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26 de outubro de 2013

Darcy Guarani Kaiowá







A história política brasileira não cabe nas ficções do
realismo mágico porque é por demais inacreditável.
(...) O povo brasileiro pagou, historicamente, um
preço terrivelmente alto em lutas das mais cruentas
de que se tem registro na história, sem conseguir
sair, através delas, da situação de dependência
e opressão em que vive e peleja.

–– Darcy Ribeiro, “O povo brasileiro” (1995). 

      


Polêmico por sua defesa intransigente do foco em relação aos direitos dos índios e à prioridade para a educação no Brasil, antropólogo, sociólogo, educador, político, Darcy Ribeiro (1922–1997) foi atuante em projetos que marcaram época como a criação do Parque Nacional do Xingu e do Museu do Índio, além de ser um dos criadores e primeiro reitor da Universidade de Brasília e também autor de livros importantes, incluindo romances e estudos sobre os povos indígenas.

Em livros e projetos, Darcy Ribeiro continua correndo mundo, décadas depois de sua morte, aos 75 anos, em fevereiro de 1997. Recebeu muitas homenagens, concedeu entrevistas que marcaram época, defendeu causas que antes dele permaneciam no anonimato. Tive a sorte de participar de um breve encontro em 1994 com Darcy Ribeiro. A entrevista, publicada por um jornal de Belo Horizonte, foi um reencontro do então senador com jornalistas e fotógrafos em sua casa, em Brasília, depois de um longo período de tratamento médico.

Sempre engajado nas questões políticas, presença em momentos definitivos da História como ministro-chefe da Casa Civil do presidente João Goulart, no último governo democrático antes do golpe e da ditadura militar que tomou o poder em 1964, foi obrigado ao exílio, como muitos intelectuais brasileiros. Foi para o Uruguai. Em 1969, faria seu primeiro retorno ao Brasil, graças a um habeas corpus, mas com o AI-5, teve seus direitos novamente suspensos, acabou conduzido à prisão e depois ao exílio forçado, desta vez na Venezuela, no Chile e no Peru. No Chile, entre outras atividades, assessorou o presidente Salvador Allende, de quem se tornou grande admirador. 






               
   






Darcy Ribeiro: a partir do alto, em
fotografia de 1994 de Bob Wolfenson.
Acima e abaixo, Darcy nas décadas de
1940 e 1950 com os povos indígenas
Kadiwéu, Urubu-Kaapor, Ofayé-Xavante
e outros grupos estudados por ele,
em imagens selecionadas para a mostra
realizada em 2010 pelo Ministério da Cultura
e pela Funai, com curadoria do fotógrafo
Milton Guran, intitulada
O olhar precioso de Darcy Ribeiro, que
apresentou fotografias de 1946 a 1956.

Também abaixo, mulheres Kadiwéu e
Berta Ribeiro, esposa de Darcy e também
antropóloga, fotografadas por ele na tribo
dos Kadiwéu em Mato Grosso, em
1948. Berta e Darcy viveram durante
anos com os povos indígenas, estudaram
seus costumes, sua cultura, e publicaram
livros e artigos científicos sobre o tema












 
Saudades do Brasil



O retorno ao Brasil, com a redemocratização, o levaria de volta à militância política e Darcy se elegeu vice-governador do Rio de Janeiro, de 1983 a 1987. Na gestão da agenda social do governo de Leonel Brizola, Darcy criou, planejou e dirigiu a implantação dos Centros Integrados de Educação Pública (CIEP), um projeto pedagógico visionário e revolucionário no Brasil de assistência em tempo integral a crianças, incluindo atividades recreativas e culturais para além do ensino formal, em 500 unidades instaladas no estado do Rio de Janeiro para atendimento integral aos alunos da rede estadual, incluindo ações complementares de apoio didático, atendimento médico e odontológico.

Depois da experiência como vice-governador viriam outros cargos e gestões, até a eleição como senador, também pelo Rio de Janeiro, de 1991 até sua morte. Naquela entrevista, em 1994, como éramos mineiros, em maioria, Minas Gerais acabou sendo o tema principal. “Saí de Montes Claros, Minas Gerais, para estudar, e minha carreira me lançou aos índios, ao Rio de Janeiro, a Brasília, a São Paulo, ao exterior. A vida da gente são caminhos que se bifurcam”.

Comprometido com o mandato de senador em Brasília e travando sua batalha existencial contra a doença, Darcy dizia que não via a hora de retornar a Minas sem agenda, sem hora para voltar. “O fato concreto é que sou um mineiro isolado e, por isso, às vezes passa pela minha cabeça fazer uma coisa em Minas ou participar da vida mineira. Minas está ficando careca, de Belo Horizonte a Montes Claros. E me dói ver como a canalha está acabando com a vegetação. Pequi, então, estão derrubando tudo para fazer carvão. Acabando com o cerrado, aquela beleza prodigiosa”.



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Darcy ainda reclamou e ironizou os efeitos dos medicamentos, fez graça com os resultados da quimioterapia, da radioterapia. Depois brincou com os fotógrafos, dizendo que estavam proibidos os closes e os enquadramentos com planos fechados no rosto. “Só plano à distância. Close-up está proibido. Não tenho mais cabelos, não tenho sobrancelhas. Respeitem o velhinho. Está proibido!”, declarou, logo no começo da entrevista, encontrando piada para fazer rir seus entrevistadores e para comentar as mudanças que o tratamento prolongado contra o câncer provocava. Também quis saber o nome completo e a cidade de cada jornalista, cada fotógrafo.



