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27 de janeiro de 2012

Banalidade da corrupção







A história de todas as sociedades que existiram até
os nossos dias tem sido a história das lutas de classes.

Karl Marx, "Manifesto Comunista" (1848).   
  

A complexidade das questões que envolvem cotidianamente a corrupção e os corruptores está em discussão em dois livros surpreendentes e muito diferentes entre si. Um deles é “A Banalidade da Corrupção – Uma forma de governar o Brasil”, escrito pela professora Céli Regina Jardim Pinto, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. O outro foi publicado por um conhecido fotógrafo de moda e publicidade que é sempre lembrado por seus antológicos retratos de nudez das beldades da hora, há décadas, para a revista "Playboy", para editoriais de moda e para campanhas publicitárias: Bob Wolfenson, um artista da fotografia que sempre surpreende com investigações sobre novas possibilidades da imagem, considerado e aclamado por muitos como um dos principais fotógrafos da América Latina.

O trabalho mais recente de Bob Wolfenson reúne um acervo de 20 fotografias que impressionam, tão belas quanto incômodas. No livro "Apreensões" (editora Cosac Naify) o fotógrafo paulistano reúne novos ângulos de enquadramento para realidades tristíssimas e muito comuns aos olhos dos brasileiros. Os novos "modelos" de Wolfenson são animais e conjuntos de objetos confiscados pela polícia. Amontoados de metralhadoras e arsenais de munições do Rio de Janeiro e de São Paulo, gaiolas em quantidade e pássaros silvestres engaiolados, peles de onças e de répteis gigantescos do interior do Mato Grosso, macacos de espécies em extinção em jaulas minúsculas, centenas de máquinas caça-níqueis em um galpão de Belo Horizonte, serras elétricas e profusões de telefones celulares e aparelhos eletrônicos contrabandeados figuram nas fotografias que misturam denúncia e arte. 

São imagens que lembram as naturezas-mortas da composição secular dos grandes mestres das artes plásticas, mas que trazem em sua composição elementos que provocam surpresa, revolta, impacto: são imagens contundentes, nas quais o fotógrafo paulistano, que nasceu em 1954 e começou na carreira aos 16 anos na Editora Abril, deixa claro um fundamento central na arte de capturar imagens. Um fundamento que fez seu trabalho ser reconhecido internacionalmente, aclamado como um retratista de raro talento e um profissional destacado em vários gêneros da fotografia.








Banalidade da corrupção: no alto,
o fotógrafo Bob Wolfenson no
lançamento do livro Apreensões em
São Paulo. Abaixo, três beldades
em retratos célebres de Bob Wolfenson:
Malu Mader em 1987, Sonia Braga em
1988 e Gisele Bündchen em 2010.

Também acima e na sequência 
abaixo,
fotografias do acervo reunido 
no livro
publicado pela
Cosac Naify
























 



Como lembra o deputado e publicitário Carlos Nader, na apresentação ao livro, ao fotografar objetos e animais apreendidos pela polícia, Bob Wolfenson escancara um fundamento central da arte de capturar imagens. "Ele nos lembra que a própria fotografia é, em sua essência, também uma apreensão, uma captura. E quando nos coloca como espectadores, diante de uma dessas apreensões duplicadas, abre um estimulante jogo metalinguístico de reflexos. Apreendemos aquilo que ele apreendeu do que foi apreendido. Apreendemos exponencialmente", destaca Carlos Nader.

Nas palavras do próprio fotógrafo, o universo envolvido nessas imagens diz respeito a todos nós. "Mas elas não pretendem dar respostas, a não ser dividir uma certa apreensão", alerta Bob Wolfenson, em breve entrevista pelo telefone. O caminho percorrido para realizar essa espécie de inventário de uma certa tragédia brasileira foi longo e de difícil acesso – explica o fotógrafo, revelando que a ideia do trabalho surgiu em decorrência da infinidade e da frequência das apreensões policiais exibidas na imprensa.












Interdições de toda ordem


 
"Seria impossível ficar indiferente à presença acachapante desses fatos na vida de todos nós", destaca o fotógrafo. "No entanto, essas notícias acabam por se naturalizar, ficam banais, repetidas, e não nos chocam mais. O paradoxo do excesso de informação é exatamente este: quanto mais vemos, menos enxergamos. Tornamo-nos cegos de tanto vê-las".

