André Haidar Midani acredita que a criatividade na música está em franco declínio e que a indústria do disco chegou, definitivamente, ao fim. Nascido na Síria, em 25 de setembro de 1932, e criado na França desde os três anos de idade, Midani é considerado um Midas da música: foi o descobridor da maior parte dos principais artistas do mercado brasileiro desde o final dos anos 1950.

No Brasil, a trajetória de André Midani tem destaque em capítulos da maior importância, passando pelo nascimento da Bossa Nova, da Tropicália, dos primeiros trabalhos de grandes nomes da MPB e da geração do rock nacional a partir dos anos 1980. Durante sua passagem por Belo Horizonte, onde participou como convidado especial da programação do festival Eletronika, Midani concedeu esta entrevista no Espaço 104, na Praça da Estação, depois de um bate-papo com a plateia do festival sobre o mercado fonográfico e a atualidade da música no Brasil.



.




Com um senso de humor muito peculiar e visão privilegiada sobre o cenário da música e da produção cultural, André Midani abre a entrevista lembrando da infância, passada em Paris. Conta que sofreu na pele os tempos difíceis da Segunda Guerra. Viveu entocado num porão, passou fome e frio. Sua carreira profissional começou por um golpe de sorte em 1952, ainda na França, como funcionário da gravadora Decca.

Ciente da importância de sua trajetória para a música brasileira, Midani registrou seus percalços e sucessos na sua autobiografia, “Música, Ídolos e Poder – Do Vinil ao Download”, publicada em 2009 pela Nova Fronteira. Mas como o livro enfrentou impedimentos judiciais de toda natureza, por conta da franqueza do autor e dos muitos nomes e casos citados, o próprio Midani tomou uma iniciativa das mais ousadas: reproduziu a íntegra do texto em seu site oficial e liberou todo o conteúdo de textos e imagens para download público e gratuito. O livro está disponível no endereço www.andremidani.net/2012/03/musica-idolos-e-poder.html.








Em 1955, André Midani deixou a família em Paris e emigrou para o Brasil, fugindo da convocação para lutar na guerra dos franceses contra a Argélia. Em terras brasileiras, conseguiu o primeiro emprego na indústria fonográfica porque falava francês e português com fluência, e desde então atuou em momentos marcantes da música do Brasil, em mais de 50 anos, destacando-se numa profissão que naquela época ainda não existia: descobridor de talentos e gestor de carreiras e de projetos fonográficos. 



Um som perfeito, eterno


Apaixonado por jazz e por bateria desde a juventude, nunca chegou a ser artista. No final da década de 1950, já morando no Brasil, conseguiu emprego primeiro na Odeon Records e depois na Capitol Records. Foi aí que o fotógrafo Chico Pereira apresentou a ele um grupo de jovens músicos da zona sul carioca, amigos dos filhos: eram Nara Leão, Ronaldo Bôscoli, Carlos Lyra e Roberto Menescal. Pouco depois, Dorival Caymmi lhe apresentou João Gilberto.






Memórias de André Midani no Brasil:
no alto, Carmen Miranda e o Bando
da Lua, em Nova York, 1945. Acima,
André Midani em 1973, nos estúdios
da Philips/Polygram, fotografado por
Luis Alberto, seguido de uma seleção de 
artistas em painel fonográfico da MPB
nos anos 1970 e pela capa do antológico
LP com o registro da íntegra do show
histórico da Bossa Nova apresentado
no Carnegie Hall, em Nova York,
em 21 de novembro de 1962.

Abaixo, Chico Buarque rodeado por fãs
em 1966 em uma sessão de autógrafos de
seu primeiro disco, com 12 canções, entre elas
"A Banda", grande sucesso daquele ano no
Festival de Música Popular Brasileira, exibido
pela TV Record. Chico também seria o grande
sucesso do festival no ano seguinte com a
canção "Roda Viva", apresentada por ele e
pelo grupo MPB 4. Também abaixo,
Marília Medalha e Edu Lobo apresentam
a canção "Ponteio", também no Festival
de Música Popular Brasileira em 1967;
e um encontro, no mesmo festival, em
1967, de Gilberto Gil, Geraldo Vandré,
Chico Buarque e Elis Reginatendo ao
fundo um cartaz com fotografias
de Jair Rodrigues e Nara Leão













