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25 de junho de 2012

Michael Jackson em BH









Passou batido pela imprensa mineira da época, mas alguns ainda guardam na memória o encanto do show naquela noite em setembro de 1974, anunciado como “o mais sensacional show de rock do mundo”. O extinto “Jornal de Minas” foi o único veículo impresso de Belo Horizonte a registrar o show de Michael Jackson e seus irmãos Jackie, Tito, Marlon e Jermaine, que formavam The Jackson Five, e que naquela turnê brasileira contavam com o reforço de um sexto integrante, o estreante Steve Randall Jackson.

A manchete do “Jornal de Minas” do dia 19 de setembro 1974 estampava: “A mais nova explosão dos jovens irmãos”. Na foto em preto e branco, publicada pelo jornal sem identificação do fotógrafo, Michael, que morreu há exatos três anos, em 2009, aos 50 anos, vítima de uma overdose de medicamentos, aparece em primeiro plano, muito jovem, sorrindo, de boné e com uma das mãos na cintura, acompanhado por quatro dos irmãos, todos ostentando trajes da última moda e suas cabeleiras “black power”.











Michael Jackson em BH: no alto e
acima, Michael em 1974, época da turnê
internacional que passou por Belo Horizonte,
com os irmãos na formação original do
The Jackson Five, Jackie, Tito, Marlon e
Jermaine. Abaixo, a família reunida em casa,
na Califórnia, em 1971, em reportagem
publicada pela revista Life








 




A reportagem começa anunciando que “ouvir um disco do The Jackson Five é uma coisa, mas presenciar o grupo atuando em shows é algo inteiramente diferente”. De acordo com o “Jornal de Minas”, o que motivava tanta expectativa pela apresentação de Michael Jackson e seus irmãos no Estádio Independência, no bairro Horto, era o “sucesso estrondoso e quase inacreditável” do jovem e talentoso Michael, que tinha alcançado a soma de mais de um milhão de cópias vendidas dos singles “Ben” e “Music and Me”.

O “Jornal de Minas” também informava que The Jackson Five chegaria a BH com uma comitiva de 18 integrantes e seis toneladas de aparelhagem importada pela firma Koski-Ellis-Stein da Inglaterra. Mas todo o destaque da reportagem foi para a potência vocal do jovem Michael Jackson, então com 16 anos. “Ele está longe de ser o menino de voz fina dos primeiros discos e primeiros shows”, apontava o texto, que apresentava Michael como “um dos maiores artistas do cenário do rock”. 













Michael Jackson no álbum de família:
no alto, aos dois anos, em 1960, e 
aos 16, em foto de 1974. Abaixo, em
foto promocional para a turnê internacional
de 1974 com o Jackson Five; e nos

bastidores do show e no palco em
Los Angeles, também em 1974.
Também abaixo, o material
promocional do grupo para a turnê
internacional de 1974



















Naquela semana, rivalizando com o show de The Jackson Five, a capital mineira também assistiria a uma única apresentação do rock de Rita Lee, que recentemente havia se separado de Os Mutantes e seguia carreira solo com a banda Tutti Frutti, no Teatro Francisco Nunes, e do samba de Martinho da Vila e banda, que se apresentaram no Teatro Marília. Também houve uma apresentação de astros da Jovem Guarda no Parque da Gameleira, mas sem mobilizar a esperada multidão de fãs, já que o show não contou com a participação do trio principal Roberto Carlos, Erasmo Carlos e Wanderléa.



Ingressos a Cr$ 25,00



Para assistir ao show de The Jackson Five no Independência, o ingresso custava Cr$ 25,00. Quem assistiu ao show diz que foi uma apresentação impecável, mas que as arquibancadas e o gramado do estádio não ficaram lotados, talvez porque tenha sido um dia de chuvas em BH. Entre os fãs históricos que presenciaram a passagem de Michael Jackson e seus irmãos pela capital mineira estão o produtor cultural Wilson Miranda e os veteranos do jornalismo Neusa Costa e Afonso de Souza, que dizem se lembrar muito bem daquele dia e do show sensacional que assistiram à noite no Estádio Independência.