Aula e demonstração de domínio técnico e composição para fotógrafos e profissionais das artes gráficas, as 48 páginas coloridas em papel duplo de "Apreensões", para além da aspereza do assunto, ainda reservam foco para aquilo que o pensador francês Roland Barthes classificou como "Punctum" – aquele emaranhado de impressões fortes, instantâneas e imprecisas que apenas as boas fotografias conseguem guardar e reproduzir. 















As dificuldades definiram a forma de cada uma das imagens, explica Bob Wolfenson. "Tarefa paralela foi negociar com as autoridades. No caminho deparei com juízes, policiais, fiscais e secretários de Estado que se mostraram muito colaborativos. Obviamente encontrei também interdições de toda ordem, justificáveis em face da gravidade do assunto. Lidar com os meandros desses salvos-condutos para chegar aos materiais apreendidos, na tentativa de que as imagens fossem vistas não como prova de algo, nem muito menos como denúncias veladas à inoperância ou elogios à eficácia do Estado, tudo isso foi outra aventura”.

Reconhecido como um dos principais fotógrafos em atividade no Brasil, Wolfenson também confessa seu aprendizado durante a produção e captura das imagens reunidas no livro “Apreensões”. “Durante o processo tive várias surpresas: a grande diversidade de formato das ampliações, por exemplo, não estava inicialmente prevista, mas acabou sendo constituinte do trabalho, além de pessoas e situações verdadeiramente incomuns. Ao ressignificar as apreensões através de fotografias de materiais apreendidos e ampliá-las em formatos e tamanhos pouco usuais para este assunto, acredito iluminar os aspectos mais obscuros e menos visíveis destes eventos", completa, com sabedoria. 






Corrupção não é exclusividade do Brasil




Os aspectos mais obscuros e menos visíveis da tão famigerada corrupção também movem as reflexões em outro livro digno de nota. "A corrupção não é exclusivamente um fenômeno brasileiro", aponta Céli Regina Jardim Pinto, autora de “A Banalidade da Corrupção – Uma forma de governar o Brasil”. No livro, publicado pela Editora UFMG, a professora aborda a complexidade de alguns gargalos da história recente que têm criado um território vasto para a emergência de atos ilícitos na vida pública e em significativas parcelas da elite brasileira.

Doutora em Ciência Política e professora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Céli Pinto aponta algumas das condições que propiciam a corrupção no Brasil e porque, em determinados contextos, a corrupção se tornou quase uma das formas de governar. “A corrupção é um fenômeno complexo, que existe em todas as sociedades: capitalistas, desenvolvidas, subdesenvolvidas, socialistas, democráticas, autoritárias, totalitárias. Portanto, a primeira observação importante que deve ser feita é que o problema da corrupção não é uma exclusividade da política brasileira”, alerta.


Confira, a seguir, alguns trechos da entrevista que fiz por telefone com a professora Céli Pinto e que foi publicada pelo jornal “Hoje em Dia” de Belo Horizonte.


Existe no Brasil uma cultura da corrupção?


Céli Pinto – A corrupção manifesta-se com formas e intensidade diferentes em cada sociedade. No caso do Brasil, vejo como uma das características centrais da corrupção a desvalorização da cidadania. Este foi um país em que as elites dominantes por longos períodos da história não precisaram construir o sentido de cidadania, não precisaram de um sentido de igualdade cidadã para governar. Daí que se criou no país uma cultura anti-cidadã, ou seja, uma busca pela diferença que permita a todos que têm algum tipo de poder (e não precisa ser muito) ter privilégios especiais e, o que é mais definidor, não cumprir a lei. Digo no livro que este é um objeto de desejo no país, não cumprir a lei, não ser pego e se achar importante por isto. Na minha opinião, esta é a questão central e a mais complicada de ser superada.










O que mais agrava a corrupção? A disputa de poder entre os partidos, os poderes político e econômico concentrados, as profundas desigualdades sociais ou a pouca ou nenhuma noção de seus direitos pela maioria da população brasileira?