"Eu não descobri a Bossa Nova. Na verdade, eu a encontrei", ironiza Midani. Sobre João Gilberto, ele diz que ficou especialmente impressionado quando ouviu aquela voz e aquela batida revolucionária de violão. Desde a primeira vez. Então, ficou atento e acabou conhecendo João Gilberto nas praias do Rio de Janeiro. Em seguida, fez o possível para que João pudesse gravar com total liberdade criativa o compacto com as faixas “Chega de Saudade” e “Bim Bom”. Como toda coisa que é mesmo revolucionária, foi um choque, mas depois você vai se acostumando. O João Gilberto inventou um som perfeito, eterno. Os critérios que ele coloca na música dele são absolutamente geniais, não é uma coisa de moda, que vai passar. É algo definitivo que passa a ser uma referência para todos, universal”, destaca.

Anos depois, na virada dos anos 1960 para 1970, Midani comandava as duas grandes gravadoras em atuação no Brasil: a Philips (que reunia os grandes nomes do que convencionou chamar de Música Popular Brasileira, incluindo de Elis Regina, Tom Jobim e Chico Buarque a Caetano, Bethânia, Gilberto Gil, Gal Costa, Jorge Ben, Raul Seixas e Wilson Simonal) e a Polydor, com artistas de sucesso popular como Tim Maia, Odair José e Evaldo Braga, entre outros. Midani atuava como uma espécie de Robin Hood: usava a renda que ganhava com os campeões de vendas para investir em artistas que vendiam menos.

Quanto à Tropicália, Midani reconhece com toda modéstia que não teve participação na invenção do movimento: "Não os descobri, só dei espaço para Gal, Caetano, Bethânia, Gil, Chico Buarque, Tim Maia, Jorge Ben, Os Mutantes, Elis Regina, Roberto Carlos, Paulinho da Viola, Belchior, Raul Seixas e tantos outros na principal empresa brasileira de discos. Eram os tempos difíceis da censura da ditadura militar, mas fiz como faz um jardineiro que tira o mato e as ervas daninhas para as melhores plantas crescerem", recorda, contando casos engraçados e situações surpreendentes dos primeiros encontros com cada um daqueles iniciantes que se tornariam grandes nomes da música do Brasil.













Memórias de André Midani no Brasil:
no alto, Caetano Veloso com Gal Costa
e Maria Bethânia fotografados em 1975 por
Antonio Guerreiro em seu lendário Studium,
no Catete, Rio de Janeiro; a capa do álbum
antológico Doces Bárbaros, turnê de shows
que reuniu nos anos 1970 Caetano,
Gilberto Gil, Gal e Bethânia; e um
encontro de Caetano, Midani e Gil.

Abaixo, Caetano, Bethânia
e João Gilberto em cena de Brasil,
documentário de 1981 com roteiro
e direção de Rogério Sganzerla;
Caetano no palco, no início dos anos
1970, ao retornar ao Brasil depois do
exílio imposto para ditadura militar;
e Raul Seixas em 1973, na época
da gravação do álbum "Krig-ha, Bandolo!",
outra aposta arriscada de André Midani que
se tornou grande sucesso de público e crítica




















Mentor dos grandes festivais 



Como se não bastasse, Midani também foi um dos mentores dos grandes festivais de música que tomaram o Brasil na segunda metade da década de 1960 e, a partir da década de 1970, tornou-se executivo da Odeon, da WEA e da Philips/Phonogram (depois, Polygram do Brasil e Universal Music). Convidado para montar a Warner no Brasil, apostou no rock nacional no início dos anos 1980, contratando bandas que fariam história. Em 1990, é transferido para Nova Iorque, onde assume a presidência da Warner para a América Latina.

Volta ao Brasil em 2002, para trabalhar em projetos como a ONG Viva Rio. No mesmo ano em que lançou sua autobiografia, "Música, Ídolos e Poder - Do Vinil ao Download", ele foi eleito pela revista "Billboard" uma das 90 personalidades da história da indústria fonográfica mundial. Durante a entrevista, arrisco uma provacação irônica e pergunto sobre o filme "O Homem que Matou o Facínora", de John Ford, no qual o herói diz que, se a lenda é maior que homem, publique a lenda.