Memórias da Mantiqueira



Minas exporta minérios e exporta mineiros. Mas a gente que é exportado, que vai para a Diáspora, continua com Minas no coração”, ele reconheceu, enquanto explicava que tinha pressa e falava sem parar, esticando o assunto com a história de vida de cada repórter. Quando chegou a minha vez, perguntei sobre as andanças e expedições de Darcy e comentei sobre minhas origens na Serra da Mantiqueira, dos meus antepassados migrantes nas fazendas Catauá e Cabangu desde o século 19, italianos, turcos, holandeses. Ele ficou animado com a conversa e fez muitas perguntas, até que o assunto chegou nos irmãos Villas Boas e Darcy Ribeiro foi longe, provando por A mais B que conhecia muito mais detalhes sobre aquela região e sobre a história de meus antepassados do que eu jamais poderia supor.












O assunto Mantiqueira levaria Darcy Ribeiro aos comentários saborosos sobre a língua dos povos Tupi Guarani e daí a “Maíra”, seu romance autobiográfico de 1976, que relata passagens com os irmãos Villas Boas e seu próprio envolvimento com a causa indígena. Também falou dos outros romances, escritos durante as temporadas no exílio, mas reconheceu que são as páginas de “Maíra” que trazem o encantamento que também o levou às pesquisas de campo.

Em 1946, Darcy formou-se em Antropologia pela Escola de Sociologia e Política de São Paulo e dedicou seus primeiros anos de vida profissional ao estudo dos índios do Pantanal Matogrossense, do Brasil Central e da Amazônia (1946-1956). Quando Darcy deixou Montes Claros e chegou a São Paulo para estudar, vinha de outra experiência marcante, depois de desistir do curso de Medicina em Belo Horizonte.














Temporadas entre povos indígenas



Saí de Minas com sentimento forte de missão. Na época eu recebi uma bolsa do sociólogo norte-americano Donald Pierson, fui ver no que dava o curso e acabei cumprindo o bacharelado em Ciências Políticas e Sociais”, ela recordou, com memória prodigiosa para datas, nomes, números, acontecimentos da História. Em 1947, foi contratado pelo Serviço de Proteção aos Índios (SPI), órgão indigenista criado no início do século pelo marechal Cândido Rondon, uma das figuras a inspirar Darcy no trabalho de assistência às populações indígenas.

No SPI, Darcy realizou pesquisas etnológicas, a maior parte durante períodos prolongados junto aos índios. Em mais de uma década de convívio em longas temporadas visitando os povos do Pantanal, do Brasil Central e da Amazônia, ele escreveria uma série de estudos e teses de referência em Antropologia e Etnologia, entre eles “Religião e Mitologia Kadiwéu” (1950), livro com o qual ganhou o importante prêmio Fábio Prado e, com ele, certa notoriedade. 











Em todas as obras e artigos que escreveu e publicou neste período, Darcy destaca a parceria fundamental da esposa, a antropóloga Berta Gleiser Ribeiro, que o acompanhava em viagens e pesquisas de campo, além de aparecer como co-autora em várias obras. Berta retorna à conversa e à história de Darcy várias vezes, assim como as lembranças de Minas e sua fala apaixonada pela causa indígena, que o levaram a participar de projetos como a criação do Museu do Índio e do Parque Indígena do Xingu.



Tempo da Utopia, o futuro




Os projetos da causa indígena, os rumos da educação pública e momentos importantes como a criação da Universidade de Brasília estavam no centro de atenção, durante a entrevista com Darcy, que enumerava projetos, possibilidades no futuro, o tempo da Utopia. “Dediquei a vida aos índios, à minha paixão por eles e também à escola pública. Minha vida é feita de projetos impessoais para passar o Brasil a limpo, porque o Brasil é máquina de gastar gente. Gastou seis milhões de índios e o equivalente de negros. Para eles? Não! Para adoçar a boca do europeu com açúcar, para enriquecer uns poucos. O povo foi gasto como carvão neste país bruto”.




 



Ele disse que eram ideias para um livro que estava finalizando, que reuniria algumas de suas confissões. “Mas não serão confissões sobre a culpa, à moda de Santo Agostinho. Será um acerto de contas com projetos e histórias que ficaram interrompidos no passado, será um inventário de lembranças importantes, para mim e para o Brasil. Vou falar até de Montes Claros, para que alguém se lembre daquele tal de Darcy Ribeiro que nasceu lá na terra do cerrado”, explica, trazendo de novo a ironia por causa dos efeitos do tratamento de quimioterapia e radioterapia.

Agora não posso aparecer por lá, em Montes Claros, porque vão fugir de mim. A doença me derrubou, derrubou meus cabelos. Estou vivendo períodos em que nem eu me reconheço. Olho no espelho e não vejo a minha cara. Eu tinha cabelos de poeta, adorava aquele cabelão. Até meus adversários admiravam e elogiavam meus cabelos e minhas sobrancelhas longas, desgrenhadas”, disse, entre a graça e o lamento sincero.