Há dois tipos de corrupção. Primeiro, tem aquela que acontece dentro do Estado, e tem também aquela que acontece entre o setor privado da economia e o Estado. A primeira tem sempre lugar na mídia. Já a segunda, certamente a que envolve as maiores somas de recursos e grandes negócios, não tem, para a mídia, o charme da primeira. Em qualquer um destes tipos de corrupção a grande maioria da população brasileira fica de fora.

Mas em qualquer um dos casos, não é a forma como se faz política no Brasil que tem grande responsabilidade na promoção de atos de corrupção?

Sem dúvida nenhuma. As eleições são caríssimas e precisam ser financiadas com recursos privados ou com desvio de recursos públicos. Por outro lado, o capitalismo no Brasil teve um grande arranque durante o regime militar, quando se formaram grandes grupos econômicos que passaram a monopolizar importantes áreas da economia brasileira. Muitos destes grupos são atores influentes na economia, ainda hoje, e agem dentro de uma lógica muito longe do que se poderia chamar de lógica democrática.










Tem sido um lugar comum o comentário de certos analistas da política apontando que o Brasil nunca foi tão corrupto quanto é hoje. A senhora considera que isto é um fato ou aumentaram as instâncias de investigação?

É muito difícil afirmar com alguma segurança se a corrupção é maior hoje do que foi em governos anteriores. Houve muita corrupção durante o governo militar, por exemplo, mas naquela época era proibido denunciar ou admitir que ela existisse. E a imprensa não podia e nem queria, na maioria das vezes, denunciar. Atualmente, a Polícia Federal, o Ministério Público, entre outras instâncias, têm se comportado como agentes do Estado e não do governo de ocasião e isto tem sido fundamental e muito positivo.

Há quem avalie que há também a intenção explícita de denunciar o malfeito através de setores majoritários da imprensa...

A imprensa quando investiga está fazendo seu papel. Mas quando a imprensa parte para o denuncismo irresponsável e faz das denúncias um espetáculo, sem fundamento, está fazendo um triste papel.











Detalhes das ilustrações das duas capas:
Apreensões, livro de Bob Wolfenson
publicado pela Editora Cosac Naify, 
e A Banalidade da Corrupção,
de Céli Regina Jardim Pinto,
publicado pela Editora UFMG.

Abaixo, a pesquisadora Céli Pinto;
uma sequência de outras imagens da
exposição realizada por Bob Wolfenson
com as fotografias publicadas em seu
livro Apreensões; e o breve texto da
contracapa do livro de Céli Pinto








No livro “A Banalidade da Corrupção”, a senhora compara a corrupção nos vários níveis de governo (federal, estadual e municipal) com o tráfico de drogas, na medida em que não se pode avaliar o montante do tráfico, pois só temos conhecimento das negociatas que falharam. No entanto, o número de casos descobertos, investigados, julgados e condenados não deveria extirpar o quase “direito a ser corrupto”?

Acho que não... Não acredito que a corrupção acabará no Brasil colocando todos os corruptos na cadeia. Isto é uma ilusão. É como dizer que não sabemos votar, que se escolhermos pessoas de bem para os cargos de governo não haverá corrupção. Não existe nada de genético na corrupção. O corrupto não nasce corrupto, ele se torna corrupto. Portanto, temos de acabar com as condições de emergência da corrupção. Evidentemente que o efeito demonstração é fundamental. Quanto maior for o número de condenados pela corrupção, quanto menos impunidade houver, maior será a possibilidade da corrupção diminuir.


Há uma luz no fim do túnel para enfrentar o problema da corrupção no Brasil?

Certamente há luz no fim do túnel, sou muito otimista em relação ao Brasil. O país já tem uma formidável história de regime democrático de mais de 20 anos. Temos de aprimorar a democracia, mais do que aprimorar diria radicalizar a democracia. Estamos diminuindo as desigualdades sociais, temos que paralelamente diminuir a desigualdade de poder que há nesta sociedade. Quanto mais cidadãs e cidadãos participarem da política em todos os níveis, quanto mais abrangentes forem os temas discutidos publicamente, quanto mais a agenda pública for decidida a partir de discussões também públicas, quanto mais os partidos políticos deixarem de ser dirigidos por oligarquias, quanto mais democrática for a sociedade no sentido profundo da democratização da tomada de decisão, menos poderes terão as elites que dominam o país.