              







O grupo desceu no Aeroporto da Pampulha e ficou hospedado no Brasilton Palace Hotel, em Contagem”, recorda Miranda, enquanto Afonso de Souza diz que jovens e crianças formaram a maior parte da plateia do grupo no show do Independência. No palco, Michael Jackson e seus irmãos apresentaram os sucessos que naquela época tocavam muito no rádio e nas trilhas sonoras das novelas de TV, entre eles "I'll Be There", "I Want You Back" e "ABC", com as canções da carreira solo de Michael, como “Ben” e “Music and Me”, em destaque e repetidas no final do show. Michael, todos se lembram, foi um show à parte, apresentando os novos passos da dança que ele inventou e que imitavam os movimentos de um robô. Anos depois, seriam os passos de dança marcantes na carreira solo de Michael, incluindo o célebre "moonwalk", sua coreografia mais famosa, em que ele se movia para trás enquanto parecia caminhar para frente.

Como eram os tempos da ditadura militar, além do aparato policial ser ostensivamente reforçado, a apresentação em Belo Horizonte teve encerramento rigorosamente antes das dez da noite. A turnê brasileira do The Jackson Five também incluiu, além de Belo Horizonte, shows em São Paulo, Porto Alegre, Rio de Janeiro e Brasília. Houve um único registro gravado na passagem de Michael Jackson e seus irmãos pelo Brasil. A gravação foi feita pela extinta TV Tupi, mas as imagens foram perdidas num dos incêndios que destruíram os arquivos da emissora. Restaram menos de dois minutos, preservados no acervo da Cinemateca Brasileira.





















No final da década de 1970, com o lançamento do álbum “Off The Wall”, Michael Jackson inicia a fase adulta da carreira e arranca elogios unânimes da crítica ao combinar as tradições do Rhythm and Blues de décadas passadas com o estilo de sucessos da gravadora Motown e a novidade da Disco Music. Compositor e arranjador desde os primeiros tempos do The Jackson Five, Michael passou a investir na experimentação musical.

E também começou a ganhar uma exposição cada vez maior na mídia, que culminaria em 1982, com “Thriller”, até hoje o disco mais vendido do mundo, com cerca de 100 milhões de cópias. Com “Thriller”, curta-metragem de 15 minutos escrito e dirigido por Michael em parceria com o cineasta John Landis, também começou a era de videoclipes na MTV, emissora que acabara de despontar no cenário internacional.

Duas décadas depois da primeira turnê brasileira, já aclamado com os títulos de “rei do pop”, “recordista das premiações do Grammy”, “dono do disco mais vendido da história”, “inventor do videoclipe”, “maior entertainer vivo” e líder de campanhas humanitárias importantes como USA For África (quando se juntou a 44 celebridades para gravar a canção “We Are The World”, que arrecadou US$ 200 milhões), Michael Jackson passou a ser protagonista de polêmicas que envolviam cirurgias plásticas a que teria se submetido para buscar um “branqueamento” e uma série de escândalos fomentadas pela imprensa mais sensacionalista com denúncias nunca comprovadas de abusos e pedofilia.











Trajetória de Michael Jackson:
acima, cartaz promocional e fotografia no
lançamento do álbum de 1979 Off the Wall.
Abaixo, Michael em cena de Thriller (1983),
o lendário videoclipe escrito e dirigido
em parceria com o cineasta John Landis
e apontado como o primeiro e o mais
importante filme da era dos videoclipes; e
Michael Jackson no Brasil, durante as
gravações com o cineasta Spike Lee na
favela carioca e no Pelourinho, em Salvador 

 






Michael Jackson retornaria duas vezes ao Brasil, em outubro de 1993 e em fevereiro de 1996. Em 1993, realizou dois shows no Estádio do Morumbi, em São Paulo, como parte da turnê do álbum “Dangerous”. Na confusão entre fãs e imprensa em frente ao hotel em que o artista estava hospedado, a comitiva de Michael atropelou dois adolescentes. Um deles, de 15 anos, teve sua perna quebrada e recebeu no hospital a visita de seu ídolo.

