Mostrando postagens com marcador prêmio camões. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador prêmio camões. Mostrar todas as postagens

30 de maio de 2016

Camões para Raduan Nassar










Rico só é o homem que aprendeu, piedoso e humilde, a conviver
com o tempo, aproximando-se dele com ternura, não contrariando
suas disposições, não se rebelando contra o seu curso, não irritando
sua corrente, estando aberto para o seu fluxo, brindando-o antes
com sabedoria para receber dele os favores e não a sua ira.
Raduan Nassar em “Lavoura Arcaica”.



Foi uma premiação por unanimidade do júri: Raduan Nassar, 80 anos, venceu hoje o Prêmio Camões 2016. O escritor, que é filho de imigrantes libaneses e nasceu na cidade paulista de Pindorama, é o 12° brasileiro a receber o prêmio – considerado a mais importante distinção em literatura concedida a autores de língua portuguesa. A premiação surpreende ainda mais quando se sabe que o vencedor Raduan Nassar já anunciou em 1984 que havia abandonado a literatura, evita entrevistas, recusou convites para participar de eventos internacionais importantes (como a Feira do Livro de Frankfurt de 2013, que teve o Brasil como homenageado), ignorou cerimônias de honrarias oficiais do Ministério da Cultura dos governos de FHC e de Lula, e tem uma trajetória de apenas três livros publicados: os romances “Lavoura Arcaica” (1975) e “Um Copo de Cólera” (1978) e o livro de contos “Menina a Caminho” (1994).

Os três livros alcançaram sucesso a partir do lançamento e receberam as principais premiações do Brasil: “Lavoura Arcaica” recebeu em 1976 o Prêmio Coelho Neto da Academia Brasileira de Letras (categoria Romance), o Prêmio Jabuti (categoria Revelação de Autor) e o Prêmio APCA, da Associação Paulista dos Críticos de Arte (menção honrosa, categoria Revelação de Autor); “Um Copo de Cólera” recebeu o Prêmio APCA na categoria Melhor Ficção em 1978; e “Menina a Caminho” recebeu o Prêmio Jabuti em 1998 na categoria Contos e Cronicas. Os três livros também foram traduzidos a partir da década de 1980 para publicação em inglês, espanhol, alemão, italiano, croata e francês, com o lançamento de "Lavoura Arcaica" e "Um Copo de Cólera" em um só volume, em 1984, pela prestigida Editora Gallimard.

A popularidade de Raduan Nassar aumentou com o sucesso de público e crítica para a adaptação dos livros para o cinema: “Um Copo de Cólera” virou filme em 1999, com direção de Aluizio Abranches e roteiro de Abranches e Flávio Tambellini; “Lavoura Arcaica” teve direção de Luiz Fernando Carvalho em 2001, com roteiro escrito por Carvalho em colaboração com o próprio Raduan Nassar. Um Copo de Cólera”, com o casal de protagonistas vivido por Júlia Lemmertz e Alexandre Borges, recebeu seis indicações, incluindo a de Melhor Filme, no Grande Prêmio Brasil de Cinema Brasileiro no ano 2000. “Lavoura Arcaica”, que tem no elenco da saga familiar Selton Mello, Raul Cortez, Juliana Carneiro da Cunha e Simone Spoladore, entre outros, foi premiado na Mostra de Cinema de São Paulo e nos festivais de Brasília, Montreal, Cartagena, Havana, Buenos Aires e Guadalajara, vencendo também o Grande Prêmio Brasil de Cinema Brasileiro do ano 2002 nas categorias de Melhor Atriz (Juliana Carneiro da Cunha) e Melhor Fotografia.