Mas conseguir isto no Brasil não parece ser uma tarefa fácil...

Não, não é mesmo. Você tem toda razão nessa ressalva, porque não é uma tarefa fácil de maneira nenhuma. Mas é possível e pode ser realizado muito mais rapidamente do que o atual quadro deixa transparecer. E me parece que este é o único caminho para enfrentar seriamente o problema da corrupção no Brasil, sem espetacularização, sem indignados de tarde de domingo.


por José Antônio Orlando.


Como citar:

ORLANDO, José Antônio. Banalidade da corrupção. In: Blog Semióticas, 27 de janeiro de 2012. Disponível no link http://semioticas1.blogspot.com/2012/01/banalidade-da-corrupcao.html (acessado em .../.../…).



















27 de dezembro de 2011

O conto da Privataria

















O Brasil será melhor quando o ímpeto investigativo
atingir a todos de maneira simétrica.

–– Vladimir Safatle.  


O acontecimento político mais explosivo da última década foi um livro escrito pelo jornalista Amaury Ribeiro Jr.. Resultado de mais de 12 anos de investigações, “A Privataria Tucana” (Geração Editorial) foi lançado no dia 9 de dezembro de 2011 e, depois de esgotar a primeira edição e as sucessivas reimpressões, já alcançou um recorde impressionante, segundo o editor Luiz Fernando Emediato: mais de 100 mil exemplares vendidos em apenas duas semanas, um feito raríssimas vezes alcançado no mercado editorial brasileiro. Mas "A Privataria Tucana" também impressiona porque provocou o silêncio mais constrangedor e cúmplice de que se tem notícia nos principais veículos de comunicação do Brasil.

O livro só aconteceu por causa da internet, das redes sociais e dos blogueiros independentes. Mas o importante é que conseguimos furar o bloqueio da mídia tradicional, boa parte dela comprometida com as autoridades denunciadas pelos documentos apresentados no livro”, admitiu Amaury, que entrevistei no dia 21 de dezembro, em Belo Horizonte, na redação do jornal “Hoje em Dia”, antes que ele embarcasse para uma série de debates e entrevistas agendados em São Paulo.

Enquanto Amaury concedia a entrevista, no mesmo horário, também no dia 21 de dezembro, o deputado Protógenes Queiroz (PCdoB-SP) protocolava na Mesa Diretora da Câmara dos Deputados um requerimento pedindo a abertura de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar as acusações feitas pelo livro. Para abrir uma CPI na Câmara são necessárias pelo menos 171 assinaturas. O requerimento do deputado superou este número mínimo e conseguiu em pouco tempo o apoio de 185 parlamentares. Segundo declarou à Agência Brasil o presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), a CPI deverá mesmo ser instalada no início de 2012 para esclarecer os fatos e ouvir os acusados.

A casa vai cair para muita gente poderosa com essa CPI”, aponta o autor do livro “A Privataria Tucana”. Amaury reconhece ainda que as centenas de documentos que apresenta no livro são apenas uma ponta do iceberg que envolve as várias “negociatas” das privatizações conduzidas no governo do ex-presidente Fernando Henrique, no período entre 1995 e 2002.






O trabalho investigativo e minucioso de Amaury enumera no livro a intrincada trama de lavagem de dinheiro e os principais envolvidos no processo. Também consegue mapear o esquema de corrupção e propinas montado em torno do político tucano José Serra, ex-ministro de FHC, ex-deputado, ex-senador, ex-governador e ex-prefeito de São Paulo e candidato duas vezes derrotado em eleições para a Presidência da República. 



Denúncias explosivas e sem respostas
 


São grandes negociatas que envolveram um valor incalculável de muitos milhões em corrupção e propina no processo de privatização de grandes empresas nacionais. Negociatas que ainda não foram nem investigadas nem punidas e muito menos divulgadas pela conivência dos grandes veículos de mídia. Foi o maior golpe da história do Brasil e atingiu os setores de telecomunicações, de energia e de mineração”, destaca Amaury Ribeiro Jr., que compara o grande escândalo revelado no livro "A Privataria Tucana" – também abafado na época das privatizações de Fernando Henrique pelos mesmos grandes veículos de mídia que agora boicotam sua divulgação nos noticiários – à queda de um grande avião com muitas autoridades entre os passageiros.