Em 1996, Michael e o diretor Spike Lee vieram ao Brasil para gravar cenas para o videoclipe da música "They Don't Care About Us". No Rio de Janeiro, as equipes do cantor e do diretor tiveram que negociar com os traficantes para gravar cenas na favela. Também foram gravadas cenas no Pelourinho, em Salvador, Bahia, onde Michael e Spike Lee contaram com a participação do Olodum. As imagens de Michael Jackson usando a camisa do grupo, não por acaso, fizeram com que o Olodum ficasse conhecido nos quatro cantos do mundo.


por José Antônio Orlando.



Como citar:


ORLANDO, José Antônio. Michael Jackson em BH. In: _____. Blog Semióticas, 25 de junho de 2012. Disponível no link http://semioticas1.blogspot.com/2012/06/michael-jackson-em-bh.html (acessado em .../.../...).













7 de junho de 2012

Relíquias de Marc Ferrez







Depois da existência da fotografia e do cinema, 

a reprodução desenhada ou pintada da verdade 

não interessa nem vai interessar a mais ninguém. 

–– Giacomo Balla (1871–1958).    



Boas e más notícias trouxeram de volta à mídia o nome de Marc Ferrez (1843-1923), um dos mais importantes fotógrafos brasileiros de todos os tempos. As boas notícias: uma parte considerável da obra completa de Ferrez foi adquirida pelo Instituto Moreira Salles (IMS), que lançou no Brasil e na França um catálogo impecável reunindo ensaios escritos por especialistas e uma coleção de 160 imagens primorosas do final do século 19 e do começo do século 20.

Além das fotografias reunidas na edição, há também um acervo de mais de 300 imagens originais de Ferrez, a maioria belas panorâmicas em negativos de grande formato (40cm X 110cm), que permanece em exposição itinerante nas sedes do IMS e em outros espaços no Brasil e no exterior. Parte do acervo também está aberta ao público no site que o IMS mantém na internet. Tanto o catálogo impresso como a mostra itinerante e as imagens disponíveis no site revelam a arte grandiosa de Ferrez, que criou no Brasil, antes de qualquer outro pioneiro da fotografia, uma linguagem que se tornaria universal e quase obrigatória em livros e reportagens de turismo e no formato de cartões postais.

Também há más notícias: o nome de Marc Ferrez frequentou as páginas policiais por conta de um grande roubo no acervo da Biblioteca Nacional, no Rio de Janeiro, registrado em 2005, quando desapareceram cerca de 150 de suas fotografias mais raras e celebradas. Um crime perfeito, que não deixou pistas, aparentemente realizado sob orientação de especialistas: além das séries valiosas de Ferrez, também furtaram fotografias e negativos originais de importantes e pioneiros fotógrafos do século 19, entre eles August Stahl (1828-1877), Guilherme Liebenau (1838-1900) e Benjamin Mulock (1829-1863).











Imagens de Marc Ferrez: o fotógrafo em
autorretrato datado de 1876, aos 33 anos.
No alto, registro da primeira locomotiva
(Trem de Ferro) e o grupo de engenheiros
responsáveis pelas obras da Estrada de
Ferro Rio-Minas, fotografados por Ferrez
no alto da Serra da Mantiqueira, no ano
de 1882. Acima, Ferrez registra a imperatriz
Teresa Cristina e Dom Pedro 2°  com a
princesa Isabel e a família reunida no
Paço Imperial do Rio de Janeiro, em 1887.
Abaixo, entrada da Baía de Guanabara no
Rio de Janeiro, vista de Niterói, em
fotografia de 1890 de Marc Ferrez






.



As boas e as más notícias colocaram em evidência o gênio de Marc Ferrez, nome fundamental da fotografia e do cinema brasileiro que, em seus 80 anos de vida, registrou todo o Brasil em belas panorâmicas e em retratos impressionantes, entre ilustres personalidades e anônimos que encontrou em cada região do país. Filho de um casal de escultores e gravadores franceses que vieram para o Brasil em 1816, com a Missão Artística Francesa, Ferrez foi comparado aos grandes pintores pelos intelectuais do Império e da primeira República, o que era a mais nobre das distinções, numa época em que o trabalho de fotografar estava longe de ser considerado uma arte. 