Memórias: André Midani no escritório
da 
gravadora Continental, no começo da
década de 
1970, época em que contratou
os Novos Baianos. Abaixo, a capa do
álbum lendário de 1972, Acabou Chorare,
e os Novos Baianos logo após o lançamento
do álbum, 
no sítio que tinha o apelido de
Cantinho do 
Vovô, no Rio de Janeiro:
a partir da esquerda, Baby e 
Pepeu com a
filha Sarah, Bolacha, Charles Negrita,
Galvão, Dadi (de chapéu, olhando para trás),
Baixinho 
e Marilinha com a filha Buchinha
na janela, Gato Felix 
(no chão, de chapéu,
com a filha Ciça), Moraes Moreira, 
Paulinho
com Gil no colo, Marilona com Davi Moraes
no colo, e dois amigos não identificados.
Também abaixo, Belchior, outra aposta de
André Midani em meados dos anos 1970





















Confrontado com a máxima do filme de John Ford, André Midani sorri e faz um exercício de modéstia. "No meu caso, a lenda é cada vez mais exagerada, cada vez mais fantasiosa que a realidade", ironiza, fazendo pausas para lembrar de um ou outro nome, um ou outro acontecimento que foi definitivo na sua trajetória de vida e na trajetória dos artistas com os quais convive e conviveu no passado. "A lenda vive na imaginação das pessoas, mas no meu caso a lenda não é melhor que o homem".

Segundo Midani, ele nunca teve intenção de cultivar nem essa nem nenhuma outra lenda. "Ao invés de incorporar essa lenda que você associa com o filme de John Ford, prefiro lembrar aquele ditado popular que diz que onde tem fumaça tem fogo (risos). Sempre tive muita sorte, isso eu não posso negar. Fui eleito para conviver com a música e com a amizade de tantos artistas maravilhosos ao longo de tanto tempo”.

 



O Brasil é Carmen Miranda e Bossa Nova



Enquanto se diz "brasileiro de carteirinha", André Midani reconhece que somente a sorte pode explicar sua trajetória de tantos sucessos, desde que decidiu trocar a França pelo Brasil, há seis décadas. "Só posso ser muito grato pela vida ter me concedido tanta sorte e por ter permitido que eu descobrisse ainda jovem este país tão maravilhoso que é o Brasil". 

Confira, a seguir, os principais trechos da entrevista em que a principal lenda do mercado fonográfico brasileiro recorda sua trajetória e tece comentários espirituosos sobre personalidades do primeiro time, como Carmen Miranda e os medalhões da Bossa Nova e da Tropicália.






Quais são as suas recordações mais antigas sobre música? 
 
André Midani – Se eu puxar pela memória, preciso reconhecer que todas as minhas lembranças mais antigas têm alguma relação com música. Lembro do dia em que um tio meu chegou em casa com um gramofone. Chamou a criançada, botou o disco com uma canção muito popular na época, "La Mer", do cantor e compositor francês Charles Trenet. Foi inesquecível. Para mim, que tinha menos de dez anos, foi uma experiência tão forte que não consigo lembrar de nada da minha infância antes disso.









E a mudança da França para o Brasil, em 1955, como foi?

Minha única referência sobre o Brasil era a figura maravilhosa de Carmen Miranda. Tudo o mais era mistério, tudo era diferente do que eu conhecia. Talvez por isso, o começo foi muito, muito difícil. Penei bastante por uns dois anos, trabalhando como apontador de estoque e vendedor. Mas depois a vida me deu em dobro. Acho mesmo que tirei a sorte grande, por todas as experiências que tive e por todas as pessoas tão especiais que conheci. A vida me apresentou todos os grandes nomes da Bossa Nova, me apresentou João Gilberto e tantas outras pessoas, artistas geniais, tantas oportunidades incríveis…

O Brasil daquele tempo era outro…

Sim, era um outro país, muito mais simples, muito mais sonhador, com características muito diferentes. Era um país ainda desconhecido, que impressionava o mundo por seu exotismo tremendo. Mas é preciso reconhecer que, no imaginário internacional, até hoje o Brasil é Carmen Miranda e Bossa Nova.








Carmen Miranda e o Bando da Lua:
acima, a estrela em Nova York, durante a
longa temporada de shows na Broadway,
na década de 1945, que rendeu a Carmen
na imprensa o título de "a mulher que
salvou a Broadway". No alto, Carmen
em cenas de "Romance carioca" (Nancy
goes to Rio), filme de 1950 com roteiro de
Sidney Sheldon e direção de Robert Z. Leonard;
e a estrela com seus músicos brasileiros em
Hollywood, em 1941, durante as filmagens de
Uma Noite no Rio (That Night in Rio),
comédia musical de 1941 com cenários do
Rio de Janeiro recriados em estúdio com
direção de Irving Cummings.