O livro traz denúncias explosivas, mas a CPI poderá ir mais a fundo para incriminar os envolvidos e propor punições, propor um ressarcimento ao patrimônio público do Brasil e um maior controle sobre a entrada de capital estrangeiro, mais controle sobre a operação de papéis na Bolsa de Valores e sobre a lavagem de dinheiro para que este grande escândalo não se repita nunca mais”, alerta.

Os denunciados por Amaury no esquema que operou bilhões de dólares durante as privatizações no governo Fernando Henrique vêm respondendo às acusações do livro com um silêncio implacável ou com ameaças de processos na Justiça – quando não definem de “lixo” o trabalho do jornalista, como fez o ex-governador Serra, pressionado pelos repórteres em um evento recente do PSDB realizado em São Paulo.






O jornalista Amaury Ribeiro Jr.,
repórter especial da Rede Record
e autor do dossiê transformado
no livro A Privataria Tucana:
"As privatizações do governo FHC
foram grandes negociatas que
envolveram bilhões de dólares
em corrupção. Nada disso foi
apurado e ninguém foi punido".
Abaixo, a contracapa do livro














Amaury reconhece que esta também era uma situação prevista por ele e pelo editor do livro, o também jornalista Luiz Fernando Emediato. “Todos os fatos que apresento no livro estão fundamentados em documentos oficiais, obtidos em juntas comerciais, em cartórios, no Ministério Público e nas várias instâncias da Justiça”, aponta Amaury, que já recebeu por três vezes o Prêmio Esso e outras quatro vezes o Prêmio Wladimir Herzog de Jornalismo. Também repórter especial da Rede Record, o autor de "A Privataria Tucana" faz questão de destacar que não tem qualquer filiação partidária.

Não tenho compromisso com nenhum partido político. Sou militante do jornalismo”, afirma, com orgulho. Por conta do sucesso extraordinário de vendas do livro e de seus prováveis desdobramento, na agenda do jornalista para 2012 já estão mais de 200 convites para o lançamento do livro em universidades e entidades sindicais, além de novos projetos que prometem muito mais polêmica em revelações impressionantes. Entre os projetos, outros livros já em fase de conclusão.

Serão dois novos livros”, explica Amaury. “Um será a continuação deste primeiro. Já batizei de Privataria Tucana 2, porque nele vou alinhavar os documentos que ficaram de fora do primeiro livro e contar sobre o bloqueio dos grandes meios de comunicação, sobre os desdobramentos das denúncias e o passo a passo sobre a CPI que será instalada no Congresso Nacional. O outro será um inventário sobre corrupção e pedofilia no Brasil, para revelar que autoridades que deveriam defender o povo e principalmente as crianças são, muitas vezes, os seus maiores inimigos”.



Confira alguns trechos da entrevista


Analistas da política já apontam que seu livro “A Privataria Tucana” marca o desfecho de uma era, ao decretar o fim político de José Serra, uma vez que a falta de respostas de Serra ao livro – o ex-governador limitou-se a taxá-lo de “lixo” – foi a comprovação final de que não havia como responder às denúncias ali levantadas. Você concorda com esta análise?

Amaury Ribeiro Jr. – As denúncias da imprensa mais recentes sobre irregularidades e corrupção, que chegaram a derrubar ministros de Estado, são fichinha perto das negociatas e licitações forjadas que estão por trás das privatizações do governo Fernando Henrique, que tinha Serra como ministro. Mas o povo não é bobo. Os sinais de desvio de conduta não podem ser tratados como futrica de adversários. O silêncio ensurdecedor dos acusados e a resistência dos grandes veículos de comunicação é um indício muito revelador de um estado de coisas que não só confirma as denúncias e documentos que registro no livro. É também revelador sobre a arrogância dos poderosos diante da lei e da Justiça no Brasil.





Uma CPI pode ser instalada no Congresso Nacional para investigar estas denúncias? Podem gerar algum fato novo ou resultar em punições de fato para os envolvidos no grande esquema de corrupção e propina mapeado por seu livro?