Visão de mundo



Prosador veterano, sábio, invariavelmente polêmico, Darcy fala com propriedade da visão de mundo dos índios e das grandes personalidades com as quais conviveu – as vezes em que encontrou Getúlio Vargas, o humor à flor da pele de Juscelino Kubitschek, a época de João Goulart, os capítulos de sua biografia que mais parecem um cronograma de História do Brasil: em 1955, foi encarregado por JK de comandar um programa nacional de alfabetização; em 1961, tornou-se o primeiro reitor da Universidade de Brasília; em 1963, assume o gabinete civil do presidente João Goulart. Depois veio a ditadura militar, a prisão, a vida no exílio.





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A sinceridade de Darcy Ribeiro nunca evitou as críticas nem aos amigos mais próximos nem aos adversários. Ele citava de memória denúncias e dossiês sobre massacres e acusava seus pares da Antropologia de terem rompido seu compromisso com os povos que estudavam, em especial com os indígenas. Segundo Darcy, os antropólogos, em sua maioria, estavam transformados em “cavalos de santo” – aqueles que nos cultos de origem africana são tomados por entidades que vêm falar por meio deles. “Só que, no caso brasileiro, os antropólogos estão tomados por entidades do ‘primeiro mundo’, limitando-se a repetir em suas teses o que falavam os grandes intelectuais lá de fora”.

A conversa com Darcy Ribeiro tem a duração de pouco mais de uma hora, mas cada ponto da pauta rende do entrevistado revelações saborosas sobre a História e a Política, em Minas e em Brasília, no Brasil, sobre quem estava no poder e sobre os que já estiveram. Ele também envolve na prosa os grandes escritores mineiros do século 20, Drummond, Nava, Guimarães Rosa, Murilo Mendes, vai às referências do barroco, rende reverências ao gênio e às lendas sobre Antônio Francisco Lisboa, o Aleijadinho.

Minas é uma terra engraçada de gente engraçada que aceita a ideia de que um dos maiores escultores do mundo andava arrastando a bunda num pedaço de couro”, gracejou Darcy, rindo da própria piada até quase perder o fôlego. “O Aleijadinho é a prova concreta, cravada na pedra, de que Minas datou e atou o Brasil”, conclui Darcy. “Foi o espírito do barroco mineiro que garantiu a construção da alma brasileira. Tenho muito sentimento por isso e também o sentimento de que Minas tem pouco: é pouco dada, por exemplo, ao Aleijadinho”.






Confissões e sorrisos



O livro “Confissões” realmente foi publicado. Sairia em 1997 pela Companhia das Letras, com ilustrações de Oscar Niemeyer. Retornei à pauta daquela entrevista com Darcy Ribeiro no lançamento do livro e tempos depois, no final de 2010, quando foi aberta na Caixa Cultural Rio uma exposição inédita com 50 fotografias produzidas por Darcy Ribeiro nas temporadas que ele viveu com as tribos Kadiwéu, Urubu-Kaapor e Ofayé-Xavante.

Denominada “O Olhar Precioso de Darcy Ribeiro”, a mostra selecionou imagens que pertencem ao acervo do Serviço de Proteção aos Índios (SPI), incorporado desde 2008 ao Registro Nacional do Programa Memória do Mundo, da Unesco. Nas fotografias de trabalho de Darcy, cenas do cotidiano das aldeias, tatuagens faciais de personagens diversos, rituais e anotações visuais acompanhadas de pequenos textos-legenda, para maiores explicações.

“O Olhar Precioso de Darcy Ribeiro” também incluiu a projeção do clássico filme de autoria de Hans Foerthmann “Um dia de uma tribo na floresta tropical”, recentemente restaurado e digitalizado, que conta a história dos índios Urubu-Kaapor, contactados por Darcy na década de 1940. Milton Guran, organizador da mostra, destacou no texto de apresentação distribuído à imprensa que as séries de fotografias de Darcy são realmente especiais porque ele, ao fotografar, misturava os ânimos da descoberta científica e da experiência humana que os encontros interculturais possibilitam. 
















Darcy Guarani Kaiowá: a partir do alto,
1) Darcy Ribeiro, chefe da Casa Civil do
governo João Goulart, é expulso de Brasília
para o exílio no Uruguai, em 1964, quando
é deflagrado o golpe militar; 2) Darcy Ribeiro,
de volta do exílio, no final dos anos 1970, tem
encontro com intelectuais e presos políticos,
ainda durante a ditadura militar: a partir da
esquerda, Jorge Raymundo, Manoel Henrique
Ferreira, Perly Cipriano, Darcy, Antonio Houaiss
e Oscar Niemeyer; 3) acima, Darcy com
Brizola e Niemeyer no apartamento em que
Darcy morava em Copacabana, no Rio de
Janeiro, em 1995, na época do lançamento
da Fundação Darcy Ribeiro.