Abaixo, Carmen Miranda em sua casa
em Beverly Hills, nos anos 1940, em
rara fotografia em que aparece com os
cabelos soltos e sem a caracterização
de baiana que marcou sua carreira







Mas Carmen veio muito antes e representa quase o avesso da Bossa Nova…

Você tem toda razão. Podemos dizer que Carmen Miranda era colorida, dançante, enquanto a Bossa Nova era em preto e branco, com suas canções de harmonias minimalistas, seus temas de nostalgia e de melancolia. Carmen foi o contrário disso, era festa e carnaval. A Bossa Nova era mais introspectiva.

Carmen Miranda ainda tem alguma importância hoje ou ficou no passado?

Carmen ainda é genial e se mantém como uma referência cultural muito forte no Brasil e em outros países. Talvez no mundo inteiro. Além de grande cantora, grande dançarina, atriz, comediante e designer, muito antes desta palavra começar a ser usada, ela também foi pioneira no que hoje chamamos de marketing. Era uma artista completa, encantadora, que manipulava muito bem a mídia e que usou seu talento para se manter no auge durante décadas. 

Sim, Carmen Miranda era a extroversão em pessoa, gentilmente carnavalesca, muito engraçada e conquistou o mundo a partir de Hollywood. Engraçado como a Bossa Nova era o contrário, era a total introversão. Mas também fez um sucesso estrondoso no mundo inteiro, a partir do sucesso inicial nos Estados Unidos. Quanto a Carmen, acho que infelizmente ainda hoje ela é muito mal compreendida no Brasil, depois de tanto tempo.







Como André Midani chegou à Bossa Nova?

Quando penso na Bossa Nova, penso em um quarteto da maior importância: João Gilberto em primeiro lugar, Tom Jobim, Newton Mendonça e, logo depois, João Donato. Estes quatro personagens foram os mais essenciais para o que chamamos de Bossa Nova. Claro que tem outros nomes que contribuíram muito, tem os precursores do movimento, os destaques das gerações que vieram depois, o sucesso de Astrud Gilberto no exterior, tem Elis Regina e as outras cantoras... Mas sem o trabalho criativo daquele quarteto inicial, sem João Gilberto, Tom Jobim, Newton Mendonça e João Donato, a Bossa Nova não teria existido com tanta força e qualidade. 










Memórias de André Midani no Brasil:
no alto, João Donato e João Gilberto 
em 1957, passeando e proseando
em Copacabana, antes da Bossa Nova.
Acima, João Donato e André Midani em 1972.

Abaixo, Gilberto Gil e seu violão nas ruas de
Londres, em 1969, durante a temporada
que passou no exílio, com Caetano Veloso,
por imposição da ditadura militar;
Tom Jobim e Elis Regina no estúdio,
em 1974, durante a gravação da canção
Águas de Março; e Chico Buarque com
Caetano Veloso no palco, em 1979,
apresentando as canções do álbum
"Chico e Caetano, juntos e ao vivo",
gravado em 1972 no Teatro Castro Alves,
em Salvador, logo após o retorno de
Caetano do seu exílio em Londres,
por imposição da ditadura militar












Além da Bossa Nova, você também tem importância fundamental na Tropicália, no que passou a ser chamado de MPB e também no sucesso dos principais nomes do rock nacional, a partir dos anos 1980…

Sim, é isso mesmo. Confesso que vivi (risos). E sobrevivi, para contar minha versão dessas histórias, todas maravilhosas. Cada um destes movimentos teve suas idiossincrasias, seus mitos. Na Tropicália, a grande questão foi o pensamento anárquico, talvez por isso Carmen Miranda, que morreu em 1955, tenha ressurgido com tanta força no movimento, depois de ter sido escorraçada durante uma década pela Bossa Nova. 

Para os tropicalistas, Carmen trazia o frescor de misturar cultura de massas com a autêntica cultura popular brasileira. Com a Tropicália, Carmen ajudou pela segunda vez a deixar a música e a cultura do Brasil menos introvertida. Por isso ela ainda é tão importante e marcante. Essa proposta de extroversão e festa também voltaria com força com Rita Lee nos Mutantes e depois na carreira solo da Rita, nos Secos & Molhados e em muitos e muitas. Nos anos 1980, o espírito de festa e carnaval que Carmen inventou voltaria à MPB com as melhores bandas do rock Brasil.


