Todos nós esperamos que isso aconteça. Acho que você percebeu que o livro também aponta que o sistema de doleiros, de paraísos fiscais e de "offshores" (offshores é o nome de empresas e contas bancárias para fins ilícitos abertas no exterior, em países onde há menos fiscalização e menor tributação), foram abundantemente usados pelo PSDB e também por outros partidos políticos. Com a instalação de uma CPI, a casa vai cair. Na verdade, posso comparar a situação do livro e da CPI da Privataria com a queda de um grande avião com muitas autoridades importantes a bordo. Depois da queda do avião é preciso investigar as causas e acompanhar as consequências, para que o erro, o crime contra o país, não aconteça nunca mais.

Será preciso mudar a lei?

Sim, será preciso, porque a lei para os crimes do sistema financeiro, a lei do colarinho branco, é de 1985. Está ultrapassada e não dá conta da realidade de hoje. Você pode reunir um arsenal de documentos para provar o crime e ainda assim a lei permite brechas que favorecem a corrupção e a propina. Os próprios parlamentares sabem que é preciso proibir a entrada de capital estrangeiro nas transações de empresas nacionais, é preciso um controle maior sobre as operações de papéis nas bolsas de valores, assim como é urgente criar mecanismos para combater a lavagem de dinheiro. A questão da quebra de sigilo também precisa ser revista em muitos casos.

Você diz que seu livro é apenas a ponta do iceberg. Ainda há mais corrupção e propina no processo das privatizações do governo Fernando Henrique? Mais, além do que seu livro denuncia?

Sim, muito mais. Quando a “Privataria” virar CPI, com o trabalho de gente séria e competente que há entre os parlamentares, as negociatas de José Serra, da família de Serra, de banqueiros e seus amigos tucanos serão apenas o começo. Até agora eles tinham sido blindados pela aura da honestidade e pelo inaceitável silêncio da imprensa.

Quais são os seus próximos projetos no jornalismo?

Sou militante do jornalismo, você sabe. Vou continuar fazendo meu trabalho de jornalista na Rede Record e vou tentar concluir uns projetos que estavam parados. Primeiro, vou publicar outros livros. Serão dois livros. Um será o Privataria Tucana 2, alinhavando documentos que ficaram de fora do primeiro livro e contando os desdobramentos das denúncias e da CPI que será instalada no Congresso Nacional. O outro será um inventário sobre corrupção e pedofilia no Brasil, para revelar que autoridades que deveriam defender o povo e principalmente as crianças são, muitas vezes, o seu maior inimigo. Tem também um disco, que estou gravando e produzindo com artistas daqui de Belo Horizonte e do interior de Minas. Um disco mesmo, de música. Quero fazer como a antropofagia dos modernistas. Altas literaturas.



por José Antônio Orlando.



Como citar:

ORLANDO, José Antônio. O conto da Privataria. In: ______. Blog Semióticas, 27 de dezembro de 2011. Disponível no link http://semioticas1.blogspot.com/2011/12/privataria-tucana.html (acessado em .../.../...).

(P.S. - A íntegra da reportagem e da entrevista
com Amaury Ribeiro Jr. foi publicada pelo
"Hoje em Dia", jornal de Belo Horizonte, na
primeira página e na página 3, em 26 de
dezembro de 2011, com os seguintes título e
subtítulo: "Silêncio dos envolvidos é confissão
––  Autor de 'A Privataria Tucana' acredita
que publicação terá desdobramentos
significativos na política nacional")






Trechos extraídos do livro:


Após relatar o assalto ao patrimônio público do país por meio das privatizações, este livro pretende desnudar as muitas e imaginativas maneiras de ganhar dinheiro que se sucederam. Entre elas, os processos de internação de valores de origem suspeita.

São operações realizadas pelo clã Serra – sua filha Verônica Serra, seu genro Alexandre Bourgeois, seu primo político Gregório Marín Preciado, seus muitos sócios, seus amigos e seus colaboradores. E outros tucanos de altos poleiros. Em muitos casos, são transações envolvendo empresas brasileiras e empresas offshore no paraíso fiscal das Ilhas Virgens Britânicas, escoradas no anonimato.

Fiquei pasmado com a voracidade de alguns grupos e sua disposição de levar vantagem a qualquer custo (…). Será gratificante se, depois da última página, o leitor mantiver seus olhos bem abertos. É uma boa maneira de impedir que aqueles que já transformaram o público em privado para seu próprio proveito tentem reprisar algum dia o que foi feito na era da privataria.”