Abaixo: 1) DarcyLuiz Inácio Lula da Silva,
então dirigente sindical, em 1984, no
Congresso da Internacional Socialista
no Rio de Janeiro; 2) em visita a uma das
salas de aula dos CIEPs (Centro Integrado de
Educação Pública) que instalou no Rio de Janeiro,
depois de se eleger como vice do governador
Leonel Brizola, em 1992; e 3) um encontro de
Darcy e Paulo Freire em 1991, no Rio de Janeiro,
em um seminário que teve como tema os CIEPS;
4) Darcy beija Brizola, governador do Rio;
5) um encontro de Darcy em Brasília, em 1995,
com lideranças dos povos do Parque
Nacional do XinguTambém abaixo,
Darcy na praia de Copacabana, em 1976,
quando retornou ao Brasil depois do exílio
imposto em 1964 pela ditadura militar.
No final da página, Darcy com os índios
Kadiwéu na década de 1940 



















"Ele fotografava para entrar em contato e produzia uma memória desse encontro. Sua fotografia superou o registro descritivo e adentrou pelo mundo da imaginação. Em suas imagens, a impressão que temos é que Darcy se deu ao luxo de agir como um flâneur, como se fora um turista acidental a cultivar relações e recolher lembranças”, explica Milton Guran, enumerando algumas das reflexões originais que o pensamento teórico e as imagens documentais de Darcy Ribeiro representam.

O resultado da exposição, que segue em agenda itinerante pelas capitais, é um rico painel sobre as diferenças e a visão de mundo dos povos indígenas – que recebem de Darcy um registro fraternal e respeitoso, ainda que profundamente melancólico, mesmo quando um raro sorriso aberto do pesquisador abraçado aos índios Kadiweu no Mato Grosso do Sul, em 1947, é enquadrado pela câmera de Berta Ribeiro, sua esposa e companheira de missão.










Ao concluir este artigo sobre aquela entrevista de 1994 e sobre as fotografias de Darcy Ribeiro com os índios, recordo algumas de suas frases que fizeram história. Muitas delas, especialmente, são reveladoras sobre seu pensamento, sobre o acervo que ele deixou e sobre sua militância política. Palavras de Darcy, lançadas em "O Brasil como problema", livro que ele publicou em 1995 pela Editora Francisco Alves e que retornariam depois com o livro "Confissões", publicado em 1997 pela Companhia das Letras:

"Fracassei em tudo o que tentei na vida. Tentei alfabetizar as crianças brasileiras, não consegui. Tentei salvar os índios, não consegui. Tentei fazer uma universidade séria e fracassei. Tentei fazer o Brasil se desenvolver de forma autônoma e fracassei. Mas os fracassos são minhas vitórias. Eu detestaria estar no lugar de quem me venceu". E, nas páginas seguintes, uma citação que também poderia ser tomada como conclusão e como lição de vida: "Coragem! Mas vale errar, se arrebentando, do que poupar-se para nada".


por José Antônio Orlando.


Como citar:

ORLANDO, José Antônio. Darcy Guarani Kaiowá. In: Blog Semióticas, 26 de outubro de 2013. Disponível no link http://semioticas1.blogspot.com/2013/10/darcy-guarani-kaiowa.html (acessado em .../.../...).









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31 de julho de 2012

Criança e design em 1900







A criança que tem a liberdade e a oportunidade de usar
suas mãos de maneira lógica, entendendo as consequências e
usando elementos reais, desenvolve uma personalidade forte.

––  Maria Montessori (1870-1952). 
   

O século 20 começou sob o signo do design e com a criança elevada a um novo patamar na vida em sociedade. A popularização da fotografia e a novidade do cinema, o aperfeiçoamento de diversas máquinas e a multiplicação dos processos industriais na produção de objetos utilitários, que proporcionavam mais conforto e funcionalidade à vida cotidiana, também coincidiram com uma nova visão sobre os brinquedos e brincadeiras e, especialmente, sobre o que seriam os direitos da infância.

Tratadas, nos séculos anteriores, como pequenos adultos, as crianças ainda muito jovens ingressavam na condição de mão-de-obra para o trabalho: quando não formavam multidões de operários infantis, tornavam-se úteis na economia familiar, realizando tarefas, imitando seus pais e suas mães, acompanhando seus ofícios, cumprindo um papel predominante de mão-de-obra fácil e disponível sem reservas perante a coletividade. Para crianças e adolescentes, foi a partir de 1900 que as coisas começaram a mudar.

No começo do século passado surgiriam as primeiras noções científicas sobre a importância do “brincar” para o desenvolvimento da infância. Na Europa, um marco pioneiro para o novo patamar na valorização da criança é estabelecido exatamente em 1900, com a publicação de um livro pela educadora sueca Ellen Karolina Sofia Key (1849–1926). Com o título corajoso e premonitório de “O século da criança” (Barnets ahrundrade), o livro destacava este direito fundamental de meninos e meninas que muitas vezes passava despercebido, como se fosse menos importante ou supérfluo: o direito de brincar. Libertária, militante pelos direitos femininos e pelo voto feminino, uma feminista à frente de seu tempo, Ellen Key, em conjunto com outros teóricos da educação, entre eles o brasileiro Paulo Freire, recebem um tributo importante com uma exposição promovida pelo MoMA, Museu de Arte Moderna de Nova York.

















No alto da página, o clássico “lobo
vermelho com rodas de bolinhas
 para puxar” criado como objeto
para uma exposição de artes plásticas
em 1980 por Keith Haring e depois
transformado em brinquedo industrial
de sucesso no mundo inteiro. Acima,
peças avulsas da coleção O Barco, de
1915, seguida do catálogo da exposição
no MoMA e retrato datado de 1920
da educadora sueca Ellen Key.

