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17 de janeiro de 2015

Vik Muniz no microscópio







A coisa mais bela que podemos experimentar é o mistério,
porque o mistério é a fonte de toda arte de toda ciência.

–– Albert Einstein (1879-1955).   


Fotografias em close-up de células, bactérias e outros organismos microscópicos formam paisagens e retratos na nova série de imagens criadas por Vicente José de Oliveira Muniz – o brasileiro que virou celebridade internacional com o nome artístico Vik Muniz. A série, resultado de uma parceria iniciada em 2014 entre o artista brasileiro e Tal Danino, especialista em bioengenharia do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (em inglês, MIT), foi apresentada em Nova York na abertura da campanha internacional de vacinação “The Art of Saving a Life” (A arte de salvar vidas), promovida pela Fundação Bill e Melinda Gates.

Batizada de “Colonies” (Colônias), a série de imagens de Vik Muniz e Tal Danino é, no mínimo, estranha à primeira vista, mas a força de cada uma das figuras aumenta quando o observador tem informações para identificar os micro-organismos que deram origem às composições. A definição mais adequada para as figuras geradas na parceria entre o brasileiro radicado nos EUA e o especialista do MIT talvez seja a expressão francesa “trompe-l'oeil” – enganar o olho – usada há séculos em pintura e em arquitetura para as técnicas que, com truques de perspectiva, criam ilusões de ótica para mostrar formas que não existem realmente. 











         




Vik Muniz no microscópio: no alto, o artista em
ação nos laboratórios do Instituto de Tecnologia
de Massachusetts (em inglês, MIT). Acima, duas
obras de 2014 o primeiro retrato de Vik Muniz
em composição de bactérias e um autorretrato de
Tal Danino feito com células extraídas do fígado
–  e Vik Muniz em Belo Horizonte, em agosto de
2009, na abertura da exposição retrospectiva sobre
sua trajetória, apresentada no Museu Inimá de
Paula. Abaixo, o artista em autorretratos de 2008




        


 
Para além da parceria recente em tecnologias avançadas com o bioengenheiro do MIT, a expressão “trompe-l'oeil” também serve como uma luva para identificar a arte que Vik Muniz vem produzindo desde a década de 1980, quando decidiu embarcar para tentar a sorte nos EUA. Sua originalidade nas composições com o uso de materiais insólitos (que vão de geleia de frutas, molho de tomate e chocolate a resíduos de plástico, metal, vidro e os mais variados objetos de lixo reciclável), organizados em novos formatos e depois fotografados, ganhou destaque a partir da segunda metade dos anos 1990, graças ao influente crítico de arte do jornal “The New York Times”, Charles Hagen.

Em um artigo publicado em 1996, Hagen apresentou com altos elogios o trabalho incomum do artista brasileiro. Tudo aconteceu por força do acaso: Hagen havia descoberto, em uma galeria de arte contemporânea até então pouco conhecida, em Nova York, o trabalho “Sugar Children” (Crianças de Açúcar) e ficou encantado com o que viu. Foi a sorte grande para Vik Muniz. Com a repercussão dos elogios, várias de suas obras foram adquiridas por museus importantes dos EUA – entre eles o Guggenheim e o Metropolitan Museum of Art. Depois do impulso inicial, Vik Muniz seguiu avançando nas últimas décadas por outras mídias, incluindo o cinema, e em diversas parcerias multidisciplinares.








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Outras possibilidades e sentidos



A notícia recente sobre a parceria do artista brasileiro com o especialista em biotecnologia do MIT me trouxe à memória o encontro e a longa conversa que tive com Vik Muniz em Belo Horizonte, em agosto de 2009. Ele estava na cidade para a abertura de uma retrospectiva de sua obra no Museu Inimá de Paula e fui entrevistá-lo para um jornal de BH. Visitar a exposição ao lado do artista foi uma descoberta e uma aula fascinante – com a sorte de ouvir dele explicações e avaliações sobre as 131 fotografias reunidas na exposição.

Naquela entrevista, perguntei a Vik Muniz se “trompe-l'oeil” seria a melhor definição para as imagens que ele produzia. Ele concordou totalmente e lembrou que as técnicas de “enganar o olhar” também vinham sendo muito usadas por grafiteiros de vários países para criar ilusões de ótica através de pinturas em ruas, muros e paredes. Caminhando a seu lado, acompanhei os comentários sobre seu processo criativo e sobre o que houve de mudanças do rabisco inicial à forma final das obras em exposição. Segundo Vik Muniz, as técnicas de composição em “trompe-l'oeil” foram surgindo aos poucos em sua trajetória.




 




Acima, imagens da série Sugar Children, criada
em 1996, que promoveu um maior destaque
para a arte de Vik Muniz na mídia dos EUA.

Abaixo: 1) uma imagem de Mass, 2, em arte e
fotografia de 1999; 2) as silhuetas microscópicas
de castelos esculpidas em grãos de areia
parceria de Vik Muniz com Marcelo Coelho;
e 3) imagens em cores da série Colonies,
criada em parceria com Tal Danino, bioengenheiro
do Massachusetts Institute of Technology, a partir
de células cancerígenas e bactérias que
formam uma espécie de padronagem
semelhante ao processo de estamparias 








No início, ele explicou, seu trabalho consistia basicamente na criação de esculturas em diversos suportes. Até que um dia ele decidiu começar a fotografar suas próprias obras e passou a identificar outras possibilidades e outros sentidos nas imagens. “Através das fotos fui percebendo que o sentido mudava muito a partir de cada mudança de perspectivas. Minha autocrítica me levou então a outras possibilidades e variações e continuei seguindo nesta trajetória”, explicou, recordando uma ou outra etapa da composição e da escolha de materiais e revelando traços e evoluções das obras mais antigas às mais recentes.