Arauto da Modernidade



O livro, na verdade um belo catálogo fotográfico intitulado “O Brasil de Marc Ferrez”, traz detalhada biografia, cronologia de seus principais trabalhos e ensaios de Françoise Reynaud, curadora do Museu Carnavalet, em Paris, e dos pesquisadores Maria Inez Turazzi, Pedro Karp Vasquez, Laurent Gervereau, Frank Stephan Kohl, Sérgio Burgi e Antônio Fernando De Franceschi, superintendente do IMS. Com a publicação e a exposição itinerante do acervo, foi a primeira vez que a obra de Marc Ferrez chegou ao público de forma abrangente.
 







Relíquias de Marc Ferrez: no alto,
visita do imperador Pedro 2°, no ano
de 1882, à inauguração do Túnel da
Mantiqueira, na primeira Estrada de Ferro
que interligava Rio de Janeiro e Minas
Gerais. Acima, a princesa Isabel
Cristina de Bragança em 1887.
Abaixo, vista da construção da
Estrada de Ferro Santos Jundiaí
pela São Paulo Railway em 1880






.





Nas fotografias de Marc Ferrez, o que mais surpreende, junto com sua demonstração de domínio da luz, é sua precisão na escolha do ponto de vista para ressaltar no enquadramento a qualidade estética das cenas registradas. São imagens comoventes, mesmo depois de todos os avanços tecnológicos da maquinaria fotográfica. Como destaca De Fraceschi em um dos ensaios do livro, abordando as singularidades da obra de Ferrez e sua influência sobre pintores célebres que se dedicaram às paisagens do Brasil:

O que interessa, cada vez mais, é compreender as relações passadas e presentes entre a fotografia e a pintura, sobretudo agora, quando as vanguardas contemporâneas parecem ter se desinteressado do mundo objetivo, deixando para a fotografia a inteira responsabilidade de se ocupar do real. Diante da obra monumental de Marc Ferrez, fica mais fácil compreender porque se atribui às suas belas imagens, produzidas na segunda metade do Oitocentos e nas primeiras décadas do século 20, os primeiros registros sobre a entrada do Brasil na Modernidade”.







          



No alto, Igreja de São Francisco de Assis 
em Ouro Preto, Minas Gerais, uma das obras-
primas do Barroco Mineiro e do mestre
Aleijadinho, retratada por Marc Ferrez
em 1880. Acima, Paul Ferrand fotografado
por Marc Ferrez na Serra do Itacolomy,
em Ouro Preto, no ano de 1886. Abaixo,
vista do Porto de Santos em 1880



         



Além do privilégio da nomeação como primeiro (e único) Fotógrafo da Marinha Imperial, Ferrez pôde percorrer o país como um dos principais nomes da Comissão Geológica do Império, a partir de 1875, fotografando atividades econômicas, a construção das principais estradas de ferro, as construções seculares da arquitetura barroca, as minas de ouro e pedras preciosas em Minas Gerais, as belas paisagens e os cenários desconhecidos das cidades, das florestas e das fazendas, seus costumes e personagens dos salões, das ruas, dos grotões.

Funcionário dos mais destacados nos quadros do Segundo Império, primeiro entre seus pares a visitar os confins do território nacional e registrá-los em fotografias e documentos cartoriais, Marc Ferrez também desenvolveu equipamentos próprios e introduziu experiências técnicas como as fotografias coloridas, por ele batizadas de autocromo, em aperfeiçoamento à invenção dos irmãos Lumière. Observar a evolução temporal de sua arte equivale a uma leitura da história do Brasil e da trajetória da fotografia, dos processos químicos mais primitivos aos avanços da tecnologia das câmeras, lentes e processos de revelação e reprodução.