Camões para Raduan Nassar: no alto
e acima, o escritor durante o encontro
com a presidenta Dilma Rousseff e
lideranças de movimentos populares na
resistência contra o golpe de estado,
no dia 31 de março de 2016, no
Palácio do Planalto, em Brasília,
fotografado por Antonio Cruz. Também
acima, Raduan recebe o ex-presidente
Lula e Eduardo Suplicy no campus da
Universidade Federal de São Carlos,
UFSCar, em fotos de Ricardo Stuckert.
Em 2011 Raduan doou sua fazenda no
interior de São Paulo ao governo federal,
que vinculou a doação à UFSCar para
a implantação de um campus com
ênfase na agricultura sustentável.
Abaixo, Raduan em seu apartamento
em São Paulo, na Vila Madalena,
fotografado por Eduardo Knapp
e as capas originais de seus livros



                      
 




 





Força poética da prosa



Antes de ser anunciado como vencedor do Prêmio Camões 2016, Raduan Nassar também foi notícia recentemente como um dos finalistas do Prêmio Man Booker Internacional – que em maio anunciou como vencedora a escritora sul-coreana Han Kang. No informe que anunciou o vencedor, o júri e a organização do 28º Prêmio Camões justificam a escolha pela “extraordinária qualidade da linguagem” e “força poética da prosa” de Raduan Nassar, comparando o escritor a nomes consagrados da literatura brasileira como Clarice Lispector e Guimarães Rosa.

O informe do júri também declara que “através da ficção o autor revela, no universo da sua obra, a complexidade das relações humanas em planos dificilmente acessíveis a outros modos do discurso” – acrescentando que “muitas vezes essa revelação é agreste e incômoda, e não é raro que aborde temas considerados tabu”.






Camões para Raduan Nassar: acima,
Júlia Lemmertz e Alexandre Borges em
cena de Um Copo de Cólera, filme
de 1999 com direção de Aluizio
Abranches. Abaixo, Juliana Cordeiro
da Cunha e Selton Mello em
Lavoura Arcaica, filme de 2001
dirigido por Luiz Fernando Carvalho








O burburinho em jogo na revelação “agreste e incômoda”, que o júri do Prêmio Camões ressalta na literatura de Raduan Nassar, também se expressa em sua trajetória autobiográfica de projetos interrompidos e de alguns cursos superiores não concluídos. Depois de publicar os dois romances, o escritor decidiu pelo silêncio em relação às propostas de noites de autógrafos, debates, assédio da imprensa. Jamais admitiu autografar suas obras em festas de lançamento e, a partir de meados da década de 1980, passou a viver recluso em sua fazenda na região de Buri, interior de São Paulo.



Inconstante e fascinante



Somente recentemente Raduan Nassar rompeu esse isolamento e começou a aparecer em público, mas sempre com escassas palavras. Em 2014, às vésperas da eleição presidencial, declarou seu apoio à candidatura de Dilma Rousseff (PT) e condenou o apoio da família de Miguel Arraes e de Eduardo Campos à candidatura Aécio Neves (PSDB). Antes, em 2012, havia doado a fazenda Lago do Sino, propriedade de sua família com 643 hectares em Buri, para que o governo Dilma instalasse um campus da Universidade Federal de São Carlos, inaugurado em março de 2014. Outra exceção foi em 31 de março de 2016, quando causou alvoroço ao surgir em um evento no Palácio do Planalto para discursar a favor da presidenta Dilma, contra o golpe que estava sendo armado e em defesa da Democracia.

Os que tentam promover a saída de Dilma arrogam-se hoje, sem pudor, como detentores da ética, mas serão execrados amanhã”, afirmou, em discurso transmitido ao vivo pela Internet, diante da presidenta e da plateia de artistas e lideranças culturais, sob aplausos incondicionais. Mesmo que a literatura de Raduan Nassar seja, há décadas, aclamada de forma francamente consensual, esta sua recente intervenção em defesa de Dilma e pela Democracia no Brasil traz à sua escolha para o Prêmio Camões uma inevitável dimensão política de repercussão internacional.






Camões para Raduan Nassar:
acima e abaixo, o escritor em
novembro de 2015 fotografado
por Eduardo Simões













Abandonei o curso científico e pulei para o clássico, abandonei um curso de letras na universidade, o curso de direito no último ano, a empresa familiar assim que meu pai faleceu”, declarou Raduan Nassar em uma das raras entrevistas, publicada em julho de 2012 pela Revista Piauí. “Abandonei ainda uma criação de coelhos, o jornalismo e outras coisas mais. Tudo somado, só levei a pecha de inconstante. Por que só quando abandonei a literatura eu teria me transformado em personagem fascinante?”