Memórias de André Midani: no alto,
o mais famoso anúncio publicitário da
MPB, publicado em 1973 em jornais e
revistas para divulgar o Phono 73, festival
realizado em São Paulo, em maio de 1973,
no Palácio de Convenções do Anhembi, e
produzido pela Philips/Phonogram que, sob o
comando de André Midani, detinha, na época,
contrato com a maioria das estrelas da música
brasileira. O Phono 73 também teve, segundo
Midani, o intuito de denunciar ao público a
ditadura militar e a censura no Brasil.
Nas fotos, nos bastidores do Phono 73,
Gilberto Gil com Chico Buarque; e Gal Costa,
Nara Leão, Maria Bethânia, Caetano Veloso e
Odair José, fotografados por Antonio Guerreiro.

Acima, Rita Lee com André Midani
em 1972 e com Os Mutantes, em uma de
suas últimas fotos na formação original do
grupo. Abaixo, Os Mutantes (com Rita Lee
em primeiro plano), Caetano Veloso e
Gilberto Gil no palco da boate carioca
Sucata, em outubro de 1968, na estreia
da conturbada temporada de shows que
terminou com a prisão de Caetano e Gil
e com o exílio dos dois em Londres; no
fundo do palco havia uma bandeira, obra
do artista plástico Hélio Oiticica, com a
inscrição "Seja Marginal, Seja Herói".

Também abaixo, os irmãos Arnaldo
Baptista e Sérgio Dias Baptista com
Rita Lee na foto da capa do primeiro
álbum de Os Mutantes, em 1968; e
na fotografia no topo do Edifício Copan,
em São Paulo, produzida para estampar
a capa do álbum estreia, mas que
permaneceu inédita até 1999, quando
foi capa do álbum Os Mutantes, coletânea
lançada pelo selo Luak Bop nos EUA depois
da mediação feita por André Midani entre
Rita, Arnaldo e Sérgio Dias









 
E a crise do mercado fonográfico? Posso dizer que André Midani concorda que a indústria do disco chegou ao fim?

Chegou ao fim, definitivamente, sem nenhuma dúvida. Estamos assistindo a seus últimos momentos. O mercado da música já está caminhando em outras direções e todas elas, ou a maioria delas, têm relação com as plataformas da internet. E há também um fato incontestável: a criatividade musical está em declínio, no Brasil e no mundo inteiro. Quase tudo o que aparece é relançamento, ou remix de algo antigo, ou uma releitura, ou um plágio descarado, ou mais um cover sem nada a acrescentar... Basta lembrar que o último instrumento musical, que é a guitarra elétrica, foi inventado há mais de 60 anos. 

Atualmente, com a facilidade para se reproduzir cópias de CDs e DVDs, com os mais de 18 milhões de sites musicais disponibilizando discos inteiros na Internet, não há futuro para a indústria tradicional. É o fim de uma época, mas ainda não sabemos direito o que está por vir. Temos sinais das novidades, mas ainda não sabemos como será a transformação com o passar do tempo.













E a música que se faz hoje no Brasil, é melhor ou pior do que nas últimas décadas?
 
Difícil responder a sua pergunta, porque hoje tem de tudo. Você, que é um especialista e um pesquisador bem informado, pelo que estou vendo, sabe que o novo e o antigo hoje estão disponíveis ao mesmo tempo e que pouca gente sabe diferenciar entre o que vale e o que não vale a pena. No fundo, tem alguma coisa interessante aqui e ali, mas também tem muito lixo, muita coisa lamentável e completamente descartável. 

Hoje temos menos qualidade, mas ainda assim temos novidades que merecem atenção. Das mais recentes, gosto muito da Céu, gosto do Otto, da Fernanda Takai, da Maria Gadú... e de muitas outras e outros talentos que vão surgindo por este meu Brasil afora. Tem uma lista bem interessante, mas não vou citar todos os nomes porque com certeza cometeria a injustiça de esquecer de flar de algum nome importante. Ah, eu preciso confessar que tenho me rendido cada vez mais à música eletrônica porque tem coisas muito surpreendentes aparecendo. Já ouviu os tangos eletrônicos em remixes? Acho que é lá que está o futuro.


por José Antônio Orlando.


Como citar:

ORLANDO, José Antônio. Um toque de Midani. In: Blog Semióticas, 5 de agosto de 2011. Disponível no link http://semioticas1.blogspot.com/2011/08/um-toque-de-midani.html (acessado em .../.../...).









Outras páginas de Semióticas