("A Privataria Tucana", páginas 30 e 31)


Depois desta jornada pelos pântanos da política em que todos são vilões e o Brasil é a vítima, acho importante encerrar a narrativa com algumas observações. A primeira delas é que o país e suas instituições não têm o direito de continuar fazendo de conta que não viram a rapinagem organizada que devastou os bens do Estado nos anos 1990 e começo da década seguinte. E que serviu para tornar os ricos mais ricos.

Varrer a sujeira para baixo do tapete, como se fez tantas vezes, não é mais possível. Não há tapete suficiente para acobertar tanto lixo. O Brasil, que escondeu a escravidão e ainda oculta a barbárie de suas ditaduras, não pode negar aos brasileiros a evisceração da privataria. Quem for inocente que seja inocentado, quem for culpado que expie sua culpa.

Se isso não acontecer, isto é, se a memória do saque não se tornar um patrimônio dos brasileiros, o país poderá repetir esta história, mais cedo ou mais tarde.”  


("A Privataria Tucana", página 339)










No alto, imagens da repercussão do livro
de Amaury Ribeiro Jr. publicadas em
blogs independentes. Abaixo, o ex-governador
de São Paulo, José Serra, fotografado
pela revista Piauí; Serra e o senador e
ex-governador de Minas Gerais,
Aécio Neves, com quem o tucano paulista
rivalizou em 2010 na disputa interna do PSDB
para alcançar o posto de candidato do partido
à sucessão do presidente Lula; e um flagrante
da Agência Brasil em 7 de setembro de 2011,
dia das comemorações da Independência, no
protesto contra a corrupção realizado na
Esplanada dos Ministérios em Brasília



O silêncio revelador sobre o livro-bomba 


Semanas depois do lançamento do livro, o silêncio nos chamados “grandes” veículos de imprensa do Brasil permanece constrangedor, ainda que revelador de um certo estado de coisas e de “conivência” com o malfeito. Dos “grandes”, apenas uma matéria de capa da “Carta Capital”, que fez a revista esgotar nas bancas.

Entre os fatos mais graves está a “manipulação” das sempre discutíveis listas dos “mais vendidos” da revista “Veja” e do jornal "O Globo", que omitiram o livro, apesar dele ser um recordista de vendas com 150 mil exemplares vendidos desde seu lançamento em 9 de dezembro. Houve também uma “matéria”, que não merece ser nomeada de “reportagem”, na “Folha de S. Paulo”, publicada em 15 de dezembro. O texto, não assinado (porque o autor não assinou um texto de opinião declarada? pergunta o leitor atento), não ouviu sequer o autor do livro, mas apresenta em destaque uma “defesa intransigente” de Serra e dos tucanos envolvidos no "esquema" denunciado no livro "A Privataria Tucana".

De tão questionável, a “matéria” publicada na "Folha" foi classificada de “jornalismo ruim” pela própria Ombudsman do jornal, Suzana Singer, em e-mail interno do jornal, datado de 15 de dezembro de 2011, que vazou “por acidente” na internet e foi publicado por muitos blogs, entre eles o “Blog da Cidadania”, de Eduardo Guimarães. Confira abaixo a íntegra da crítica isenta da Ombudsman da "Folha":


ANTES TARDE DO QUE NUNCA



por Suzana Singer.


Ainda bem que a “Folha” deu a notícia sobre o livro “A Privataria Tucana” (A11). Mas o jornal deveria continuar no assunto, porque há mais pautas no livro.

Exemplo: por que Verônica Serra e o marido têm offshores? Não deveríamos investigar e questioná-los? É já publicamos que Alexandre Bourgeois, marido de Verônica, foi condenado por dever ao INSS? É verdade que as declarações que ela deu na época das eleições, sobre a sociedade com a irmã de Daniel Dantas, eram mentirosas? Fomos muito rigorosos com o caso Lulinha, por exemplo.

Outra frente é a o tal QG de dossiês anti-Serra na época da eleição presidencial, que a Folha deu com bastante destaque. O livro conta coisas de arrepiar a respeito de Rui Falcão. Ao mesmo tempo, sua versão de roubo dos seus arquivos parece inverossímil. Seria bom investigar, já que ele faz acusações graves contra a imprensa, especialmente “Veja” e “Folha”.