Em outra rara entrevista, publicada em novembro de 2015 pelo Blog do IMS – Instituto Moreira Salles, que também dedicou a Raduan Nassar, em setembro de 1996, uma edição completa em livro do inventário de fortuna crítica “Cadernos de Literatura Brasileira” – o escritor retorna à mesma dúvida que paira sobre muitos de seus leitores. Quando a equipe do IMS pergunta sobre o que o levou a dedicar-se inteiramente à literatura numa época, renunciando a tudo em nome dela, e depois parar de escrever, Raduan Nassar responde: “Foi a paixão pela literatura, que certamente tem a ver com uma história pessoal. Como começa essa paixão e por que acaba, não sei.”











A resposta para a questão formulada pelo próprio escritor supõe complexidades e complexidades, por certo intangíveis – conforme apontam as reflexões que o crítico literário José Castello também apresenta sobre Raduan Nassar e sua obra bissexta no ensaio “Atrás da Máscara”, publicado por Castello no livro “Inventário das Sombras” (Editora Record, 1999). Castello compara o escritor ao lendário Arthur Rimbaud, que abandonou no auge e muito jovem Paris e as glórias da literatura para viver do tráfico de escravos e de armas no continente africano.

Raduan Nassar não suportou ser um grande escritor e desistiu da literatura para criar galinhas. Trocou a criação estética, que é complexa e desregrada, pela mecânica suave da avicultura (...). O sucesso de seus dois primeiros livros”, argumenta Castello, “parece ter excedido em muito aquilo que Raduan esperava de si, e, ultrapassado pela própria obra, ele tomou a decisão de recuar. O sucesso, em seu caso, tornou-se uma carga: ele é aquele que não suporta vencer e, assim que a vitória se configura, precisa fracassar para se tornar menos infeliz.”



Densidade acima da extensão



O informe apresentado pelo júri do Prêmio Camões 2016 também destaca que a literatura de Raduan Nassar trabalha o idioma de forma olímpica e poética ao tratar das relações familiares e dos afetos e ao recontar, de forma sutil, a trajetória da imigração e a tensão (social, cultural, emocional) entre o campo e a cidade, através de recursos como “o uso rigoroso de uma linguagem cuja plasticidade se imprime em diferentes registros discursivos verificáveis numa obra que privilegia a densidade acima da extensão”.












Brasil e Portugal estavam empatados com 11 vitórias no Prêmio Camões. Raduan Nassar trouxe o desempate como 12º brasileiro a vencer, depois de João Cabral de Melo Neto (1990), Rachel de Queiroz (1993), Jorge Amado (1994), Antonio Candido (1998), Autran Dourado (2000), Rubem Fonseca (2003), Lygia Fagundes Telles (2005), João Ubaldo Ribeiro (2008), Ferreira Gullar (2010), Dalton Trevisan (2013) e Alberto da Costa e Silva (2014). Também venceram a premiação, entre outros, os portuguêses José Saramago (1995), Miguel Torga (1989) e Sophia de Mello Breyner Andresen (1999), e os escritores moçambicanos Mia Couto (2013) e José Craveirinha (1991).

Raduan Nassar receberá um total de 100 mil euros (R$ 398,8 mil) com o Prêmio Camões, distinção que é entregue desde 1989 pelos governos de Portugal e do Brasil a autores que tenham contribuído para o enriquecimento do patrimônio literário e cultural da língua portuguesa. O júri da edição 2016 do prêmio foi formado por Paula Morão, professora da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa (Portugal); Pedro Mexia, escritor (Portugal); Flora Sussekind, escritora e professora da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Brasil); Sérgio Alcides do Amaral, escritor e professor da Universidade Federal de Minas Gerais (Brasil); Lourenço do Rosário, professor e Reitor da Universidade Politécnica de Maputo (Moçambique); e Inocência Mata, professora universitária da Faculdade de Letras de Lisboa e da Universidade de Macau (São Tomé e Príncipe).



por José Antônio Orlando.



Como citar:


ORLANDO, José Antônio. Camões para Raduan Nassar. In: Blog Semióticas, 30 de maio de 2016. Disponível no link http://semioticas1.blogspot.com/2016/05/camoes-para-raduan-nassar.html (acessado em .../.../...).