Cartões postais de Marc Ferrez: no alto,
escravos no garimpo de ouro na região de
Diamantina, no interior de Minas Gerais,
em 1888. Acima, paisagem surpreendente
às margens do Rio São Francisco no
Nordeste do Brasil no ano de 1875. Abaixo,
a praia de Ipanema, Rio de Janeiro, 1895









Expedições do Império



Filho mais jovem do francês Zéphyrin Ferrez, contando com mais quatro irmãs e um irmão, ficou órfão de pai e mãe no Rio de Janeiro aos sete anos. Mandado para a França, onde estudou até a adolescência, retornou ao Brasil em 1859 e passou a trabalhar na Casa Leuzinger, uma papelaria e tipografia que tinha começado a trabalhar com uma seção dedicada à fotografia. Na Casa Leuzinger, Ferrez aprenderia as técnicas da arte de fotografar com o alemão Franz Keller (1835-1890). Aos 21 anos, em 1865, investiu tudo que tinha para abrir a firma Marc Ferrez & Cia., um estúdio fotográfico que o colocou entre os principais profissionais da corte.

Em 1875, a trajetória de Ferrez mudou radicalmente quando ele recebeu convite para integrar, como fotógrafo, a expedição chefiada pelo geólogo canadense Charles Frederick Hartt (1840-1878) e financiada pela Comissão Geológica do Império. Hartt faria história como autor da primeira obra rigorosamente científica sobre a geografia do Brasil – “Geology and Physical Geography of Brazil” (1870). A Expedição Hartt percorreu várias regiões do país e acendeu em Ferrez o gosto pela aventura de desbravar e registrar os confins de norte a sul do território nacional.













Relíquias de Marc Ferrez: no alto,
menino índio, fotografia de 1880, e
índia e seu filho fotografados no sul
da Bahia, em 1875, e índios botocudos
no interior de Mato Grosso (1876).
Acima, a primeira fotografia no interior
de uma mina de ouro, em Ouro Preto,
Minas Gerais, no ano de 1888. Abaixo,
fotografia da série de 1876 dedicada
aos índios botocudos; um grupo de
índios Bororo em fotografia de 1880;
e duas fotografias que registram aspectos
da vida indígena feitos na década de 1870
e apresentados no Museu Nacional em 1882
na Exposição Antropológica Brasileira




             



              












Depois da experiência com a Expedição Hartt, Ferrez passa a investir esforços nos estudos sobre geologia e geografia e, no ano de 1880, decide encomendar na Europa a confecção de uma máquina fotográfica por ele idealizada, para a execução de imagens panorâmicas em grandes dimensões. Daí aos cargos oficiais de maior importância no Império de Dom Pedro 2°, também entusiasta da fotografia, foi um passo.

O destaque como funcionário a serviço da nação continuaria nos primeiros tempos da República. Reconhecido no Brasil e no exterior como fotógrafo de paisagens, de obras públicas, de cartões postais e de retratos de políticos e personalidades que se tornariam célebres, entre eles os escritores Machado de Assis e Rui Barbosa, Ferrez realizaria a partir de 1903 uma de suas séries mais reproduzidas até a atualidade: a documentação completa das obras no Rio de Janeiro de instalação da Avenida Central, hoje Avenida Rio Branco, dos antigos edifícios às construções que foram erguidas no começo do século 20.





Relíquias de Marc Ferrez: no alto,
mata de Araucárias, no interior do Paraná,
em fotografia datada de 1884. Abaixo, grupo
de escravos e seus filhos reunidos em uma
fazenda de café na Serra da Mantiqueira,
Sul de Minas Gerais, no ano de 1885;
e escravos na colheita do café em uma
fazendo do Vale do Paraíba,
no Rio de Janeiro, em 1882





Qualidade estética e documento histórico



Marc Ferrez obteve em sua época as mais importantes condecorações pela excelência de seu trabalho fotográfico, tanto no Brasil como em outros países, em diversas instituições internacionais, entre elas os primeiros grandes prêmios em exposições nos EUA (Philadelfia, 1876) e na França (Paris, 1878), além de ter suas fotografias exibidas com destaque na Exposição Universal de 1900, em Paris. Várias de suas séries e álbuns também foram incorporadas desde o final do século 19 aos acervos da Société Géographique, sediada na França.

Como se não bastasse, o nome de Marc Ferrez ainda está ligado ao nascimento do cinema no Brasil: foi ele quem patrocinou a produção dos primeiros filmes nacionais e instalou em 1907, no Rio de Janeiro, o Cine Pathé, primeira sala de exibição permanente de espetáculos cinematográficos. Ainda nesse ano, a Casa Marc Ferrez & Filhos tomaria para si a distribuição da grande maioria dos filmes exibidos nas diversas salas de cinema que surgiram no Rio de Janeiro. 