Teria sido bom editar um “acervo Folha conta a história da privatização” para lembrar ao leitor que o jornal foi muito duro com o governo FHC. É um erro subestimar a capacidade da internet -e da Record- de disseminar a tese do “PIG”. E também seria bom esclarecer, com mais detalhes, o que é novidade no livro sobre esse período.

O Painel do Leitor só deu hoje uma carta cobrando a cobertura do livro. Eu recebi 141 mensagens. Quem escreveu hoje criticou a matéria publicada por:

1) ter um viés de defesa dos tucanos;

2) não ter apresentado Amaury Ribeiro Jr. devidamente e não tê-lo ouvido;

3) exigir provas que são impossíveis (ligação das transações financeiras entre Dantas e Ricardo Sérgio e as privatizações);

4) não ter esse grau de exigência em outras denúncias, entre as mais recentes, as que derrubaram o ministro do Esporte (cadê o vídeo que mostra dinheiro sendo entregue na garagem?);

5) não ter citado que o livro está sendo bem vendido.







O detalhe significativo do editorial


Outro texto da mesma "Folha de S.Paulo" sobre o mesmo assunto, o "livro-bomba", merece ser lido com muita atenção, apesar do detalhe significativo (para bom entendedor) de não citar o título do livro de Amaury Ribeiro Jr. Surpreendente também que seja um editorial, assinado por Vladimir Safatle. O texto foi publicado pela "Folha de S.Paulo" na página 2, no dia 20 de dezembro de 2011: 



O INIMIGO DA MORAL



por Vladimir Safatle.


O maior inimigo da moralidade não é a imoralidade, mas a parcialidade.

O primeiro atributo dos julgamentos morais é a universalidade. Pois espera-se de tais julgamentos que sejam simétricos, que tratem casos semelhantes de forma equivalente. Quando tal simetria se quebra, então os gritos moralizadores começam a soar como astúcia estratégica submetida à lógica do "para os amigos, tudo, para os inimigos, a lei".

Devemos ter isso em mente quando a questão é pensar as relações entre moral e política no Brasil. Muitas vezes, a imprensa desempenhou um papel importante na revelação de práticas de corrupção arraigadas em vários estratos dos governos. No entanto houve momentos em que seu silêncio foi inaceitável.

Por exemplo, no auge do dito caso do mensalão, descobriu-se que o esquema de corrupção que gerou o escândalo fora montado pelo presidente do maior partido de oposição. Esquema criado não só para financiar sua campanha como senador mas (como o próprio afirmou em entrevista à Folha) também para arrecadar fundos para a campanha presidencial de seu candidato. Em qualquer lugar do mundo, uma informação dessa natureza seria uma notícia espetacular. No Brasil, alguns importantes veículos da imprensa simplesmente omitiram essa informação a seus leitores durante meses.

Outro exemplo ilustrativo acontece com o metrô de São Paulo. Não bastasse ser uma obra construída a passos inacreditavelmente lentos, marcada por adiamentos reiterados, com direito a acidentes mortais resultantes de parcerias público-privadas lesivas aos interesses públicos, temos um histórico de denúncias de corrupção (caso Alstom), licitações forjadas e afastamento de seu presidente pela Justiça, que justificariam que nossos melhores jornalistas investigativos se voltassem ao subsolo de São Paulo.

Agora volta a discussão sobre o processo de privatização do governo FHC. Na época, as denúncias de malversações se avolumaram, algumas apresentadas por esta Folha. Mas vimos um festival de "engavetamento" de pedidos de investigação pela Procuradoria-Geral da União, assim como CPIs abortadas por manobras regimentais ou sufocadas em seu nascedouro. Ou seja, nada foi, de fato, investigado.

O povo brasileiro tem o direito de saber o que realmente aconteceu na venda de algumas de suas empresas mais importantes. Não é mais possível vermos essa situação na qual uma exigência de investigação concreta de corrupção é imediatamente vista por alguns como expressão de interesses partidários. O Brasil será melhor quando o ímpeto investigativo atingir a todos de maneira simétrica.










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