Para ler a entrevista de Raduan Nassar ao Blog do IMS,  clique aqui.


 













Ábum de Família: Raduan Nassar (o terceiro na primeira fila,
a partir da esquerda) em um baile de Carnaval na década de 1940
em sua cidade-natal, Pindorama, no interior de São Paulo





21 de maio de 2012

Trevisan vence Camões






Não me acho pessoa difícil, tanto assim que esbarro
diariamente comigo em todas as esquinas de Curitiba.

–– Dalton Trevisan em entrevista à   
revista Manchete, agosto de 1968.   

Há quem já aposte que nem dessa vez ele vai aparecer em público, para manter a mística da reclusão que vem sendo cultivada há mais de meio século. O mais misterioso dos escritores brasileiros, Dalton Trevisan, de 86 anos, foi anunciado hoje, em Lisboa, como vencedor da maior honraria da língua portuguesa, o Prêmio Camões. O júri, formado por dois nomes do Brasil, dois de Portugal e dois do continente africano (de Moçambique e de Angola), foi unânime na escolha do escritor brasileiro para esta 24ª edição do prêmio.

Contrariando aquele aforismo atribuído a Nelson Rodrigues, de que toda unanimidade é burra, a qualidade da literatura de Dalton Trevisan há um bom tempo tornou-se um valor unânime entre crítica e público no Brasil e em outros países em que seus livros tiveram tradução. Um dos jurados brasileiros, o escritor Silviano Santiago destacou na justificativa para o Prêmio Camões que a obra de Trevisan apresenta “uma contribuição extraordinária para a arte do conto, em particular para o enriquecimento de uma tradição que vem de Machado de Assis, no Brasil, de Edgar Allan Poe, nos EUA, e de Borges, na Argentina”.

Nascido em Curitiba, em 14 de junho de 1925, Dalton Trevisan estreou na carreira literária aos 20 anos, com “Sonata ao Luar” (1945), coletânea de contos ousada e de qualidade incomum, atestada há décadas pelos críticos mais exigentes, e que já revelava seu estilo ácido, conciso, que muitos definem como esquisito e também misterioso. Trevisan, o escritor recluso, avesso à imprensa, às fotografias e às frivolidades da indústria cultural que fazem a alegria de celebridades e de sub-celebridades, também é o que se pode chamar de escritor prolífico: publicou mais de 40 livros, a grande maioria de contos, e continua em plena atividade. Seu último livro de inéditos saiu em 2011, com o título “O Anão e a Ninfeta”.










Dalton Trevisan fotografado nas ruas
de Curitiba: reclusão do escritor vem
sendo cultivada há mais de meio século














Além de conquistar a distinção máxima do Prêmio Camões, Dalton Trevisan é daqueles escritores que colecionam premiações importantes, entre elas prêmios Jabuti (com "Novelas nada Exemplares", de 1959, "Cemitério de Elefantes", de 1964, e “Desgracida”, de 2010), o Prêmio Ministério da Cultura de 1996, pelo conjunto da obra, e o 1° Prêmio Portugal Telecom de Literatura Brasileira, em 2003, com o livro “Pico na Veia”. As premiações, contrariando uma prática cada vez mais comum, não provêm de lobby nem de estratégias massivas de marketing. Muito pelo contrário: trata-se de um escritor avesso a entrevistas e a qualquer forma de autopromoção.

A mística da reclusão é o que tem prevalecido. Tanto que, no comunicado oficial do Prêmio Camões, enviado hoje à imprensa, a organização divulgou que não havia conseguido contato com Dalton Trevisan nem para avisá-lo da homenagem e dos 100 mil euros (cerca de R$ 268 mil) a que ele tem direito pela distinção. Não é uma novidade, já que o escritor tem por regra nunca comparecer às cerimônias: para receber os prêmios, sempre enviou representantes. Alguns argumentam que a mística da reclusão teve início em 1959, quando ele foi premiado no Jabuti com "Novelas nada Exemplares" e não compareceu para receber o prêmio. Desde então ele não se deixa fotografar, não sai de Curitiba, não atende o telefone e comunica-se com o mundo apenas através de bilhetes que ele assina como "D. Trevis".