O Rio Antigo segundo Marc Ferrez:
no alto, panorâmica da Ilha Fiscal na
Baía da Guanabara, em 1885. Acima, a
Avenida Central no Rio de Janeiro de 1910.
Abaixo, a estação da estrada de ferro da
Central do Brasil, Rio de Janeiro, 1899







 
A extraordinária qualidade estética, formal e documental da obra de Marc Ferrez na produção de retratos de personalidades, além das panorâmicas, tanto as urbanas quanto a paisagem natural que emoldura e envolve seus enquadramentos, foi preservada intacta por seus familiares no último século. Depois da morte do fotógrafo patriarca, o guardião de sua obra completa foi Gilberto Ferrez (1908-2000), neto de Marc e um dos mais destacados historiadores da iconografia brasileira e da obra dos viajantes estrangeiros no decorrer da história do Brasil.

Desde a morte de Gilberto, a guarda e a preservação dos arquivos dos Ferrez estão a cargo de sua filha, Helena Ferrez, que mantém há décadas a catalogação dos documentos da família. Os catálogos preservados contam com um extenso patrimônio em suportes variados, no qual estão incluídos desde as relíquias de Zéphyrin, pai de Marc e tataravô de Helena, às clássicas séries de ensaios em panorâmicas registradas em daguerreótipos e fotografias por Marc Ferrez.











Relíquias de Marc Ferrez: no alto,
amostra da experiência de Marc Ferrez
com o autocromo em cores, realizada em
1915 na Quinta da Boa Vista, no Rio de
Janeiro, seguida de duas imagens do Rio no
ano de 1875: o Pão de Açúcar, visto a partir
do bairro do Flamengo, e uma panorâmica da
entrada da Baía da Guanabara. Abaixo, o Largo
do Paço e a Rua Primeiro de Marco, no 
Rio de Janeiro, em 1890. No final da
página, mais duas imagens de Marc Ferrez em
1875: orla do Rio de Janeiro, com vista para o
Cais Pharoux e adjacências, e panorâmica que
registra os arrecifes e o porto do Recife, feita
por Ferrez no alto do Farol da Barra, tendo
em primeiro plano o Forte do Picão, que foi
construído em 1614 e batizado desde então
pelos holandeses como Castelo do Mar








Aos cuidados de Helena Ferrez também estão os acervos reunidos durante décadas por Gilberto Ferrez e todos os arquivos e filmes em negativo do filho de Marc e pai de Gilberto, Júlio Ferrez (1881-1945) – pioneiro que trouxe os primeiros equipamentos de cinema para o Brasil e realizou as primeiras filmagens em território brasileiro. Os catálogos dos Ferrez contam ainda com séries de correspondências, muitos álbuns da intimidade da família, cadernos de anotações das várias gerações, peças de artes plásticas e impressos em geral.

A maior parte deste imenso acervo, entretanto, não faz parte do material reunido no livro e na mostra “O Brasil de Marc Ferrez”. As imagens que constam do livro e da mostra foram selecionadas da coleção adquirida pelo IMS em 1998 – uma coleção que totaliza cerca de 5.500 fotografias diferentes, produzidas no século 19 e começo do século 20, incluindo mais de 4 mil negativos originais em superfícies de vidro.

Importante como resgate da importância capital do trabalho de Marc Ferrez, o livro, assim como a mostra e a manutenção do acervo pelo IMS, também consolidam e estendem para além do círculo de especialistas um trabalho que é um dos mais importantes legados visuais do Segundo Império e da República Velha. Compreendida no período que vai de 1865 a 1918, a perícia técnica e a grande arte de Marc Ferrez se mantêm, até os dias de hoje, como um dos registros fundamentais da fotografia no Brasil e no mundo.


por José Antônio Orlando.


Como citar:

ORLANDO, José Antônio. Relíquias de Marc Ferrez. In: Blog Semióticas, 7 de junho de 2012. Disponível no link http://semioticas1.blogspot.com/2012/06/reliquias-de-marc-ferrez.html (acessado em .../.../...).



 







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