Abaixo, Jean Piaget, biólogo e psicólogo
suíço que tem uma profunda influência
na educação e que teorizou sobre a
cognição humana a partir da observação
de seus próprios filhos, fotografado em família,
em 1936, com a esposa Valentine Châtenay e
os filhos Lucienne, Laurent e Jacqueline;
e uma amostra do acervo e dos
cartazes promocionais da exposição
O Século da Criança: Crescendo
com Design, 1900-2000






         



 

 
Intitulada "Century of the Child: Growing by Design, 1900-2000" ("O Século da Criança: Crescendo com Design, 1900-2000"), a exposição no MoMA, sem precedentes em sua abrangência e na iniciativa de abordar um universo de tamanha complexidade em aspectos didáticos, lúdicos e historiográficos, apresenta, de 29 de julho a 5 de novembro, uma linha do tempo sobre a trajetória da relação entre as crianças e artistas de diversas áreas que, ao produzirem peças “para brincar”, marcaram o design no século 20. O cenário inicial da trajetória que a exposição reconstitui, destacam os curadores, abarca a Belle Époque, na passagem do século 19 para o século 20, um período que teve o progresso técnico como palavra de ordem.

As muitas novas invenções, os avanços nas artes e nas ciências, com melhorias nas técnicas e nas condições de saúde e de higiene, começariam a estabelecer também na vida cotidiana uma nova visão sobre a infância, valorizando com maior ênfase a educação e os brinquedos que, já no final do século 19, passariam a ser incorporados às linhas de produção industrial. Com a evolução nas relações sociais, a criança gradativamente deixaria a condição precoce de pequeno adulto e passaria a ter papel central nas preocupações da família e da sociedade.










 
 


 

Mudam as leis, muda a visão da infância



A exposição no MoMA contextualiza o cenário que abrigou as mudanças gradativas, pontuando a linha do tempo do último século através da memorabilia de brinquedos e brincadeiras resgatados em imagens, textos breves e objetos. Estão em cena as artes plásticas, a educação e as ações políticas. Há 100 anos, nos Estados Unidos, o trabalho do sociólogo e pioneiro do fotojornalismo Lewis Wickes Hine (1874-1940), que fez séries de fotos para denunciar as condições de escravidão a que era submetida a mão-de-obra infantil no campo e nas fábricas, levou a mudanças nas leis trabalhistas.

Na Europa, Ellen Key e outros pioneiros rompem tabus sobre a infância e a condição feminina, denunciando situações inadequadas ou aviltantes. Ao declarar que "as crianças são o futuro e nosso recurso mais valioso", Ellen Key atiçou a ira dos conservadores e dos empresários que exploravam a mão-de-obra infantil. Uma das primeiras mulheres a defender em público a necessidade da participação feminina na vida social e política, contestada em sua época e depois reconhecida por seu pioneirismo como líder feminista e teórica de referência nas áreas de família, infância, educação e ética, Ellen Key sustentava um ideário que ainda hoje parece avançado.













Em uma de suas teses, Ellen Key argumenta que a maternidade é tão crucial para a sociedade que o governo, e não os maridos, é que deveriam sustentar as mães e seus filhos. As ideias da militante pioneira do feminismo, das sufragistas e dos direitos da infância e da adolescência, que influenciaram leis e questões de escolaridade em diversos países e foram retomadas por outros importantes teóricos no decorrer do último século, estão registradas em seu livro de 1900 "O Século da Criança" e foram homenageadas por sua atualidade na exposição aberta no MoMA.

Otimista e visionária ao focar o século 20 como um período de descoberta intensificada sobre a importância crucial dos direitos e do bem-estar da infância, Ellen Key, suas ideias e seu livro de 1900 fornecem o suporte teórico para a retrospectiva apresentada em detalhes na mostra “O Século da Criança: Crescendo com Design, 1900-2000”. Com brinquedos, jogos, móveis pequenos, livros, áreas de lazer para que o público possa experimentar jogos e brincadeiras de outras épocas, o evento também apresenta bazar para venda de réplicas industriais de uma centena dos brinquedos e objetos reunidos na exposição. Um link para visita virtual e um catálogo dos brinquedos à venda estão disponíveis no site do MoMA.



Objetos para crianças


 
"Uma exposição que busca nos objetos antigos novas maneiras de pensar sobre o processo de design e criatividade", diz o subtítulo do catálogo que apresenta a mostra organizada pelo departamento de design e arquitetura do MoMA. No catálogo, disponível on-line, há fotografias de todos os objetos em exposição, com histórico e explicação sobre a operação de cada um deles, além dos ensaios produzidos pelos curadores Juliet Kinchin e Aidan O'Connor e pelos professores especialistas em história da educação Tanya Harrod, Medea Hoch, Francis Luca, Amy Ogata e Maria Paola Maino.

















Criança e design em 1900: no alto,
as miniaturas comercializadas pela
indústria automobilística desde o começo
do século 20, seguidas pelos objetos da
educação como atividade lúdica na
primeira infância na concepção do
pioneiro tcheco Ladislav Sutnar, designer,
arquiteto e especialista em eletrônica.

Abaixo, as figuras em 3D do
videogame Katamari Damacy,
criação da Namco Bandai Games





 




Em sua maioria, os mais de 500 objetos foram selecionados no acervo do próprio MoMA, mas também há itens garimpados em universidades, em outros museus e em instituições de pesquisa de 20 países. Há também os objetos e jogos que vêm de coleções industriais, projetos de engenharia e arquitetura escolar, playgrounds, creches, hospitais infantis, programas educacionais, equipamentos de segurança e mostruários em geral produzidos nas últimas décadas para o público infantil. Muitos dos itens nunca foram apresentados antes em uma exposição aberta ao público.