Geração de 45


Traduzido em diversas línguas, Dalton Trevisan conta com várias de suas obras adaptadas para teatro, cinema e TV. Entre as adaptações, pelo menos duas se destacam: uma inusitada série produzida recentemente pela TV da Hungria e o filme premiado no Brasil e em outros países “Guerra Conjugal” (1975), versão do cineasta Joaquim Pedro de Andrade para os contos reunidos no livro homônimo, publicado em 1969.

Uma constante na literatura de Dalton Trevisan é a cidade de Curitiba e seus habitantes, pessoas comuns que ele parece observar secretamente, nas caminhadas que faz pelas ruas e praças, sempre anônimo, avesso a entrevistas e a contatos ou conversas mesmo com seus leitores. Se alguém quer um livro autografado, que passe por um ritual repetido há décadas: o interessando deixa o livro na tradicional Livraria do Chain, no centro da cidade, com o nome anotado em um papel, que o autor concede o autógrafo sem problemas. Ao que se sabe, os amigos e interlocutores são poucos e também anônimos. Os amigos famosos, escritores, não estão mais vivos, entre eles Otto Lara Rezende, Rubem Braga, Vinicius de Moraes.

Dalton Trevisan começou a publicar em 1945, apesar de mais tarde ter renegado os seus dois livros de juventude: "Sonata ao Luar" e "Sete Anos de Pastor" (1948). No período entre a publicação dos primeiros livros, de 1946 a 1948, liderou o grupo que editou a revista de literatura "Joaquim", anunciada como "uma homenagem a todos os Joaquins do Brasil", com traduções da lavra de Trevisan para clássicos da literatura universal, entre eles contos e trechos de romances de Franz Kafka, James Joyce, Marcel Proust e Jean-Paul Sartre. 















Acima, a psicopatologia amorosa em
cenas de Guerra Conjugal. Abaixo, o cartaz
original do lançamento nos cinemas e um
cartaz promocional do filme censurado
pela ditadura militar: adaptação do livro
de Dalton Trevisan foi filmada por
Joaquim Pedro de Andrade em 1975,
com roteiro do próprio escritor e
participação de Lima Duarte,
Analu Prestes, Wilza Carla,
Carlos Gregório, Cristina Aché
e Jofre Soares no elenco











A revista "Joaquim" também marcou época porque trazia, a cada número, a colaboração de nomes importantes da cultura brasileira, incluindo ensaios inéditos, escritos sob encomenda para a revista, por nomes de peso como Antonio Candido, Tristão de Athayde e Otto Maria Carpeaux, entre outros, com ilustrações assinadas por artistas como Di Cavalcanti e Heitor dos Prazeres, além de contos e poemas até então inéditos – como o depois célebre "O Caso do Vestido", escrito por Carlos Drummond de Andrade.

A lista de livros de Dalton Trevisan é extensa e inclui títulos que vão de “Guia Histórico de Curitiba”, “Os Domingos” e “Crônicas da Província de Curitiba”, publicados em 1954 e escritos à moda dos panfletos populares e dos manuais que circulavam nas feiras, a exercícios de metalinguagem (“Capitu Sou Eu”, 2003) e crônicas policiais mais violentas, caso de “Morte na Praça” (1964), “Crimes da Paixão” (1978) e “Lincha Tarado” (1980), sempre no seu estilo inconfundível, breve, direto e extremamente realista.











Seu livro mais conhecido, “O Vampiro de Curitiba” (1965), muitas vezes tomado como codinome do autor, reúne as características mais marcantes do estilo Dalton Trevisan, minimalista e personalíssimo, pontuado de brevidade e crueldade, recheado de ironia e erotismo explícito que os conservadores consideram grosseiro e pornográfico. São textos que transformam tramas psicológicas em crônicas de costumes, todas construídas em linguagem das mais concisas que valoriza incidentes do cotidiano, incluindo crimes, perversões, paixões extremadas e afetos não correspondidos.