Castelos em grãos de areia



A parceria recente com o especialista em bioengenharia Tal Danino não é a primeira experiência de Vik Muniz nos domínios microscópicos. Desde 2010 ele vem investindo em pesquisas com outro especialista em tecnologia do MIT, Marcelo Coelho, também brasileiro radicado nos EUA, para desenvolver imagens em miniaturas que não podem ser percebidas pelo olho humano sem equipamentos especiais. O resultado, depois de quatro anos de experimentações, foi a criação minuciosa de silhuetas de castelos gravados em minúsculos grãos de areia.
























Criadas e reproduzidas em imagens ampliadas milhares de vezes, a partir de superfícies irregulares com menos de meio milímetro de comprimento, os castelos e seus elementos de composição provocaram comoção quando foram apresentadas ao publico pela primeira vez, no começo de 2014, pelo Museu de Arte de Tel Aviv, em Israel. Com as séries microscópicas, Vik Muniz fez um caminho inverso ao das instalações gigantescas que ele realizou na última década, sob encomenda para importantes museus dos EUA – com experiências em perspectiva sobre montagens de até 500 metros de comprimento que só poderiam ser vistas a partir do alto, em fotografias e filmagens registradas a bordo de aviões e helicópteros.

Mas o limite está nas miniaturas microscópicas ou nas instalações monumentais? “O céu é o limite”, responde Vik Muniz na página dedicada a seu trabalho no portal do MIT. "Gosto muito de trabalhar com cientistas porque sinto que talvez possamos nos encontrar no meio do caminho e criar uma obra de arte perfeita: uma combinação exata entre matéria e significado. Foi assim que nasceu o projeto 'Colonies', resultado da colaboração entre um artista e um cientista que queriam criar imagens a partir de seres vivos, minúsculos seres vivos".











No alto, Vik Muniz na instalação monumental Outlet,
Pictures of Earthworks, de 2005. Acima, recriação
do artista para a Medusa, personagem da mitologia
grega, com molho de tomate e espaguete,
na obra de 1999 batizada de Medusa Marinara.

Abaixo, o ex-presidente Lula fotografado em 
2002 e recriado por Vik Muniz com confetes de papel
picotados de páginas de revistas semanais; e o artista
fotografado durante a produção de dois documentários
que tiveram destaque em premiações de vários festivais
internacionais de cinema: Lixo Extraordinário, de
2010, e Atrás da Bola (This is not a Ball), de 2014









 





Do monumental ao microscópico



Entre o monumental e o microscópico, Vik Muniz também anuncia novos projetos em parcerias no MIT e no cinema, depois de suas duas primeiras experiências bem-sucedidas com longas-metragens que tiveram destaque em premiações internacionais – “Lixo Extraordinário” (“Waste Land”), de 2010, com direção de João Jardim, Lucy Walker e Karen Harley, documentário sobre sua experiência com catadores de lixo no aterro do Jardim Gramacho, em Duque de Caxias, Rio de Janeiro, que chegou a ser indicado ao Oscar e foi premiado como melhor filme no Festival de Sundance e no Festival de Berlim; e “Atrás da Bola” (“This is not a Ball”), de 2014, sua estreia na direção, registro de uma viagem por nove países para mostrar a presença e o significado do futebol em diferentes culturas.









Entre seus novos projetos, há ainda a proposta de um programa social que pode surpreender: a instalação de uma escola de arte e tecnologia voltada para crianças carentes da comunidade do Vidigal, no Rio de Janeiro. “Será uma escola de arte e tecnologia para crianças de 5 a 8 anos, totalmente gratuita”, ele explica. “Já compramos o terreno e fechamos parcerias com o MIT e com a Green School, uma escola holística de Bali. Será um consórcio para uma rede de educação criativa”. A escola no Vidigal deve começar a funcionar ainda em 2015.

Paulista de 1961, filho de uma telefonista e de um garçom profissional, Vik Muniz conquistou nas últimas décadas a condição de celebridade internacional e em 2010 foi classificado como um dos maiores expoentes da arte mundial no catálogo do MoMA, Museu de Arte Moderna de Nova York, "501 Great Artists: A Comprehensive Guide to the Giants of the Art World". Não é pouco. Além de Vik Muniz, somente outros dois brasileiros figuram na prestigiada lista: Hélio Oiticica (1937-1980) e Lygia Clark (1920-1988).


por José Antônio Orlando.



Como citar:


ORLANDO, José Antônio. Vik Muniz no microscópio. In: Blog Semióticas, 17 de janeiro de 2015. Disponível no link http://semioticas1.blogspot.com/2015/01/vik-muniz-no-microscopio.html (acessado em .../.../...).










Para visitar o site de  Vik Muniz no MIT,  clique aqui.










Acima, fotografias da instalação Passione:
lixo reciclado em obra que Vik Muniz criou
em 2010 para a vinheta de abertura da novela
da TV Globo. Abaixo, Arnaldo Antunes,
Marisa Monte e Carlinhos Brown em 2002,
fotografados e recriados em chocolate por
Vik Muniz para a capa do álbum Tribalistas








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