Entre estas raridades estão peças originais como uma casa de bonecas de 1912, criada pelo designer escocês Jessie Marion King em madeira pintada e couro, o clássico “lobo vermelho com rodas de bolinhas para puxar” criado como objeto para uma exposição de artes plásticas em 1980 por Keith Haring e depois transformado em brinquedo industrial de sucesso no mundo inteiro, assim como o “Rubik's Cube”, o cubo mágico original, inventado por Erno Rubik em 1974.













Criança e design em 1900: acima, o clássico
cubo mágico de 1974, seguido pela esfera de
Chuck Hoberman, de 1994, e pela cadeira em
miniatura criada em 1918 por Gerrit Rietveld.

Nas imagens abaixo, uma sala com as atividades
programadas pelo método Montessori, criado
pela italiana Maria Montessori; a educadora
acompanhada por seu filho, Mario, em 1950,
em visita a uma das escolas que fundou
(Casa dei Bambini); e um conjunto original do
material didático criado por ela e produzido
em escala industrial a partir de 1920










Pontuadas por frases e referências extraídas do livro de 1900 de Ellen Key, cada seção da exposição se propõe a percorrer determinados aspectos da trajetória da infância e do brinquedo pelas décadas no século passado, examinando visões individuais e coletivas em objetos produzidos exclusivamente para crianças. Dos mais antigos aos mais recentes, a exposição reúne desde materiais educativos com base nas teorias de pioneiros da moderna pedagogia como o alemão Friedrich Froebel (1782–1852), que defendia a influência crescente do movimento de jardim de infância desde o século 19, até registros dos experimentos do suíço Jean Piaget (1896-1980), que teorizou sobre a cognição humana a partir das observações sobre seus filhos e influenciou a educação de maneira profunda, e também tijolos de brinquedo e outros objetos feitos em argila e madeira pintados por crianças na escola de arte livre Francesco Randone em Roma, concebidos pela italiana Maria Montessori (1870–1952).

Médica, feminista e educadora pioneira que revolucionou as práticas de educação os modelos de escola na primeira metade do século 20, Montessori foi polêmica e influente em seu tempo e permaneceu influente para as gerações de teóricos e profissionais do campo pedagógico que vieram depois dela. As teses e práticas de Montessori destacam a ênfase mais na autoeducação do aluno do que no papel do professor como fonte de conhecimento, sempre defendendo que a educação é uma conquista da criança e que já nascemos com a capacidade de ensinar a nós mesmos, se nos forem dadas as condições.











O método educacional de Maria Montessori, contestado em sua época, por seu foco em um primeiro momento na educação de crianças pobres, com o tempo passou a ser usado por muitas escolas públicas e privadas do mundo inteiro. Seguindo a perspectiva desenvolvimentista de Montessori, o acervo reunido pela exposição do MoMA também traça o fio condutor da história dos brinquedos e brincadeiras no decorrer do último século.

Outra presença citada em destaque na exposição é o brasileiro Paulo Freire, mestre da educação como prática da liberdade. Patrono da Educação no Brasil, referência da educação no mundo inteiro por sua formulação teórica e sua prática na arte do ensino, com vários prêmios e condecorações internacionais, incluindo 35 títulos de Doutor Honoris Causa concedidos por importantes instituições, entre elas a Universidade de Bolonha, na Itália, o mais antigo centro de educação superior, que completa 1.000 anos de atividade, Paulo Freire é destacado por sua pedagogia crítica na defesa da concepção da criança como um aprendiz ativo e por sua visão da educação como um processo que sempre deve incentivar e nunca inibir o poder criativo.









Criança e design em 1900: acima, duas salas
da exposição no MoMA. Abaixo, uma gravura
original para quarto infantil, criada em 1903
por Mariska Undi; e os bonecos de madeira
da série sobre travessuras infantis, criação
da década de 1930 de Minka Podhájská











A pedagogia crítica de Paulo Freire dialoga com os ensinamentos de grandes pioneiros que permanecem como referência até nossos dias. Seja para Ellen Key, como para Froebel, Montessori e demais educadores citados, a criança não é um pretendente a adulto e, como tal, um ser incompleto. Desde seu nascimento, já é um ser humano integral, o que inverte o foco da sala de aula tradicional, centrada no professor. Não foi por acaso que as escolas que eles fundaram também evidenciam a prevalência do aluno em atividades lúdicas de educação pelos sentidos e pelo movimento.

 

Formas e cores de vanguarda



Observando a linha do tempo construída pelos objetos manufaturados e suas réplicas em escala industrial, transparece uma evolução que reflete mudanças nos métodos de ensino e, a partir das primeiras décadas do século 20, aproximação com as formas e cores das experimentações artísticas dos movimentos de vanguarda. Esta aproximação também foi percebida em sua época por outros pensadores, entre eles Walter Benjamin (1892–1940) e Johan Huizinga (1872–1945), apreciadores do trabalho de Ellen Key e também citados pelos organizadores da exposição no MoMA. 













Acima, o clássico ônibus escolar, item da
extensa lista de séries Playmobil, seguido pelo
módulo de construção articulada Zoob, criada
por Michael Grey em 1977, e a mola maluca
em metal ou em plástico transparente, criada
em 1943 pelo casal Richard e Betty James.