Misterioso até para seus poucos conhecidos e vizinhos em Curitiba, Dalton Trevisan trabalhou em uma fábrica de vidros, foi jornalista dedicado à cobertura de casos de polícia e crítico de cinema, além de ter exercido por vários anos a advocacia. Na historiografia da literatura brasileira, ele é apontado como um dos principais contistas do século 20 e expoente da chamada Geração de 45, que alguns também classificam como “pós-modernista”, na qual também se destacam Clarice Lispector e João Cabral de Melo Neto, entre outros. Trevisan publicou apenas um romance: “A Polaquinha”, em 1985.










Relações culturais


Além de Silviano Santiago, o júri desta edição do Prêmio Camões que premiou Dalton Trevisan foi formado pelos professores universitários e escritores Alcir Pécora (Unicamp – Brasil), Rosa Martelo (Faculdade de Letras do Porto) e Abel Barros Baptista (Faculdade de Ciências Sociais e Humanas de Lisboa), pela poeta e historiadora angolana Ana Paula Tavares e pelo também historiador moçambicano João Paulo Borges Coelho.

Criado em 1988 para destacar a importância da literatura e para intensificar e complementar as relações culturais entre o Brasil e Portugal, o Prêmio Camões também conta atualmente com a adesão da Comunidade de Países da Língua Portuguesa (CPLP). O português Miguel Torga foi o primeiro vencedor, em 1989. A maior polêmica veio em 2006, quando o angolano José Luandino Vieira, em protesto político, se recusou a receber o prêmio. José Saramago, o único Nobel de Literatura da língua portuguesa, também foi laureado pelo Prêmio Camões em 1995.








Dos 24 nomes já premiados com o Camões, incluindo Dalton Trevisan, dez são portugueses, dez são brasileiros, dois são angolanos e há um moçambicano e um cabo-verdiano. Os brasileiros premiados são João Cabral de Melo Neto (1990), Rachel de Queiroz (1993), Jorge Amado (1994), Antonio Cândido (1998), Autran Dourado (2000), Rubem Fonseca (2003), Lygia Fagundes Telles (2005), João Ubaldo Ribeiro (2008) e Ferreira Gullar (2010).


por José Antônio Orlando.


Como citar:

ORLANDO, José Antônio. Trevisan vence Camões. In: Blog Semióticas, 21 de maio de 2012. Disponível no link http://semioticas1.blogspot.com/2012/05/trevisan-vence-camoes.html (acessado em .../.../…).



Para comprar o livro Dalton Trevisan, Antologia Pessoal,  clique aqui.








Todos os vencedores do Prêmio Camões:



1) 1989: Miguel Torga (poeta e romancista português)

2) 1990: João Cabral de Melo Neto (poeta brasileiro)

3) 1991: José Craveirinha (poeta moçambicano)

4) 1992: Vergílio Ferreira (romancista português)

5) 1993: Rachel de Queiroz (romancista brasileira)

6) 1994: Jorge Amado (romancista brasileiro)

7) 1995: José Saramago (romancista português)

8) 1996: Eduardo Lourenço (crítico literário e ensaísta português)

9) 1997: Pepetela (romancista angolano)

10) 1998: Antonio Cândido (crítico literário e ensaísta brasileiro)

11) 1999: Sophia de Mello Breyner Andresen (poeta portuguesa)

12) 2000: Autran Dourado (romancista brasileiro)

13) 2001: Eugénio de Andrade (poeta português)

14) 2002: Maria Velho da Costa (romancista portuguesa)

15) 2003: Rubem Fonseca (romancista brasileiro)

16) 2004: Agustina Bessa Luís (romancista portuguesa)

17) 2005: Lygia Fagundes Telles (romancista brasileira)

18) 2006: José Luandino Vieira (escritor angolano; recusou o Prêmio Camões)

19) 2007: António Lobo Antunes (romancista português)

20) 2008: João Ubaldo Ribeiro (romancista brasileiro)

21) 2009: Armênio Vieira (escritor de Cabo Verde)

22) 2010: Ferreira Gullar (poeta brasileiro)

23) 2011: Manuel António Pina (poeta, cronista, dramaturgo e romancista português).

24) 2012: Dalton Trevisan (contista e cronista brasileiro).




Dalton Trevisan retratado no traço de Loredano      




Outras páginas de Semióticas