Abaixo, amostras do acervo na exposição
do Moma, seguida pelo "módulo para montar"
que Friedrich Froebel desenvolveu em 1837,
seguido pela “cadeira infantil” de 1935, de
Alvar Aalto, pela “lousa mágica” que
André Cassagnes lançou em 1960, e pelos
blocos universais da Lego, que começaram
a ser produzidos em escala industrial na
Dinamarca após a Segunda Guerra, em 1949








 
 
Benjamin é referenciado pela curadoria e pelos ensaístas convidados por seus escritos sobre criança, juventude e educação, “Über Kinder, Jugend und Erziehung”, publicado no Brasil em coletânea intitulada “Reflexões sobre a criança, o brinquedo e a educação” (Duas Cidades/Editora 34, 2002). Johan Huizinga é lembrado por sua tese publicada pela primeira vez em 1938 e desde então elevada à categoria de item obrigatório nas pesquisas sobre jogos, brincadeiras e elementos lúdicos na cultura contemporânea: “Homo Ludens”, publicado no Brasil em 1991 pela Editora Perspectiva.

A exposição “O Século da Criança” em Nova York inclui, em seu acervo de surpresas, livros infantis coletados por Alfred H. Barr em uma viagem na década de 1920 à União Soviética, antes de ser nomeado diretor-fundador do MoMA. Há ainda os objetos mais familiares tais como blocos de Lego, variações de peças de plástico para montar, miniaturas de carros e eletrodomésticos, bonecas e bonecos. Também estão no acervo a "lousa mágica", que André Cassagnes lançou em 1960, a "mola maluca", em metal ou em plástico transparente, criada em 1943 pelo casal Richard e Betty James, e outros objetos simples que ainda permanecem à venda nas gôndolas de lojas de brinquedos. O que não falta, entre os objetos em exposição, são as muitas peças assinadas por designers e arquitetos famosos.









 








Entre os objetos curiosos e valiosos, há os exóticos e as novidades da época que sobreviveram e ainda se mantêm no gosto popular: o mobiliário de Alvar Aalto, uma cadeira de Charles Eames e Eero Saarinen, carteiras escolares por Arne Jacobsen, o posto de combustíveis de Jean Prouvé, equipamentos para playgrounds de Isamu Noguchi, uma mesa de vidro projetada por Gio Ponti, miniaturas estilizadas e objetos de decoração de Ray Eames.

Há também os projetos originais de Aleksandr Rodchenko para mobiliário e enfeites no quarto e na sala da menina, que também impressionam pela atualidade, e até bonecos de super-herois, cartilhas de alfabetização, livros para colorir, fotografias e ilustrações que há décadas são estampas clássicas de capas para cadernos. Na seção “mundo animal” há réplicas de tamanhos e espécies diversos, em escala ampliada ou reduzida, em formato realista ou em variações imaginárias, incluindo os bichos infláveis de 1972 de Libuse Niclov e até os Muppets e os Gremlins, para citar apenas alguns.



Enigmas e possibilidades espontâneas



Entre os 500 brinquedos em exposição, há aqueles objetos que surgem como enigmas, assim como há outros que na forma e na aparência já sugerem inequívocas possibilidades de brincadeiras espontâneas. Com o contexto original de cada objeto listado em breves textos de referência, extraídos da obra pioneira de Ellen Key e de seus discípulos e seguidores pelas décadas seguintes, a exposição surpreende quando revela que muitas das peças e brincadeiras reunidas foram desenvolvidas, sob encomenda exclusiva, para serem usadas como suporte de propostas teóricas e de movimentos educacionais que estiveram em voga em determinado momento do século 20.






 



Duas referências à década de 1960:
o robô articulado feito em metal,
lançado para promover o seriado de TV
Perdidos no Espaço, e o cartaz pacifista
assinado por Schneider que avisa:

A guerra não é saudável nem para as
crianças nem para os outros seres vivos

Abaixo, amostras do acervo na exposição
do Moma e uma ilustração criada por
Arthur Rackham para uma rara edição de 1917
dos contos de fadas dos Irmãos Grimm










Ao reunir imagens e objetos do cotidiano infantil do tempo de nossos pais e avós, a mostra do MoMA interpreta o passado recente, resgata raridades que estavam esquecidas e ilumina o jogo e a brincadeira como elementos fundamentais da cultura humana, direcionados tanto ao desenvolvimento de habilidades motoras, intelectuais e interacionais, como à simples presença material na experiência e na organização de programas recreativos dos mais variados.

Há também um setor da exposição no MoMA que reserva um espaço de destaque para o caso especialíssimo da escola Bauhaus, reunindo peças de brincar inventadas por seus alunos e professores de 1919 a 1933 que ganhariam o status de brinquedos universais, como os moldes para montar com figuras geométricas coloridas ou os blocos de madeira que imitam paredes, portas, janelas e telhados da construção civil.

Mas o retorno ao acervo lúdico da escola Bauhaus não é uma exclusividade da exposição em Nova York. Amostras de brinquedos e brincadeiras que fornecem as coordenadas a todo um programa de ensino também estão na grande retrospectiva sobre a escola Bauhaus montada em um dos maiores espaços de arte da Europa, o Barbican Centre, em Londres, até 12 de agosto. “Bauhaus: Art as Life” é uma das mais importantes mostras já dedicadas à história dos intensos 14 anos de duração da célebre escola de arte e design alemã e ao seu estilo que reunia brincadeira e proposta pedagógica. Curiosamente, várias peças e objetos didáticos reunidos na retrospectiva em Londres também são destaque no evento promovido pelo MoMA, em Nova York.









 


Projetos de uso didático e recreativo saídos
das oficinas e salas de aula da escola Bauhaus
estão presentes simultaneamente no MoMA
e na retrospectiva em Londres: acima,
a partir do alto, pião, brinquedo que foi

desenvolvido por Ludwig Hirschfeld-Mack
 entre 1919 e 1933 para estudos de geometria;
e os blocos para construção de prédios
criados em 1924 para uso nas aulas de
física por Alma Siedhoff-Busche.

Abaixo, um clássico jogo de tabuleiro
produzido na Itália, na década de 1940,
criação de autor não identificado,
que fez sucesso no mundo inteiro e gerou
muitas variações em cópias e similares
ainda comercializados na atualidade








 
Brincadeiras da Bauhaus



Na seleção há obras de Wasily Kandinsky, Marcel Breuer, Gunta Stölzl e Paul Klee, entre outros mestres da história da arte no século 20 que aparecem como professores nos quadros da escola Bauhaus. Comparar o trabalho dos mestres e as peças dos estudantes desenvolvidas a partir dos originais pode oferecer um amplo panorama do “espírito” que regia cada lição em sala de aula, empreendida pela Bauhaus, entre experiências pedagógicas lúdicas e com ênfase na criatividade.

Palavra cuja tradução é “casa para construir”, “Bauhaus” foi escolhido em 1919 como nome para a escola de arte que se tornaria a mais famosa e mais revolucionária da história. Fundada pelo arquiteto Walter Gropius, em Weimar, na Alemanha, a partir do ideário socialista pós-revolução russa de 1917, a Escola Bauhaus teve, no período entre 1919 e 1933 e nos anos e décadas seguintes, uma influência marcante nas gerações de artistas do modernismo e alcançou também a arquitetura, o design de interiores, o design industrial, a moda e as artes gráficas, além de gerar uma safra muito particular de "brinquedos educativos". 



















Criança e design em 1900. Acima, cartaz da
mostra sobre a escola Bauhaus em Londres,
seguido de duas peças em exposição:
1) fotografia da década de 1920 da garota
usando o mobiliário escolar criado por
Marcel Breuer; 2) a professora Ise,
esposa de Walter Gropius, que fundou a
Escola Bauhaus em 1919, faz pose, em 1925,
usando máscara de robô e sentada em
uma cadeira tubular criada por Breuer,
que também foi professor da Bauhaus;
3) Erich Dieckmann, professor da Bauhaus,
e a cadeira para um repouso confortável,
projeto desenvolvido por ele em 1931.

Abaixo, Josef Albers e Wassily Kandinsky,
artistas e professores da Bauhaus, em 1933,
na época do fechamento da escola pelos
nazistas; e Walter Gropius comemorando
seu aniversário de 80 anos, em 1963,
cercado por alunas e amigos. Também
abaixo, uma coleção de meias-calças em
padrões geométricos, peças de vestuário
criadas na década de 1920 por alunos da
Bauhaus com ousadia futurista; o célebre
berço criado na escola Bauhaus por Peter Keler,
uma peça que introduziu mudanças radicais no
mobiliário doméstico; e uma planilha de projeto
em design industrial desenhada na década
de 1920 por Kandinsky









 
A retrospectiva em Londres reúne cerca de 400 trabalhos criados na Escola Bauhaus, incluindo brinquedos, móveis, filmes, fotografias, projetos e objetos dos mais variados que capturam a essência lúdica da escola alemã. Há também os convites de festas, as fantasias, os presentes feitos a mão e as fotografias íntimas de professores e estudantes que mostram muito da criatividade que imperava na escola e que faria história como meta de excelência para o aprendizado no século seguinte.

Aprendidos desde a primeira infância em todas as culturas e latitudes do planeta, o brinquedo e o brincar, enumerados em perspectiva histórica em seu contexto de manufatura ou de produto em escala industrial, seja no acervo reunido pelo MoMA e na retrospectiva da Bauhaus, seja nos detalhes da vida cotidiana, podem levar o observador a perceber como tanto a guerra como os esportes, as artes, as ciências, a filosofia e o design industrial são construídos pelo instinto do jogo e da competição.

Assim como a memória afetiva de cada um de nós, a linguagem, o mito, o sagrado e também a rotina da vida cotidiana com nossos objetos utilitários são marcados desde o início pelo jogo, que ainda está presente na essência das principais atividades da cultura e dos rituais nos sociedades modernas e contemporâneas. Daí sua importância: para desencadear nossa percepção sobre todo o universo de elementos simbólicos que nos cercam e para reforçar mentalidades que possam garantir a crianças de todas as idades e de todas as classes sociais, do mundo inteiro, a plenitude da infância.


por José Antônio Orlando.


Como citar:


ORLANDO, José Antônio. Criança e design em 1900. In: Blog Semióticas, 31 de julho de 2012. Disponível no link http://semioticas1.blogspot.com/2012/07/crianca-e-design.html (acessado em .../.../…).



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